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Estado de Minas

Plano de resgate para Grécia projeta para 2020 dívida equivalente ao dobro do acertado


postado em 23/02/2012 07:17

Se os titãs eram forças do caos e da desordem, a tarefa de colocar nos eixos a economia grega exigirá, de fato, esforço olímpico. O último plano de ajuda aprovado pelos ministros das finanças da Zona do Euro, com resgate de 130 bilhões de euros, está longe de ser a solução para levar a Grécia do mundo inferior ao Olimpo. A redução na mitológica dívida grega, dos atuais 160% do Produto Interno Bruto (PIB) para 120,5% em 2020, pode amenizar a situação do país, mas o número continuará bastante superior aos 60% que eram considerados teto no pacto de estabilidade acordado pelos gregos para a definição da Zona do Euro. O novo plano, contudo, esboça ares de ato final nessa tragédia.

“O recado é de que a fonte de recursos é finita. As novas regras mostram que os países da União Europeia (UE) estão alertas à contrapartida. E têm mais é de estar mesmo”, opina Celina Ramalho, do Departamento de Planejamento e Análise Econômica da Fundação Getulio Vargas. Enquanto os protestos tomam as ruas das cidades gregas, em reação às medidas de austeridade fiscal e monetária que incluem arroxo salarial e cortes de benefícios previdenciários e sociais, a UE promete submeter o país a vigilância, com presença permanente de inspetores em Atenas.

O depósito do resgate em fundo à parte é outra lição. O risco de que as medidas afundem mais a economia na recessão só pode ser evitado, segundo a professora, como rigor. “A política de estado da Grécia tem de ser forte. Em casos assim, tiramos da gaveta a teoria keynesiana, que define a intervenção política econômica para conduzir o todo. Com o caos instaurado, a sociedade não está mais organizada e as próximas fases requerem esforços que contradizem anseios gerais, com redução do padrão de vida, por exemplo”.

Há quem duvide que a tragédia termina assim no segundo ato, ou se a incerteza se alastra. “Acho muito difícil que essa ajuda seja de fato o último posicionamento ativo de ajuda da Comunidade Europeia. O auge da crise já dura dois anos, o novo pacote até dá impressão de que é derradeiro, mas se fosse para deixar a Grécia abandonada, a UE já teria feito isso há mais tempo”, acredita Antônio Corrêa de Lacerda, professor de economia na PUC-SP.

TENSÃO SOCIAL O plano de ajuda encontra, na instabilidade social que corrói o dia-a-dia da população grega, principal oponente, na avaliação de Lacerda: “Cumprir as exigências é praticamente impossível. Com o país em crise, o corte de salários e benefícios vai derrubar a economia”. Perspectiva mais viável seria, segundo ele, que o plano de ajuste fosse mais ameno, a partir de forte redução de dívida, com negociação mais pesada do calote. Países como França e Alemanha, que têm maior interesse geopolítico na Zona do Euro, arcariam com a maior parte do prejuízo. Em um mundo ideal, talvez fosse possível. Na realidade, obviamente, franceses e alemães não podem nem ouvir falar nessa conversa. Credores privados concordaram em perdoar 53,5% da dívida do país.

“É como se a Grécia fosse aquele aluno que passou de ano consecutivamente sem ter aprendido as lições. Desta vez, ele tem uma espécie de ultimato, mas não é interesse de ninguém que ele perca a vida escolar”, compara o especialista em finanças Paulo Vieira, das Faculdades Novos Horizontes. Por menor que seja a representativade da Grécia na economia europeia, a desvinculação do país da Zona do Euro poderia passar o recibo da derrota do projeto. “É um elo da cadeia. Estruturalmente, os países da UE vão fazer o que for preciso para resgatar a economia grega”, diz o professor.

Entre o dracma e o calote

Com a tragédia grega se arrastando há anos, vozes importantes chegam a defender um passo atrás na história econômica do país. É o caso, entre outros, do professor Kenneth Rogoff, da Universidade de Harvard, para quem o retorno momentâneo ao dracma seria a medida mais certeira. Em entrevista à publicação alemã Der Spiegel, ele defendeu a volta da antiga moeda, que permitiria ao país desvalorizar o câmbio e ganhar em competitividade. A perspectiva é inviável, na opinião de Antônio Corrêa de Lacerda, da PUC-SP: “Haveria agilidade para uma solução monetária, mas a pergunta é: quem confiaria no dracma? A Grécia teria respaldo internacional para conseguir crédito?”

O esforço para mudar o padrão monetário, também considerado hercúleo, não valeria a pena, segundo o especialista em finanças Paulo Vieira. “O custo de transição de uma moeda para a outra não compensaria. Não seria interessante sair do euro e depois voltar a ele. Além do aspecto monetário, a questão jurídica e de contratos de comércio exterior seria extremamente trabalhosa”, diz. Nesse sentido, resta aos gregos o resgate que, se não soluciona de vez o problema, ao menos contribui para “desentortar os rumos da economia”, nas palavras de Vieira.

O retorno ao dracma seria problema complexo para a UE, segundo Celina Ramalho, da FGV. “Os gregos são cidadãos europeus. Se eles perdem a cidadania europeia, terão de procurar emprego só na Grécia, o que seria restrição de mercado. E quem tem papeis da dívida grega, como a Alemanha, dançaria com a desvalorização da moeda”. A médio prazo, as novas medidas terão, segundo ela, o aguardado impacto negativo na sociedade, com mobiliações como as de ontem, em reação imediata: “A longo prazo, resta torcer para que a economia reaja ao plano de resgate e apresente resultados”.

Bolsas A divulgação de dados fracos da Zona do Euro e o temor sobre a dívida grega derubaram as bolsas europeias pelo segundo dia consecutivo ontem. Na iminência da aprovação do plano de resgate, no início da semana, as ações do Velho Continente chegaram à maior alta dos últimos sete meses, mas a alegria durou pouco. O humor também foi afetado negativamente depois que a agência Fitch rebaixou os ratings de longo prazo em moeda local e estrangeira da Grécia para C, de CCC. A agência considera que a proposta de reduzir a dívida pública da Grécia por meio de uma troca de bônus com credores privados vai constituir um default, se concluída.

Em Atenas, o índice ASE caiu 5,7%, para 751,96 pontos. "O acordo grego foi um ’não acordo’. Há muitas coisas que precisam ser fechadas nas próximas duas semanas", afirmou Steen Jakobsen, economista-chefe do Saxo Bank. Segundo ele, os mercados estão temerosos com a implementação do acordo. O índice pan-europeu Stoxx 600 fechou em queda de 0,82%, ou 2,19 pontos, para 264,59 pontos.


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