Ter uma boa noite de sono vai ficar mais caro. Sem oferta nacional de matéria prima base para colchões, a indústria já reduz produção, concede férias parciais e reconhece que não há como segurar os preços. O problema começou depois que a única fábrica no país a fornecer o Tolueno Diisocianato 80/20 (TDI) – principal componente da espuma, insumo essencial para produção de colchões – interrompeu suas atividades. A paralisação da multinacional americana Dow, localizada em Camaçari, na Bahia, teve início em outubro do ano passado para manutenção. O retorno em meados de janeiro não aconteceu, desencadeando o sumiço do TDI do mercado interno.
O impacto na mineira Orthocrin foi imediato, já que todo o fornecimento de TDI vinha da Dow. “Nosso faturamento já apresentou queda de 30% a 35% desde que o problema começou, em janeiro. Tínhamos um estoque regulador para um mês de trabalho”, explica o diretor operacional da empresa, Alexandre Prates Pereira. A alternativa foi paralisar a fábrica durante toda a semana de Carnaval, conceder férias a 30% do quadro de funcionários e recorrer, pela primeira vez, ao mercado internacional. “Agora fizemos uma grande importação e estamos aguardando a chegado do produto”, afirma Alexandre.
Escasso e disputado, o TDI ficou mais caro e o reflexo já deve ser sentido pelo consumidor. Na Orthocrin, a elevação de preços dos colchões foi, em média, de 7% a 10%, percentual que sobe para 15% na Colchobel. “Em 16 de janeiro ninguém achava TDI para comprar no Brasil e a tonelada do produto importado já está muito mais cara”, justifica o proprietário da Colchobel, Tadeu Maia.
Na Ortobom, que tinha 60% da demanda por TDI atendida pela Dow, os prazos para entrega dos produtos foi ampliado. “Passou de uma média de sete a 10 dias, para 15 a 20 dias”, afirma o gerente de marketing Luis Henrique Colin. Os clientes já começam a ser alertados sobre o problema e a saída agora é buscar outros fornecedores. “Vamos diversificar para não ficarmos sujeitos a essas situações”, planeja Colin.
A indústria de colchões não deve ser a única afetada. O TDI também funciona como matéria prima para colas, vernizes e diversos materiais aplicados nas indústrias de móveis, veículos automotivos e até construção civil. Em nota, a Dow confirmou a paralisação em outubro para “manutenção programada” e garantiu que importou TDI de outras regiões para suprir a indústria nacional. “O mercado brasileiro já tem 50% de sua demanda abastecida regularmente por importações. Especificamente para o mercado de colchões no Brasil, estima-se que foram importadas cerca de 30 mil toneladas de produto em 2011, consistente com o volume de anos anteriores”, esclarece.
Pequenos sofrem A empresária Alexandra Elvira de Faria teme que a produção de lembrancinhas para festas infantis não passe de duas semanas, depois de ter vivido um crescimento de 50% dos negócios em 2011. “Todos os produtos que faço são a base de espuma, mas não tem mais. Já estou há 10 anos neste ramo e nunca passei por isso”, conta. A Ortobom era sua principal fornecedora e, mesmo tentando recorrer a outras empresas, Alexandra se deparou com um problema generalizado. “Diante desta situação, não tenho o que fazer. Se acabar o meu estoque, vou ter que fechar até que a situação se regularize”, planeja. Os reflexos serão sentidos pelos três funcionários da microempresa, que também ficarão parados.
Sobretaxa agrava situação do setor
Se não bastasse a escassez do TDI no país, desde novembro do ano passado a importação do produto vindo de empresas dos Estados Unidos e Argentina foi sobretaxada pela Câmera de Comércio Exterior (Camex) por meio da Resolução nº 92. A intenção é inibir a prática de dumping por fornecedores internacionais, constatada em investigação da Camex. Relatório mostra que estas fabricantes vendiam o TDI para o Brasil abaixo do preço praticado no país de origem.
Segundo a norma, para cada tonelada de TDI vindo da Argentina – exceto proveniente da Petroquímica Río Tercero – deverá ser pago US$ 1.018,54, além do imposto de importação de 14%. Se a empresa originária for a Bayer Material Science, uma das maiores produtoras mundiais, o custo adicional será de US$ 887,44 a cada mil quilos.
Segundo o empresário Tadeu Maia, proprietário da Colchobel, a alíquota de 14%, sobe para 28%, diante da nova tributação. “Enquanto a Dow está parada, deveria ser liberada a importação da matéria-prima. É preciso lembrar ao ministro Fernando Pimentel que não se sobretaxa insumo, mas sim produto acabado”, protesta Tadeu que vê o TDI como uma commoditie para a indústria.
Ciente do gargalo e na tentativa de intervir junto ao Ministério do Desenvolvimento, a Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg) já encaminhou um ofício ao ministro Fernando Pimentel, esclarecendo sobre a gravidade da falta do produto no mercado. Segundo minuta assinada pelo presidente da Fiemg, Olavo Machado Júnior, a Dow é responsável por atender cerca de 45% da demanda de 80 mil toneladas ao ano de TDI no país.
“A falta do produto está afetando toda a cadeia produtiva, sobretudo para aquelas fábricas que ela (a Dow) fornecia diretamente, incluindo as de espuma em Minas Gerais”, alerta o documento, que ainda acrescenta: “Os gargalos para a importação são a taxa, que passou de 14% para 28% e um processo de dumping.” O pedido da Fiemg junto ao ministro é para que seja estudada a possibilidade de redução temporária ou definitiva das alíquotas de importação. Além disso, a federação solicita “reavaliação do processo antidumping.”
O Ministério do Desenvolvimento confirmou o recebimento da carta enviada pela Fiemg e está averiguando a situação do setor. A discussão sobre as medidas que serão adotadas caso seja confirmado prejuízo aos fabricantes, ocorrerá durante reunião das Gerências Regionais de Apoio ao Comércio Exterior (Gecex), em março. (PT)