Nada segura a valorização do real frente ao dólar. Nessa quinta-feira, depois que o governo anunciou que todos os empréstimos de bancos e empresas brasileiras tomados no exterior com menos de três anos de prazo terão de pagar 6% de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e após intervenção do Banco Central (BC) com dois leilões de compra da divisa, a moeda norte-americana fechou o dia em queda de 0,23%, cotada a R$ 1,712 para venda no mercado de balcão. No ano, a moeda acumula queda de 8,38%. Em abril de 2011, o governo já havia estendido o prazo desses empréstimos de até 360 dias para até 720 dias. Foi a terceira vez que o governo ampliou o prazo mínimo para isenção da cobrança do IOF nesse tipo de operação. O novo prazo vale para operações realizadas a partir dessa quinta-feira.
Na prática, o IOF tenta evitar que bancos e empresas tomem empréstimos no exterior e tragam esses recursos para o Brasil, o que, quando ocorre em excesso, derruba a cotação do dólar. No mercado financeiro a medida foi avaliada como praticamente inócua pelos operadores, segundo eles, serviu apenas para minimizar a velocidade de queda visto que a divisa continuou a cair, porém em ritmo mais moderado comparado a outras moedas. Tanto o ministro da Fazenda, Guido Mantega, quanto a presidente Dilma Rousseff foram a público explicar a decisão e avisar que ainda tem mais por vir.
“Quando o real se valoriza, diminui a nossa competitividade. As exportações brasileiras ficam mais caras e os produtos importados, mais baratos, numa competição desleal com as empresas brasileiras”, afirmou o ministro. Ele ressaltou ainda que o governo não assistirá “impassível” a essa guerra cambial. “O Banco Central tem comprado dólares em leilões diários e, como está havendo uma tomada de crédito lá fora em grande escala pelas empresas brasileiras, estamos penalizando quando esse crédito for de curto prazo”, justificou. Para os empréstimos a serem liquidados num prazo acima de três anos, a alíquota continua zero.
O objetivo da medida é barrar a avalanche de importados que invadem o país e já alimentam 30% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional, segundo dados da Global Global Financial Advisers. “No patamar atual, o câmbio cria uma situação de concorrência com produtos comercializáveis que é demolidora para o Brasil”, resume José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do banco Fator. Exemplo disso pode ser encontrado em muitos segmentos da economia e até mesmo em mercadorias como a laranja.
Fruta importada O Brasil é o maior produtor da fruta no planeta, com 25% do mercado mundial, mas já há supermercados brasileiros vendendo laranja-baía importada da Espanha. “Eu me cansei de ver o estrago que o regime cambial está fazendo no Brasil, em nossas indústrias, no furo enorme de nosso balanço de pagamentos, na excessiva e mal remunerada acumulação de reservas”, diz o consultor Carlos Coradi, presidente da Engenheiros, Financeiros e Consultores (EFC), que encontrou a laranja-baía importada sendo vendida num supermercado de São Paulo.
Nessa quinta-feira, ao anunciar a ampliação do limite de empréstimos tomados lá for a nos quais incide a alíquota de 6% do IOF, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou que a mudança na cobrança do imposto é uma medida importante para o câmbio “Estamos desestimulando a entrada de capital de mais curto prazo no Brasil. Hoje há uma sobra de liquidez no mercado internacional”, justificou. Mantega destacou que os países avançados estão aumentando a oferta de crédito e praticando uma política monetária expansionista. Para analistas e economistas ouvidos pelo Estado de Minas, a iniciativa pode não ter o efeito esperado, mas já funciona como um sinal de que o governo está disposto a tomar atitudes no sentido de conter a depreciação da moeda americana.
Efeito pode ser inócuo
José Roberto Savoia, professor da Faculdade de Administração, Economia e Contabilidade (FEA) da Universidade de São Paulo (USP), acredita que a diferença entre os juros pagos no mercado externo e os praticados no Brasil vai continuar compensando a tomada de recursos em moedas estrangeiras pelas empresas instaladas em território nacional. Miguel Daoud, sócio-diretor da consultoria Global Financial Advisers, lembra que o Brasil tem taxa real de juros entre 4,5% e 5% ao ano, a maior do mundo. “O pessoal pega dinheiro emprestado lá fora com juros de 0,5% a 1% ao ano e aplica aqui. Estamos bem posicionados no mundo e somos considerados a bola da vez. Para usar um jargão de mercado, contra fluxo (de entrada de capital) não há argumentos.”
Na Tendências Consultoria, o economista Bruno Lavieri concorda que a medida anunciada nessa quinta-feira não terá impacto direto na taxa de câmbio. Ele explica que empresas que têm condições de fazer essas captações, que em janeiro chegaram a US$ 4,5 bilhões, são grandes organizações, capazes de estender esses prazos, caso seja necessário. “Foi um bom começo. A intenção (do governo) não é ficar por aí. Começa assim e o governo vai sentindo qual é a reação do ponto de vista da eficácia. Se esse passo não for suficiente, virá outro e depois outro e outro, ao invés de fazer um paredão. O dólar chegou num nível a partir do qual não se vê interesse em que ele continue a baixar”, observa Gonçalves.
Reação à noite
Como mais uma ação para proteger o mercado cambial e evitar uma valorização excessiva do real frente ao dólar, o Banco Central divulgou na noite dessa quinta-feira medida que impõe limitações a financiamento de exportações. De acordo com o diretor de Política Monetária do BC, Aldo Mendes, a decisão vale para a modalidade de pagamento antecipado de exportações, que tem prazo ilimitado sem taxação e, agora, passa a contar com esse benefício apenas com operações de prazos de até 360 dias. As que ultrapassarem esse prazo passarão a ter a cobrança de alíquota de 6% do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). “É mais uma medida sim (para atuar no mercado cambial)... A grande maioria das exportações tem ciclo produtivo de até 360 dias”, afirmou.