Cedendo a pressões, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central reduziu a taxa básica de juros de 10,5% ao ano para 9,75%, corte de 0,75 ponto percentual. É a primeira vez desde abril de 2010 que o índice retorna ao patamar de um dígito. Na época, fechou em 9,5%. Diante do crescimento frustrante do país no ano passado e dos primeiros sinais de fraqueza em 2012, com uma indústria em plena recessão, o BC atendeu a todos os apelos da presidente da República, Dilma Rousseff, e confirmou a "pró-atividade" anunciada pelo governo para impulsionar o crescimento e conter o derretimento do dólar.
A decisão mostra ainda um BC rachado, com dois votos contra e cinco a favor da aceleração no corte. As vozes dissonantes seriam de Carlos Hamilton Araújo, diretor de Política Econômica, e Luiz Awazu Pereira, diretor que acumula as áreas de Regulação do Sistema Financeiro e de Assuntos Internacionais. Awazu estaria preocupado com a deterioração das expectativas e teme que o mercado interprete o corte mais agressivo de maneira errada, como se o BC tivesse rasgado o sistema de metas e o objetivo central, que é uma inflação em 4,5% ao fim de 2012.
A presidente Dilma foi a primeira a ser comunicada pelo presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, sobre a decisão que, inclusive, teria sido discutida anteriormente com o Palácio do Planalto. O assessor especial para assuntos internacionais, Marco Aurélio Garcia, deu pistas do corte na viagem que fez para a Alemanha com a presidente, eles falaram bastante sobre política monetária durante o voo e quando chegou a Europa acabou deixando escapar o que não devia. Para alguns analistas, a fala de Garcia no exterior foi o marco para o mercado de juros futuros, que nos dias seguintes desabaram em um migração em massa para apostas de que o BC cortaria os juros entre 0,75 e 1 ponto percentual.
PRESSÕES A reunião do Comitê de Política Monetáia (Copom) de ontem ocorreu rodeada de pressões e sobre ainda sombra do Palácio do Planalto, que tornou-se ainda maior depois da divulgação do PIB de 2011, fechado em 2,7%. Pesou ainda sobre a autoridade monetária a enxurrada de dólares que ingressou no Brasil atraída pelo juro real mais elevado do globo, um excesso de recursos que derruba a cotação da moeda norte-americana ante o real e tem feito a indústria naufragar em meio a competição predatória dos importados.
"Se a recuperação da atividade for mais lenta do que se previa, não é problema esse corte mais agressivo. Agora, se a recuperação for forte, a gente pode ter a retomada das pressões inflacionarias ao longo de 2013", alertou Maurício Molan, economista-chefe do Santander.
Para Luís Otávio de Souza Leal, economista-chefe do ABC Brasil, a mudança da meta de crescimento da China, de 8% para 7,5% em 2012, afetou a decisão do Copom. "É uma mudança que fortalece a posição do BC de que o cenário externo deve implicar em menos inflação", avaliou Leal. "A dúvida agora é se ele mantém o ritmo ou se já antecipou todos os cortes que pretendia fazer no ano", disse.
REAÇÃO A Confederação Nacional das Indústrias comemorou o corte de ontem, mas, em nota, deixou claro que espera que a retração tenha sequência nos próximos encontros do Copom. “É fundamental executar uma política fiscal não expansionista, o que proporcionaria maior espaço para cortes adicionais nos juros.” Para a entidade, a redução da taxa é fundamental para o “a retomada do crescimento do PIB acima da média mundial”.
A Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) foi mais incisiva. “Vemos a redução da Selic como uma atitude tímida e descompassada com a atual conjuntura econômica na qual se insere o Brasil”, afirmou o presidente entidade, Olavo Machado Júnior. Os industriais mineiros defendem a equiparação da Selic com os juros praticados externamente e defendem medidas de proteção ao setor. “É imperativo um maior aprofundamento da política industrial voltada para a indústria de transformação, que está atualmente passando por uma situação inaceitável.”
Indústria despenca
Brasília – O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) trouxe ontem uma má notícia para o governo da presidente Dilma Rousseff: a produção industrial caiu 2,1% em janeiro de 2012. Trata-se da retração mais intensa no indicador desde dezembro de 2008, auge da crise econômica internacional, quando a atividade do setor despencou 12,2%. A queda deveu-se, especialmente, a setores mais susceptíveis aos efeitos da queda do dólar, que favorece a enxurrada de importados no país. As vendas de veículos foram as mais atingidas, recuando 30,7%. Se a situação econômica continuar se deteriorando, já são esperados efeitos nas eleições municipais de outubro.
“Um grande fator de sustentação política do governo tem sido a economia. Se houver redução do poder de compra e a classe média tiver de deixar de viajar para Miami, a popularidade do governo vai cair”, avaliou o cientista político da UnB João Paulo Peixoto. O analista advertiu que os efeitos serão sentidos mais rapidamente sobre os grandes centros urbanos: “Rio e, principalmente, São Paulo, são mais sensíveis às mudanças econômicas nacionais porque são mais ricos”. Caso a situação continue se deteriorando, as conseqüências serão sentidas ao longo dos próximos anos. “Pode haver um efeito cascata, que repercuta, inclusive, nas eleições presidenciais”, apontou Peixoto.
O sinal amarelo foi aceso no fim do ano passado. No último mês de 2011, o setor havia registrado expansão de 0,9% (dado revisado hoje para 0,5%) em relação a novembro. Na comparação com janeiro de 2011, a produção industrial registrou queda de 3,4% no primeiro mês de 2012. O indicador fechou 2011 com alta de 0,3%, resultado muito abaixo do forte crescimento de 10,5% de 2010. Nos últimos 12 meses, a indústria acumulou uma queda de 0,2%.
“Alguns fatores que intensificaram a queda foram pontuais, como as férias coletivas nas empresas fabricantes de caminhões e as chuvas no setor extrativo, mas a redução na produção vem sendo observada há alguns meses e não necessariamente está ligada a questões localizadas”, afirmou o gerente da pesquisa de indústria do IBGE, André Macedo. (Mariana Mainenti)