Sem enxergar pela frente ameaças à trajetória da inflação e com a desaceleração do crescimento econômico custando para romper o viés ao redor de 3% a 3,5% ao ano, contra 2,7% em 2011, o Banco Central filtrou as tendências e confrontou os números correntes aos riscos projetados para concluir que o atual ciclo de queda da taxa de juro básica, agora tabelada em 9,75% ao ano, está próximo do fim.
A mensagem do BC na ata da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) da semana passada foi anormalmente clara para esse tipo de comunicação voltada ao mercado financeiro. “O Copom atribui elevada probabilidade à concretização de um cenário que contempla a taxa Selic se deslocando para patamares ligeiramente acima dos mínimos históricos, e nesses patamares se estabilizando”, informou o BC.
O mínimo histórico da Selic foi de 8,75%, tendo ficado nesse nível entre julho de 2009 e abril de 2010. “Ligeiramente acima”, conforme a pista divulgada pelo BC, é 9%, considerando-se o múltiplo de 0,25 ponto percentual usado pelo Copom na definição da Selic.
A tanto se poderá chegar na próxima reunião, em 18 de abril, se o BC repetir a dose do último corte, de 0,75 ponto - motivo do voto contrário de dois entre os sete diretores liderados pelo presidente Alexandre Tombini. Ou em 30 de maio, como resultado de um corte de 0,50 ponto percentual no Copom de abril e mais outro de 0,25.
Os diretores dissidentes defenderam o mesmo ritmo de queda adotado desde o inicio do ciclo de ajuste, em agosto, quando a Selic estava em 12,50%, e veio sendo podada à base de meio ponto de percentagem. A cautela parece ater-se a outros motivos não explicitados na ata.
Olhando-se a inflação prospectiva, a Selic, secundada pela enorme retenção pelo BC de depósitos à vista e a prazo dos bancos, tem gordura para devolver até, pelo menos, meados do segundo semestre.
Pelo observatório da consultoria LCA, o IPCA acumulado em doze meses deve vir para 5,5% em março e ficar girando em torno de 5% até setembro - abaixo do teto de 6,5% encontrado na virada do ano, mas distante da meta central de 4,5%. Por agora só Tombini diz que o BC vai cumprir a meta este ano. Trata-se mais de uma aposta.
O que cerca a inflação
A inflação no centro da meta depende da malemolência do preço das commodities no mercado internacional; de a crise com o Irã – fator de alta sobre o petróleo - limitar-se a discursos inflamados; aqui, o governo Dilma Rousseff entregar em dinheiro a economia fiscal, ou seja, o superávit primário, na medida justa de 3,1% do PIB; e.... E a desvalorização do real ficar contida no patamar de R$ 1,80.
Dos fatores não triviais desconsiderados pelo Copom a taxa cambial é um dos dois mais relevantes a condicionar a evolução da política monetária. O outro é o impulso do crescimento. Se continuar fraco, o governo deverá liberar gastos orçamentários e pressionar o BC a aliviar mais um pouco os controles sobre o crédito ao consumo.
É o que a presidente cobra do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federa, esperando que o afrouxamento do custo do dinheiro na banca estatal arraste os bancos privados para não perder mercado.
Viés de alta do dólar
Não se esperam surpresas ruins do lado externo, apesar de a luz brilhante da economia chinesa, formadora dos preços das commodities que permitem um estreito superávit em nossa balança comercial, vir piscando desde o começo do ano. Em compensação, na Zona do Euro há a expectativa de algum alívio, ainda que a “solução definitiva” da crise, segundo a ata do Copom, tenha sido apenas postergada.
Já nos EUA, a força da retomada continua surpreendendo. No pior cenário, o mundo seguirá cambaleando, mas sem tropeçar, com menor desinflação dos bens duráveis de exportação da China e sustentação da demanda por commodities, especialmente as agrícolas. O valor do dólar passaria a um viés de alta no mercado internacional.
Risco de voltar atrás
Por mais que pareça improvável, dada aflição do governo com o tal tsunami de euros e dólares, o maior risco poderá ser o contrário: o país chegar ao fim do ano tendo de relaxar a guarda sobre os fluxos de capitais, caso a economia cresça como Dilma deseja, uns 4%/4,5%.
Tal ritmo será atingido se o governo empurrar o consumo. O impulso pelo investimento parece tardio a esta altura. Essa combinação deve manter o ritmo de importações, mas com câmbio maior, e pouco ajudar a indústria a deslanchar. Um mundo menos atado a crises, sobretudo nos EUA, vai reter parte da liquidez global, e crescimento maior no Brasil demandará mais importações. Em tal quadro, bancar o déficit externo será mais caro, e a inflação se insinua para 2013.