A virada do dólar, que fechou o pregão de ontem na barreira dos R$ 2 só vistos pelos exportadores brasileiros em 2009, começa a influenciar na retomada de negócios e em novos contratos das indústrias mineiras de alimentos, ferro-gusa (matéria-prima da fabricação de aço), autopeças e móveis no exterior. Fabricantes nacionais de segmentos também sacrificados com o longo período de valorização do real sobre a moeda norte-americana, que favorece o avanço dos produtos importados no mercado interno , também veem sinais de maior competitividade na briga desigual, a exemplo das confecções. Com a alta de 0,65% de ontem, o dólar comercial se valorizou 4,93% neste mês e acumula variação positiva de 7,01% no ano, sob o impulso do turbilhão da crise europeia.
Os produtores independentes de ferro-gusa de Minas conseguiram fechar novas vendas na Ásia e nos Estados Unidos e reabriram canais de negociação, diante da valorização recente do dólar, afirma aliviado o presidente do Sindicato da Indústria do Ferro do Estado de Minas Gerais (Sindifer-MG), Fausto Varela Cançado. “Ainda não conseguimos medir esse movimento em números, mas a avaliação das empresas é de que se trata de uma recuperação sensível. Surgiram mais possibilidades de negócio, embora nada que mereça muitas comemorações”, afirma o executivo.
A alta do dólar é apenas parte das preocupações de um setor afetado pela demanda menor de insumos industriais em decorrência da crise mundial e do excesso de estoques de aço no mundo. Se o câmbio continuar ajudando, a despeito da turbulência na economia, as vendas tendem a melhorar e o Sindifer já refez os cálculos para 2012. Com a expectativa de que a moeda americana se mantenha em R$ 2, as empresas apostam num crescimento de 15% das exportações este ano frente a 2011, perspectiva bem mais animadora que a projeção anterior de aumento de 5% a no máximo 10%.
Na indústria de alimentos, a Forno de Minas, uma das maiores fabricantes e exportadoras de pão de queijo, negocia novos embarques para Portugal e os Estados Unidos, se aproveitando da esticada do dólar especialmente nos últimos 30 dias. O presidente da empresa, Hélder Mendonça, conta a estratégia proposta aos clientes, de manutenção do preço em dólares tendo como contrapartida o aumento dos pedidos. “Estudamos esses novos embarques de imediato, com a oferta de descontos, mas ainda não temos a segurança de que o dólar vai se estabilizar. Se for um movimento de curto prazo, ele pouco ajuda”, afirma.
Em outra frente de trabalho pelo aumento das exportações, Mendonça determinou que sua equipe retome os contatos em mercados onde a companhia já atuou, como a Austrália e o Chile. Com um dólar na casa de R$ 2 ao longo dos próximos meses, a expectativa é de uma elevação de 30% das vendas externas em 2012, ante a meta de 10% que a empresa havia estipulado no começo do ano. Em volume, a previsão agora está em 1 milhão de toneladas, ante 450 mil toneladas vendidas no exterior em 2010.
Embarques
Logo que o dólar encostou nos R$ 2, na sexta-feira, a mineira Domus Importação, Exportação e Consultoria percebeu a reação dos embarques ao exterior, informa o diretor da companhia Frederico Martini. “As empresas liberaram cargas que estavam prontas, mas aguardavam a melhora das cotações. Desde sexta-feira, houve um aumento de 40% dos embarques”, afirma. As cargas liberadas incluem alimentos congelados, motores e blocos de motores para veículos e produtos têxteis.
Embora a exportação seja um negócio tímido para os fabricantes de móveis da região de Ubá, na Zona da Mata mineira, as empresas do polo registraram elevação de até 50% nas vendas destinadas ao mercado internacional impulsionadas pela alta do dólar. O percentual é expressivo, apesar de incidir sobre uma base muito incipiente de exportações, que hoje não passa de 0,8% da produção, de acordo com Michel Pires, presidente do Sindicato Intermunicipal das Indústrias do Mobiliário de Ubá.
“É um percentual muito alto, mas as vendas externas não vão passar de 1,2% da nossa produção. O problema não é só do câmbio. Precisamos de uma reforma tributária para desonerar a produção e assim podermos investir lá fora”, afirma o industrial. Na média das exportações deste ano, o setor trabalha com 20% de crescimento, considerando a manutenção da moeda norte-americana na faixa atual. Por enquanto, o número de exportadores não passa de 15 entre as 300 empresas do polo moveleiro.
O vice-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) João Carlos Ferraz afirmou ontem que o dólar, cotado a R$ 2, faz diferença para os exportadores, mas que o câmbio é apenas um dos componentes para ampliar a competitividade da indústria. Ele disse que é preciso cada vez mais aproximar inovação e produção. “Para quem exporta, um câmbio que passa de R$ 1,50 para R$ 2 é importante. Mas o câmbio é um dos componentes do custo”, lembrou.