Na hora de realizar o sonho de comprar um carro financiado, os consumidores devem ficar atentos à sua capacidade de arcar com todas das despesas que a decisão implica. Gastos com Imposto sobre Veículos Automotores (IPVA) e outras taxas, revisão, seguro, estacionamento e gasolina, quase todos obrigatórios para quem é proprietário de um veículo, podem mais do que duplicar a despesa inicial com a prestação. Pesquisa feita pelo Estado de Minas com concessionárias de veículos, corretoras de seguro, estacionamentos e a Agência Nacional do Petróleo (ANP) mostram que ao adquirir um carro zero quilômetro de cerca de R$ 30 mil, com entrada de 30% e financiamento em 36 parcelas, à prestação mensal de R$ 777 deve-se somar uma despesa de R$ 869,85 ao mês, em média. No caso de um automóvel avaliado em R$ 50 mil, com entrada de R$ 15 mil, a parcela mensal de R$ 1.277 é turbinada com gastos adicionais de R$ 1.187,60.
A falta de planejamento dos consumidores, aliada ao crédito fácil e longo – o mercado chegou a vender automóveis em 99 parcelas – e ao baixo crescimento da economia, levou a inadimplência no Crédito Direto ao Consumidor (CDC) de veículos para pessoas físicas a 5,7% nos três primeiros meses de 2012. Em 12 meses, a taxa de inadimplência disparou de 3% para 5,7%. Os números são do Banco Central. “Com prazos longos e prestações baixas, os brasileiros se esqueceram de que, além da prestação, deveriam arcar com despesas de manutenção e cuidados com os veículos. Eles calcularam mal o custo de ter um automóvel e acabaram não conseguindo arcar com eles”, diz Miguel José Ribeiro de Oliveira, vice-presidente da Associação Nacional de Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac). Segundo ele, a situação tende a melhorar com medidas federais como redução das taxas de juros e do Imposto sobre Produto Industrializado (IPI), que injetarão mais recursos na economia. Além disso, os bancos estão mais criteriosos na concessão do crédito.
No fim do ano passado, a vendedora de acessórios para carros Gisele Marques de Matos, não resistiu à tentação e comprou um Ford Ka 2010 financiado em 24 vezes. Desde então, arca com uma prestação de R$ 565 ao mês, o que representa no mínimo 30% do seu salário. “O valor pesa. Tem muito juros embutido. Se eu atrasar um dia, a parcela vai lá para cima”, reclama. Ela explica que como é a primeira vez que tem um automóvel, não pensou que teria outras despesas, além do financiamento. “Fiquei surpresa, não sabia o que era manter um carro. Quando fui comprar, não pensei que teria despesas de manutenção como gasolina, pneu, troca de óleo”. Diante da conta inesperada, Gisele resolveu deixar o carro em casa e ir trabalhar de ônibus. “Paguei o IPVA parcelado e achei muito caro. Gastei R$ 1.100, junto com a taxa de licenciamento. O carro fica praticamente na garagem”.
Na ponta do lápis O consultor de finanças Erasmo Vieira faz a sua própria conta. De acordo com ele, um comprador que adquiriu um automóvel de R$ 20 mil, com financiamento de R$ 15 mil em 36 parcelas, paga de R$ 580 ao mês. Além desse gasto, deverá arcar com R$ 70 mensais referentes ao IPVA (R$ 800 no total de um ano), R$ 250 de gasolina ao mês (se não tiver que percorrer grandes distâncias), além de gastos mensais de R$ 125 (R$ 1.500 ao ano) com manutenção (pneu, alinhamento, troca de óleo etc). Isso sem contar estacionamento e seguro do carro. “A pessoa olha para a prestação de R$ 580, mas de fato ao longo do ano terá um gasto mensal de R$ 1.100”, avisa.
Jurandir Sell Macedo, consultor de finanças do Itaú, concorda que a maioria das pessoas faz o financiamento do veículo sem planejar as outras despesas que terá com ele. Um dos mais salgados é o do seguro. “Se o consumidor não contrata um seguro e compra um veículo financiado, pode perder o carro em caso de acidente e ainda ficar com a dívida do financiamento”, alerta. Por isso, de acordo com ele, é necessário olhar para todos esses custos e pensar se eles cabem no bolso. “Se você está disposto a pagar uma prestação de R$ 500, o melhor a fazer é economizar R$ 650 mensais ao longo de seis meses para saber se de fato o orçamento suporta a prestação. Se a resposta for negativa, é hora de mudar de planos”.
Governo quer reduzir inadimplência
Brasília – O ministro da Fazenda, Guido Mantega disse ontem que o governo estuda medidas para reduzir a inadimplência no pagamento de empréstimos no país. Em audiência na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), do Senado, o ministro afirmou que as medidas de estímulo ao crédito anunciadas segunda-feira ajudarão a reduzir a inadimplência, mas que é possível fazer mais. “Temos como reduzir essa inadimplência com uma nova liberação de crédito. Temos mecanismos para reestruturar essa inadimplência e nós estamos pensando em novas medidas que permitam isso”, afirmou, sem detalhar as novas ações.
Mantega defendeu o pacote de medidas para estimular a economia. De acordo com Mantega, foi feito um acordo entre governo, setor bancário e setor produtivo para atingir o objetivo de aumentar o crédito barato para a população. A indústria automotiva, por exemplo, se comprometeu a não demitir funcionários e a dar descontos nas tabelas de preços de veículos. Em troca, houve redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e redução de compulsórios para a concessão de financiamentos para a compra de carros.
O ministro admitiu que as montadoras, por exemplo, já ameaçavam dar férias coletivas em função do aumento dos estoques e da falta de crédito para a compra de veículos: “O que fizemos foi um conjunto para estimular o setor automotivo e de bens de capital. O setor automotivo tem uma cadeia longa, com volume de empregos e nós não queremos que haja nenhuma demissão nem nesse nem em outros setores.
Na audiência, o ministro disse ainda que, caso haja um “estresse maior” no cenário internacional, o PIB brasileiro poderá ter um crescimento 1 ponto percentual menor do que o esperado. Em sua apresentação, o ministro reduziu a projeção oficial de crescimento da economia dos 4,5% para 4%, apesar de os especialistas de mercado projetarem um número de 3,2%, segundo dados do Banco Central.
Segundo Mantega, as medidas anunciadas ontem, juntamente com os cortes nas taxas de juros e outras ações adotadas contribuirão para estimular o crescimento econômico. O ministro ressaltou que novas medidas poderão ser tomadas, como a liberação de mais depósitos compulsórios – dinheiro que os bancos têm que deixar depositado no Banco Central – para aumentar o volume de crédito.
Inflação Mantega reiterou que a alta do dólar pode ter efeitos colaterais sobre a inflação, mas o repasse será limitado. “Todo remédio tem efeito colateral, mas você não deixa de tomar o remédio”, afirmou. “Uma consequência (da desvalorização do real) é uma pequena elevação da inflação, mas isso é muito pequeno.” A queda no preço das commodities vai compensar parte desse efeito sobre a inflação, estimou Mantega. “Podemos trabalhar com a taxa de câmbio mais elevada, porque isso ajuda a indústria.” O ministro afirmou que as mudanças no câmbio conseguiram defender o país de políticas de países, como a China e outras economias asiáticas.
BB volta a cortar juros na compra
São Paulo – O Banco do Brasil anunciou ontem a terceira redução de taxas de juros para aquisição de veículos em menos de 60 dias. Segundo nota divulgada pelo BB, as taxas para financiamento de veículos novos, que variavam de 0,95% a 1,99% ao mês, com taxa média de 1,29%, agora passam para 0,77% a 1,79% ao mês, com taxa média de 1,09%. Outra medida anunciada pelo Banco do Brasil é a ampliação do limite financiável para até 100% do valor do veículo. Conforme o comunicado, a nova redução, que vigora a partir de amanhã, reflete as medidas anunciadas ontem pelo governo federal para estimular o consumo de automóveis. O Banco do Brasil anunciou ainda que terá R$ 2 bilhões extras para emprestar no financiamento a veículos por conta das mudanças no compulsório anunciadas segunda-feira pelo Banco Central e pelo Ministério da Fazenda.
A princípio, as novas taxas de juros serão oferecidas até o dia 30 de junho, acompanhando a alteração nas regras para liberação de depósitos compulsórios anunciada ontem pela resolução 3594 do Banco Central. O vice-presidente de Negócios de Varejo do BB, Alexandre Abreu, disse, na nota, que a redução nas taxas de juros vai se somar a outras medidas anunciadas ontem pelo governo federal para reduzir o custo dos financiamentos de veículos. “Nossa expectativa é de que as prestações dos financiamentos de veículos no BB tenham uma redução significativa com essa nova diminuição das taxas de juros, somada aos benefícios com a alteração no IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) e as mudanças no IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), que vão reduzir o custo final de aquisição dos veículos”, afirmou Abreu.
Mesmo com o aumento do financiamento de veículos desde abril com os cortes de juros, o BB informou que suas taxas de inadimplência no segmento estão em queda. Caíram de 2,32% no final de março para 2,22% em abril, considerando os atrasos acima de 90 dias. Abreu avaliou que a queda do indicador de calotes é explicada pelo fato do BB só trabalhar com seus clientes em sua rede de agências no financiamento de veículos, não atuando em revendedoras de carros. "É um público que a gente conhece, sabemos o histórico, o comportamento. A inadimplência do banco está absolutamente sob controle", disse o executivo.