Os furtos e roubos de veículos em Belo Horizonte oneram as apólices das seguradoras, que decidiram pôr na conta dos proprietários o prejuízo pela prestação do serviço nas regiões mais visadas pelos criminosos. Na hora de calcular a proposta, as seguradoras lançam o chamado risco de violência, uma variável sobre a qual o condutor não tem qualquer controle e que pode elevar a despesa, em geral, em mais de um quarto, conforme o bairro. Para segurar um carro popular, o Palio Economy 2010/2011, o motorista de 20 anos que vive em bairros do Noroeste de BH paga, em média, R$ 3.741, valor 26,7% mais alto que seria obrigado a desembolsar se o endereço fosse o Centro/Sul da cidade.
Quando se juntam outras condições que pesam nas propostas das empresas relativas ao perfil e comportamento dos condutores, principalmente os mais jovens, um motorista de 20 anos que vive no Sion, Zona Sul de BH, pode chega a pagar, em média, R$ 7,2 mil por ano pelo seguro completo de um Honda Fit zero quilômetro. Se morasse no Bairro Padre Eustáquio, Zona Noroeste, ele pagaria R$ 11,8 mil por ano. A diferença é de 63,88%, conforme levantamento feito pelo Estado de Minas.
De acordo com corretores de seguro consultados pelo EM, a Região Noroeste, onde estão situados os Bairros Carlos Prates, Padre Eustáquio, Caiçara e Coração Eucarístico, apresenta o custo mais alto para os clientes das seguradoras. Em contrapartida, quem mora na Região Centro-Sul paga os menores valores. A principal justificativa é de que a segurança do local tem de ser incluída pelas empresas do setor na planilha de custos apresentada aos clientes, como parte do perfil do usuário, segundo Elair Ricardo, gerente comercial da corretora Oportunidade.
Morador do Bairro Padre Eustáquio, o administrador de empresas Otávio Goulart é proprietário de dois veículos – um Palio Young 2001 e um Fox 2007 – e decidiu abrir mão do seguro em razão dos preços altos. É que, na avaliação dele, o valor a ser gasto para segurar um carro na Região Noroeste não compensa. “Bati na traseira de um veículo e gastei R$ 700. Se fosse pagar o seguro, o gasto teria sido muito maior. Além do valor anual, eu teria que desembolsar pela franquia. Fazer seguro não compensa”, diz.
O perito criminal Cristiano Otávio vive na casa dos pais, no mesmo bairro, e apesar dopreço pago num Idea 2010 que mantém com banco de couro, sensor de estacionamento, vidro elétrico e som de fábrica, para conseguir arcar com o seguro se viu obrigado a reduzir o valor segurado. Ele deixou de lado itens que valorizam o automóvel e em caso de acidente com perda total receberá abaixo da avaliação de mercado do bem. “O seguro foi feito tendo como referência o modelo básico. Tive que fazer isso para que o valor ficasse mais baixo”, relata.
Facilitadores
A Região Noroeste sofre o maior risco de furtos e roubos na capital mineira por estar próxima de avenidas que servem como rota de fuga em assaltos. Os criminosos aproveitam a proximidade com as avenidas Pedro II e Carlos Luz, Via Expressa e Anel Rodoviário para escolher os locais onde vão atuar. A região concentra quase um em cada quatro assaltos de veículos da capital, segundo estatísticas da Polícia Civil referentes ao primeiro trimestre deste ano. Outros bairros da cidade situados nas proximidades de vias que dão acesso fácil às BRs também influenciam em seguros de custo mais elevado.
Comparativo feito pela empresa HDI Seguros entre o valor do seguro nos bairros 1º de Maio e Centro mostra que a diferença de preço é de 54% para um jovem de até 21 anos, com menos de dois anos de habilitação e solteiro. Enquanto o morador da Região Norte paga R$ 3,6 mil para segurar seu Palio Economy, quem reside no Centro paga R$ 2,3 mil. Mas a variação depende também da seguradora. Cálculos feitos pelo Sindicato das Seguradoras de Minas Gerais (Sindiseg), com o mesmo modelo, mostra que a maior variação chega a 26,49%.
Outro fator que contribui para que a Região Noroeste seja mais visada pelos criminosos é o grande número de instituições de ensino superior que abriga. Isso faz com que o volume de automóveis circulando no local aumente. “O ladrão sabe que a pessoa vai deixar o carro ali durante algumas horas. O carro está lá na rua todo o dia e isso possibilita que ele planeje o furto”, afirma Ronald Gouveia, supervisor da Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos. A falta de equipamentos de segurança nos prédios também sacrifica os bairros Caiçara e Padre Eustáquio, diferentemente de áreas como Lourdes e Savassi.
Audazes pagam mais
Idade, estado civil, sexo e tempo de habilitação dos motoristas entram na planilha de custo das seguradoras e também fazem com que as prestações aumentem ou diminuam. O custo do seguro para um morador do Sion, de 20 anos, pode corresponder a 109% do valor pago pelo vizinho de 40 anos. A mesma situação ocorre entre pessoas que vivem no Padre Eustáquio, onde o valor da prestação paga pelo mais jovem pode alcançar 117% do seguro pedido a um condutor de meia-idade.
A justificativa para essa discrepância é a diferença de comportamento que se espera entre os dois perfis de cliente, feita com base em estatísticas de acidentes e custos de exposição de risco levantados pelas empresas do setor. “A lógica é que o jovem é mais inexperiente e audaz em seus atos”, explica Ângelo Vargas Garcia, vice-presidente do Sindicato das Seguradoras de Minas Gerais (Sindiseg). Outras questões , como sexo e estado civil, são levadas em conta na hora da elaboração do orçamento do seguro. As empresas consideram que os homens se acidentam mais gravemente e com maior frequência do que as mulheres. Ainda de acordo com as estatísticas, os casados têm menor exposição ao risco que os solteiros.
O gênero pesa, da mesma forma, no orçamento de quem tem seguro de carro. Um jovem de 20 anos que vive na Região Centro-Sul paga 7% a mais para segurar um Palio do que uma mulher da mesma idade. Por outro lado, o motorista de 65 anos tem uma despesa 44% menor do que o de um jovem de 20. “Se você faz um seguro de automóvel e tem dois filhos de cerca de 20 anos que dirigem o seu carro, o risco de eles baterem é maior. Se o carro fica na rua, exposto a batidas e assaltos, o custo também aumenta”, diz o gerente comercial da corretora Oportunidade, Elair Ricardo.
Segundo ele, os itens que mais pesam no preço são idade, tempo de habilitação e região onde vive o proprietário do automóvel. Um jovem menor de 21 anos, com menos de dois anos de carteira, solteiro e morador do Bairro 1º de maio, paga R$ 3,6 mil ao ano no seguro de um Palio 1.0. O valor representa três vezes mais do que pagará um adulto com idade entre 43 e 49 anos, casado, com mais de dois anos de habilitação e morador do Centro da cidade (R$ 1,3 mil por ano ).
Nessa lista também pesam outros quesitos, como modelo do carro e até a cor. Segundo supervisor da Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos, delegado Ronald Gouveia, carros populares têm maior facilidade de serem comercializados no mercado clandestino. Essa demanda se assemelha às vendas nas concessionárias. Enquanto isso, o número de furtos de modelos de carros importados é bem menor. Também por isso as cores preta, cinza e prata correspondem a 61% dos veículos furtados na capital mineira. (ZF e PRF)