Mais um índice de maus pagadores volta a colocar na berlinda a efetividade das medidas do governo de ampliação do crédito como forma de estímulo ao crescimento econômico. Segundo o Indicador Serasa Experian de Cheques Sem Fundos, o volume de folhinhas devolvidas em maio chegou a 2,20%, somando mais de 1,7 milhão de unidades do total de 78 milhões que circularam no comércio brasileiro. Esse é o maior percentual registrado para o quinto mês do ano desde 2009, quando 2,52% dos cheques foram devolvidos. A soma de endividamento em alta, renda comprometida e a comemoração do Dia das Mães, segunda melhor data de vendas para o comércio, justifica o patamar alcançado no último mês.
Para o economista da Serasa Experian Carlos Henrique de Almeida, o índice é mais um sinal da dificuldade dos brasileiros em manter as contas em dia. “O consumidor está mais endividado, o que acaba sendo um limite natural para a ampliação do consumo e consequentemente do crescimento econômico”, observa Carlos, que acrescenta: “Certamente os incentivos que o governo está criando para as pessoas irem às compras terão efeito mais retardado diante do comprometimento da renda.”
Somente a partir do próximo semestre os índices de inadimplência devem iniciar trajetória gradual de redução. “Vivemos um momento de taxas de juros mais baixas que garantem grande oportunidade para que as pessoas negociem suas dívidas mais caras. É preciso aproveitar este cenário”, aconselha Carlos, que acredita em resultados melhores nos últimos seis meses do ano. Apesar da liberação de parcela da renda para consumo, economistas não acreditam que os efeitos para o mercado sejam visíveis ainda este ano, ficando para 2013 a retomada mais efetiva do consumo.
Apesar de cada vez menos aceito, o cheque ainda está presente em 15% das formas de pagamento realizadas no país, somando mais de 1,1 milhão de unidades distribuídas no mercado anualmente, segundo dados do Banco Central e da Serasa Experian. Em 2004, esse percentual era de 38%.
Cartão toma lugar
Entre os segmentos que aboliram o cheque estão os revendedores de combustíveis. Segundo Arthur Villamil, coordenador do Departamento Cível Comercial do Sindicato do Comércio Varejista de Derivados do Petróleo do Estado de Minas Gerais (Minaspetro), os baixos valores devidos em cheque não compensavam o ajuizamento de cobranças. “O custo superava o próprio valor da dívida”, explica.
Ao longo dos últimos 10 anos, o setor passou a rejeitar a folhinha, que trouxe prejuízos a vários empresários. Entre eles, a gerente do Posto Wap, no Bairro Caiçara, Sandra Alves. Ela mostra as caixinhas de sapato recheadas com centenas de cheques sem fundos acumulados desde 2000. “Tem mais de dois anos que não aceitamos cheques. Muitos voltavam e não conseguíamos receber, já que não valia a pena protestar”, explica. Hoje, só cartão de débito e dinheiro. “O prejuízo supera os R$ 50 mil”, calcula.
O comércio varejista adota uma série de precauções para evitar o calote. Entre eles, cadastrar o cliente com antecedência. “Hoje há uma filtragem muito grande para se receber o cheque. Com as alternativas criadas, entre elas o cadastro, a inadimplência no setor supermercadista está em menos de 1% ao mês”, afirma o superintendente da Associação Mineira de Supermercados (Amis), Adilson Rodrigues. O que não diminui a preocupação dos empresários, que veem as dívidas migrarem para o cartão de crédito, com juros que ultrapassam 200% ao ano. “Esse é um dinheiro que sairá do consumo e será canalizado para o pagamento de contas mais caras”, prevê Rodrigues.