Na década de 1920, quando quase todas as cidades eram ligadas por trechos de terra, Washington Luís (1869–1957) assumiu a Presidência da República com o discurso de que “governar é abrir estradas”. Quase um século depois, se vivo fosse, possivelmente reformularia sua frase: governar é abrir estradas e mantê-las em boas condições de uso. Há décadas, a malha rodoviária nacional é um dos maiores gargalos para o desenvolvimento do país – as características ultrapassadas aumentam os gastos das empresas, derrubam a competitividade e levam o consumidor a pagar a conta final. Na quarta-feira, porém, a presidente Dilma Rousseff deve anunciar um megapacote de concessões, com obras de infraestrutura para atrair cerca de R$ 100 bilhões em investimentos. Desse total, R$ 40 bilhões devem ser alocados no modal rodoviário. O restante será destinado a ferrovias, portos e aeroportos.
Mais do que reaquecer a economia – é bom lembrar que o Produto Interno Bruto (PIB) de 2012 deve crescer menos do que os 2,7% de 2011 –, o aporte nas estradas vai baixar o chamado custo Brasil. Para se ter ideia, pesquisa da Confederação Nacional dos Transportes (CNT) concluiu que o custo de um frete sobe 91,5% quando o caminhão trafega em rodovias em péssimo estado de conservação. Nos trechos ruins, o custo fica 65,6% maior. Nos regulares, 41%. Mesmo nos trechos bons o transporte fica 18,8% mais caro que o previsto. Apenas nos considerados ótimos não há gasto adicional. O problema, destaca o mesmo estudo, é que 49,1% da malha brasileira está em situação regular (33,9%), ruim (11,2%) ou péssima (2,8%). Outros 5,5% são de boa trafegabilidade. Já 46,6% dos trechos foram avaliados como ótimos.
Boa parte dos trechos considerados ótimos, no entanto, só atingiu o conceito porque é privatizada. E a intenção do governo, com o pacote de quarta-feira, é justamente conceder parte da malha à iniciativa privada. As BRs 040, 050, 116 e 262 devem figurar na lista. Já o trecho da 381 entre BH e Governador Valadares, conhecido como Rodovia da Morte, recebeu nova promessa de duplicação custeada pela União. Alguns dos 10 lotes da obra serão publicados em setembro – o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (Dnit) não informou quantos lotes serão lançados. A via, por enquanto, é o exemplo clássico do descaso do poder público. Sua duplicação é aguardada com ansiedade, pois sua precariedade freia o desenvolvimento e inibe investimentos, afetando a abertura de empregos e o aumento da renda na a região.
Incerteza trava negócios
A lamúria do empresário Osvaldo Jorge retrata bem o que ocorre hoje com a 381. Há alguns anos, ele começou a erguer um hotel com 40 apartamentos em Bela Vista de Minas, cidade cortada pela estrada. Meses depois do início da obra, recebeu a informação de que uma variante de 45 quilômetros seria construída na rodovia, de São Gonçalo do Rio Abaixo a Nova Era, desviando parte do fluxo do traçado original. “Como meu empreendimento está no trecho que vai perder tráfego, precisei suspender a obra”, lamenta. Ele até pensou em construir outro estabelecimento, na nova rota, mas oficialmente ninguém sabe qual será o traçado da variante, pois o projeto executivo sequer está pronto.
A única certeza é de que os dois lotes que tratam dessa variante não estarão entre os editais que serão licitados em setembro. Osvaldo não é o único a perder dinheiro com a demora do governo em concluir a pauta da variante. José, nome fictício de um comerciante de São Gonçalo do Rio Abaixo que pediu para não ser identificado, deseja aplicar R$ 10 milhões na construção de um posto de combustíveis próximo a João Monlevade, mas ressalta que “o governo precisa decidir o local por onde a variante vai passar”. Afinal, enquanto a nova rota não for definida, o empresário não poderá comprar o terreno, que precisa ser às margens da futura estrada.
A morosidade do governo em revitalizar a rodovia impede o desenvolvimento econômico em várias cidades cortadas pela 381. No Vale do Aço, uma das principais regiões econômicas do estado, a expectativa é de que a região tenha como aumentar em 50% sua participação no Produto Interno Bruto (PIB) industrial do estado depois da revitalização do trecho. A conta é do presidente regional da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Luciano Araújo: “O Vale é responsável por 10% do PIB de Minas. Depois da obra, esse percentual pode subir para 15%”.
A quantidade de veículos que transita no local não para de crescer, assim como o volume de mercadorias transportadas nas rodovias. Dados da CNT reforçam a importância da cobrança do empresariado: o transporte de cargas no país saltou de 446,7 toneladas em 2003 para 1.170,7 toneladas em 2010 – crescimento de 162%. A evolução não deixa dúvidas da importância das rodovias para o desenvolvimento econômico do país.