O dado do varejo rechaçou a ideia de esgotamento da capacidade de consumo do Brasil, que ainda tem um quadro do mercado de trabalho robusto. As vendas do varejo subiram 1,5% em junho, ante maio, superando por uma margem ampla o teto das previsões dos analistas consultados pelo AE Projeções (0,75%). Considerando o dado ampliado, que contempla também vendas de automóveis e material de construção, a alta foi de 6,1% em junho, ante maio, também suplantando o teto previsto. Os dados já trouxeram prêmios à curva de juros, na medida em que esvaziam a expectativa de novo corte da Selic em outubro e dão credibilidade ao discurso do Banco Central de reativação da economia. A produção industrial, porém, ainda segue sem acompanhar esse desempenho do varejo, mas o governo mostrou ontem e hoje que está em pleno empenho para revitalizar também os investimentos e criar condições mais propícias ao parque fabril brasileiro.
"O melhor ainda é que esse aumento foi inesperado. O dado evidencia que o corte de IPI surtiu efeito, o que está evidente no item automóveis. Móveis e eletrodomésticos também ganharam forte. O número, de certa forma, rechaça a visão pessimista sobre esgotamento do consumo", comentou o estrategista-chefe do Banco WestLB no Brasil, Luciano Rostagno. "Há uma moderação, mas ela é bem gradual. Não vemos uma parada do consumo doméstico, mesmo porque o mercado de trabalho ainda está forte, o que ajuda a economia a ter um desempenho melhor. O PIB do segundo trimestre deve ter um desempenho melhor mesmo com o enfraquecimento da indústria", disse.
O varejo ampliado, que inclui as atividades de material de construção e de veículos, subiu 6,1% em junho ante maio, na série com ajuste sazonal. O resultado veio acima do teto do intervalo das estimativas dos analistas ouvidos pelo AE Projeções, que era 5,90%. As vendas de automóveis e motos, partes e peças subiram 16,4%, apontando aceleração frente aos 3,5% registrados em maio, para a mesma base de comparação.
Quanto ao enfraquecimento da indústria, o governo acionou nova medida para estimular os investimentos. O governo reduziu o IOF cobrado sobre o seguro garantia de 7,38% para 0% com o objetivo de baratear os projetos de infraestrutura. O secretário-adjunto de política econômica do Ministério da Fazenda, Pablo Fonseca, explicou à Agência Estado que a cobrança do IOF indiretamente onerava os projetos de infraestrutura, pois as seguradoras acabavam cobrando um prêmio maior em função da tributação.
Para a curva de juros, o dado do varejo abala a possibilidade de novo corte da Selic em outubro, mesmo após os comentários da presidente Dilma Rousseff de que segue buscando a convergência dos juros brasileiros com patamares mais condizentes com os praticados no mercado internacional. E os patamares internacionais continuam apontando para baixo. Desta vez foi o primeiro-ministro da China, Wen Jiabao, que sinalizou novas ações de alívio. Ele disse que vê "espaço crescente para operações de política monetária" com a desaceleração dos preços. O comentário foi publicado no site do governo central e sugere que o governo poderá adotar medidas de flexibilização adicionais para impulsionar o crescimento econômico.
Mas os mercados calibram os comentários favoráveis de Wen com o fato de a realidade dos dados mostrarem a redução de força do país asiático. O investimento estrangeiro direto (IED) na China diminuiu 8,7%, para US$ 7,58 bilhões no mês passado. O resultado também foi menor do que o de US$ 12,0 bilhões registrado em junho.
Se a inflação segue em curso mais moderado na China, as pressões das commodities agrícolas continuam impulsionando os preços do atacado no Brasil e podem chegar ao bolso do consumidor final com mais intensidade se os dados de atividade e emprego continuarem mostrando um quadro inesperadamente robusto. Dentro da alta de 1,59% do IGP-10, os preços dos produtos agrícolas atacadistas subiram 6,23%, em comparação com a alta de 1,94% apurada em julho. Os preços dos produtos industriais no atacado desaceleraram, passando de 0,99% para 0,72%, de julho para agosto.
O componente de preços do varejo (IPC-10) subiu 0,29%, o que ainda indica obstáculos para repasse do choque agrícola. Já o IPC-S, também divulgado hoje, ficou em 0,39% ma 2ª quadrissemana de agosto.
"Por enquanto, o IGP-10 está pressionado por um problema de oferta doméstica de hortifrutigranjeiros. Os preços ao consumidor ainda não incorporaram a forte alta dos grãos no mercado internacional", comentou Rostagno.
No dia ainda, o mercado receberá o dado do Caged e o ministro do Trabalho já sinalizou que a criação de empregos com carteira assinada em julho deste ano foi maior do que em 2011. Dados robustos devem esvaziar ainda mais a possibilidade de nova queda da Selic em outubro, mas discursos recentes de autoridades do Banco Central mostram que está dada a queda da Selic de 0,50 ponto porcentual no encontro do Copom de agosto.
Outro vetor de alta para os juros pode vir de dados norte-americanos. O número de trabalhadores norte-americanos que entraram pela primeira vez com pedido de auxílio-desemprego subiu 2 mil, para 366 mil, na semana até 11 de agosto. Os economistas ouvidos pela Dow Jones esperavam alta maior, de 4 mil, mas para um total de 365 mil solicitações, já que tinham como base um dado de pedidos de emprego de 361 mil na semana passada. Mas esse indicador da semana anterior foi revisado em alta, para 364 mil.