Brasília – O governo deixará para a última hora a decisão de prorrogar a desoneração do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para carros, cujo prazo termina na sexta-feira. Diante de números positivos para as vendas, mas não tão bons para a arrecadação, a equipe econômica ainda faz as contas para saber se é possível conceder mais uma benesse diante de um espaço fiscal já bastante comprometido para 2012. Aproveitando essa indefinição, as concessionárias fazem a festa. A promessa é de um fim de semana de ofertas agressivas para atrair clientes. A ordem é convencer o consumidor de que quem deixar para depois poderá pagar mais caro para levar o carro para casa.
Alheia a essa euforia, a equipe econômica ainda estuda os impactos que uma extensão do benefício acarretaria nas contas públicas. É sabido que a arrecadação federal está comprometida em função de outras medidas tributárias concedidas pelo governo, como a extensão do desconto do IPI para a linha branca e a inclusão de outros setores, como móveis, materiais de construção e painéis de madeira.
Pesa ainda o fato de que as receitas ainda não reagiram conforme o esperado, mas é consenso internamente que a medida contribuiu para reduzir estoques e reanimar o consumidor brasileiro. Oficialmente, o Ministério da Fazenda diz que o assunto voltará à mesa de discussões em duas ocasiões na próxima semana, mas há quem afirme que a decisão de estender a isenção do imposto já foi tomada.
Retorno gradual
Assessores do ministro Guido Mantega, titular da pasta, têm afirmado que o martelo já foi batido pela prorrogação, mas ainda não está certo por quanto tempo ou se ela seria integral, como foi para o setor de linha branca (máquinas de lavar, geladeiras, tanquinhos etc). Conforme contou uma fonte que pediu para não ser identificada, havia uma possibilidade de o governo promover um retorno gradual das alíquotas de IPI, hoje zeradas, nos moldes do que foi feito em 2009. Na ocasião, a equipe econômica adotou a elevação paulatina do tributo, como forma de não interromper a retomada da indústria frente à crise financeira global.
A volta do IPI em etapas foi sugerida ao ministro por um executivo de uma grande montadora. Não se sabe, porém, se Mantega adotará esse modelo dessa vez, mas é consenso que uma definição pela extensão do benefício está mesmo sacramentada. O anúncio, entretanto, somente seria feito no fim da semana que vem. Com isso, o governo atenderia um pleito do próprio setor, que quer evitar que o consumidor postergue a compra do carro, prejudicando o resultado das vendas da indústria automotiva.
Em julho, segundo os últimos números disponíveis divulgados, a comercialização de automóveis totalizou 364.196 unidades, um recorde para o mês, segundo dados da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). Para este mês, a previsão é de resultados ainda melhores. Caso os prognósticos se confirmem, os brasileiros levarão para casa 385 mil veículos, uma marca histórica não só para agosto como para toda a indústria automotiva, conforme projeção da Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave).
Novo pacote fica para setembro
Brasília – A segunda parte do plano de investimentos federais em logística, contemplando portos e os aeroportos, incluindo os terminais de Confins, em Minas, e do Galeão, no Rio de Janeiro, sairá em setembro e deve incluir ainda mais medidas de desoneração. Mas a data do lançamento do plano ainda não foi marcada. Até lá, a presidente Dilma Rousseff vai amadurecer sua decisão sobre o modelo que irá escolher, após uma série de consultas e de estudos de experiências no exterior. Preocupada em garantir a introdução de novas práticas de operadores internacionais, a presidente deverá elevar o nível de exigências de qualificação técnica e de experiência dos candidatos às licitações.
“A solução encontrada para o trem bala já garantiu a concorrência dos cinco principais detentores da tecnologia”, informou o presidente da Empresa de Projetos e Logística (EPL), Bernardo Figueiredo. Segundo ele, a exemplo do pacote de
R$ 133 bilhões recém-anunciado pelo Palácio do Planalto para rodovias e ferrovias, a renovação de concessões e a licitação de novas áreas também terão como alvo a atração de recursos e a aceleração de projetos. A diferença desta vez será a ênfase na gestão. “Se dermos preferência aos concorrentes que tiverem experiência comprovada na área, o risco de interrupção da obra será menor”, comentou. Ao todo, o novo pacote de Dilma pretende estimular mais de R$ 220 bilhões de investimentos da iniciativa privada em infraestrutura.
O líder da estatal criada semana passada para conduzir projetos estratégicos e coordenar o planejamento da logística não quis, contudo, adiantar sobre quais serão os próximos alvos de concessões aeroportuárias. “Cada terminal tem lógica e demandas próprias e precisam de soluções ajustadas”, disse. Para o setor marítimo, ele lembra que o governo levará em conta aspectos levantados em estudos encomendados pela Secretaria de Portos à Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
Sem gargalos
Mesmo considerando exagerada a estimativa de consultorias e do setor privado de um passivo logístico de
R$ 300 bilhões, 20 vezes superior ao orçamento de 2012 do Ministério dos Transportes, Figueiredo acredita que o país está rumando para equacionar todos os gargalos do setor no longo prazo. “Recursos deixaram de ser o maior problema. Nos próximos anos, o governo poderá arcar com mais o risco dos projetos, situação que se inverterá em seguida, com maior presença do capital privado, até atingir o ponto de equilíbrio, com atualização permanente da infraestrutura”, explicou.
Contra os críticos do trem de alta velocidade (TAV) entre São Paulo e Rio de Janeiro, projeto ao qual mais se dedicou no governo quando presidia a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), Figueiredo sublinha que seu orçamento, de R$ 34 bilhões, não concorre com nenhum outro investimento do setor, além de ser uma alternativa imposta pela saturação da ligação rodoviária entre as duas maiores cidades do país. “Caro é não ter”, afirmou, usando um bordão do empresário Jorge Gerdau, conselheiro de competitividade de Dilma. Um sintoma disso, acrescentou, poderá se refletir no custo do frete.
Para Figueiredo, a solução de graves problemas logísticos do país não passa, necessariamente, por grandes projetos de alcance restrito. “Antes de tudo, é preciso avaliar toda as consequências futuras dos investimentos para que novos problemas não surjam adiante”, disse.
Logística contra os entraves
No vocabulário grego, a palavra logistikos (em português, logística) pode ser traduzida como “aquele que sabe calcular com racionalidade”. No entendimento do engenheiro Eliezer Batista, peça fundamental, entre outras, na construção da ferrovia Vitória–Minas para aumentar a rentabilidade do minério exportado para a China na década de 1960, o Plano de Logística Integrada apresentado pela presidente Dilma Rousseff (PT) pela primeira vez coloca a engenharia de transportes do país à frente de problemas políticos, com um planejamento de longo prazo para o setor. “Serão construídas ferrovias para onde se tem carga para ser transportada. Naquela época, as ligações do Nordeste foram de caráter político”, afirmou ele, que, por repetidas vezes, reitera a necessidade de o país investir em educação para desatar outros tantos nós do desenvolvimento.
Palestrante do projeto Dirigente 2012, organizado pela Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), o ministro do governo João Goulart na década de 1960 (o engenheiro foi também presidente da Vale, ministro de Assuntos Estratégicos de Fernando Collor e é pai do empresário Eike Batista, da MMX) considera um erro a priorização das rodovias nos últimos 50 anos, do governo Juscelino Kubitschek para cá. Mas diz, em referência ao presidente mineiro: “Não foi um erro propositado. Ele teve grande mérito de trazer a indústria automotiva para o país”, ressaltando que a falha de planejamento resultou na falta de um modal para transportar carga pesada, o que lançou milhares de toneladas de produtos nas rodovias e, por consequência, causou o aumento de acidentes e a deterioração do asfalto. Ele reitera a necessidade de se realmente integrarem os modais, criando um planejamento entre terra, ar e mar.
Aos 88 anos, ele se mostra otimista em relação aos resultados que podem ser alcançados pelo plano e diz concordar com a presidente que, se confirmadas, as medidas podem desatar nós do crescimento econômico. Mas diz ser necessário ter agilidade para iniciar as obras para o plano não ser tratado como apenas mais um e acabar por cair em descrédito com o empresariado e com a população.
Educação
Para evitar que o crescimento enfrente um entrave semelhante ao logístico nos próximos 50 anos, ele considera prioritário o investimento em educação para possibilitar o desenvolvimento do país. E cita o caso da Coreia do Sul, que nas últimas três décadas investiu forte na melhoria do ensino e em pesquisa e desenvolvimento e inovação. “Copia a Coreia [do Sul]. É o melhor caminho para a gente. Sem educação o país não vai a lugar nenhum”, afirma.
O engenheiro aponta que o caminho é incentivar a criação de tecnologia e inovação para que o estado seja capaz de processar por aqui mesmo tudo que é economicamente viável, sem ter a necessidade de exportar para depois adquirir um produto manufaturado. “Ficar rico sem trabalhar é difícil. É preciso ter disciplina”, afirma, repetindo que o sucesso sul-coreano é reflexo de uma educação rígida.