Enquanto governo e setor privado discutem quem tem razão na polêmica em torno dos juros altos cobrados no cartão de crédito, os bancos públicos sinalizam que não querem entrar nessa briga. O assunto é motivo de desentendimento entre assessores do ministro da Fazenda, Guido Mantega, e representantes das operadoras de cartões, que têm ido constantemente a Brasília nos últimos dias.
Chamados a participar dessas reuniões, Banco do Brasil (BB) e Caixa evitam se posicionar. "Não colocamos esse bode na sala", disse ao EM um executivo de um desses bancos. Ele se refere à justificativa dos executivos das operadoras de que os altíssimos encargos cobrados no crédito rotativo do cartão são consequência da falta de atratividade, para os bancos, das transações conhecidas como "parcelado sem juros". Nessas operações, quem assume o risco de um possível calote é o emissor do cartão, geralmente um grande banco ou financeira.
A justificativa para juros que chegam a 600% ao ano no crédito rotativo é o baixo lucro que os bancos alegam ter para assegurar o pagamento em dia das compras feitas no cartão. Como contrapartida, essas instituições cobram uma taxa de remuneração dos chamados adquirentes — empresas como Cielo e Redecard, que dominam mais de 90% do mercado. Esses, por sua vez, repassam os custos ao lojista, que reclama dos juros altos.
“Nos últimos anos, nossas margens têm sido reduzidas ao máximo e não conseguimos mais segurar os custos de parcelar uma compra em 12 ou 16 meses. Então, reduzir o número de parcelas da operação sem juros pode ser uma boa tanto para os bancos quanto para o varejista”, diz o presidente da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL), Roque Pellizzaro Júnior. Ele explica que a situação do parcelado sem juros fugiu do que se propunha no início. “A operação está se tornando insustentável, tanto pelo lado dos varejistas quanto pelo dos bancos”, alerta.
Endividamento
Para compensar esse quadro, os bancos pesam a mão nos juros do rotativo. Hoje, essa modalidade cobra, em média, juros de 10,7% ao mês. Ao ano, essa taxa sobe para 238%. Apesar disso, esse é um mercado em expansão no Brasil. Números da Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs) mostram que pagamentos com cartão já representam 41% das transações do mercado de meios eletrônicos. “Desse total, 70% do volume financeiro movimentado são resultantes da utilização da modalidade do pagamento sem juros”, justifica-se a Abecs, reiterando que o volume do crédito rotativo representa “em torno de 1,7% do total de crédito destinado à pessoa física”.
Mesmo assim, o endividamento do brasileiro com cartões cresce sem parar. O comprometimento da renda do consumidor médio passaria de 43% para 50% caso o Banco Central contabilizasse os débitos parcelados no cartão de crédito.
Para os bancos públicos, ao reduzirem os juros cobrados do consumidor, esse endividamento poderia cair com mais força. “Na Caixa, nós estamos sempre precificando nossas operações, e quando vemos que há espaço para cortar juros, cortamos. E é isso que o bancos privados também tinham que fazer”, disse uma fonte do banco, que pediu anonimato. No Banco do Brasil, a queixa é a mesma. Oficialmente, as instituições preferiram não comentar o assunto.