Assim que conquistou o diploma de ensino médio, a jovem Flávia Helena Fonseca Lobo, de 19 anos, decidiu sair um pouco de debaixo das asas dos pais e conseguiu, há poucos meses, seu primeiro emprego formal. Vendedora de uma loja na Savassi, ela economiza parte do salário, de R$ 1 mil, para comprar um carro, sonho da maioria dos brasileiros. “Era horrível pedir dinheiro emprestado. Para qualquer gasto, precisava recorrer à família. Agora, pago minhas contas e ainda ajudo nas despesas do lar. Não sei mais o que é pedir R$ 1 emprestado. É uma sensação maravilhosa”. A entrada de Flávia para o mercado de trabalho é mais um exemplo de como as mulheres estão conquistando maior espaço em todo o país. Tanto que, entre 2009 e 2011, o rendimento médio mensal do trabalho delas subiu de 67,1% para 70,4% em relação ao dos homens. Em Minas, porém, tal proporção caiu de 72,3% para 67,2%.
Os dados são da última edição da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), divulgada ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O curioso é que um indicador que ajuda a medir a desigualdade, chamado de Índice de Gini, mostrou que o rendimento médio entre as próprias mulheres ficou mais igualitário. O mesmo ocorreu com os homens – o Índice de Gini oscila de zero a um, e quanto mais baixo, melhor é o resultado. Dessa forma, o indicador que leva em conta o rendimento médio delas caiu de 0,499 para 0,462. O deles, por sua vez, baixou de 0,494 para 0,486.
Em 2011, o rendimento médio dos homens foi de R$ 1.421 e o das mulheres de R$ 955, em Minas Gerais. “Interessante observar que, entre as mulheres, melhorou a distribuição (de renda), mas, se comparada à dos homens, houve a piora. Provavelmente porque o rendimento delas cresceu menos do que o deles. O rendimento médio real mensal das pessoas de 10 anos ou mais de idade em Minas subiu 8,4%, chegando a R$ 1.228,00. No entanto, esse aumento foi proporcionalmente maior para os homens (10,8%) do que para as mulheres (3,0%)”, explicou Luciene Longo, técnica do IBGE e uma das responsáveis pelo estudo em Minas.
No Brasil, o percentual do rendimento médio mensal das mulheres subiu na comparação com o dos homens, de 67,1% para 70,4%. Em nível nacional, o rendimento médio mensal de trabalho dos homens ocupados foi de R$ 1.508 em 2011. O das mulheres, de R$ 1.113. De modo geral, o rendimento médio mensaal do brasileiro (homens e mulheres) subiu 8,3% entre 2009 e 2011, alcançando R$ 1.345,00. O percentual ficou um pouco abaixo do apurado em Minas (8,4%), mas o rendimento mensal médio nacional superou o do estado (R$ R$ 1.228).
Menos pobres O maior aumento (29,2%) em relação à alta do rendimento médio nacional foi registrado na camada dos 10% da população com menor poder aquisitivo, o que revela um recuo na desigualdade social no país. Por outro lado, 41,5% da renda recheiam os bolsos de apenas 10% dos residentes no país. Há dois anos esse percentual era de 42,5%. Essa pequena queda também ilustra a diminuição da desigualdade no país, porém, deixa claro que a disparidade de distribuição de renda ainda é alarmante. O aumento no nível de emprego ajuda a reduzir a desigualdade. Da mesma maneira, estimula o crescimento do trabalho formal, que apurou alta entre 2009 e 2011.
Para se ter ideia, a quantidade de carteiras de trabalho (CTPS) assinadas no setor privado subiu 11,8% no período, chegando a 33,9 milhões de empregados em 2011. O IBGE constatou que, no país, o contingente de ocupados cresceu 5,2% nos setores de serviços (41,5 milhões de pessoas), aumentou 1,9% no comércio e reparação (16,5 milhões) e subiu 13,6% na construção (7,8 milhões). Por outro lado, ocorreram quedas no setor agrícola (-7,3%) e na indústria (–8,0 %). Esse último resultado – é bom frisar – é decorrente da crise internacional, deflagrada em 2008 e que ainda não foi vencida pela indústria.
“Em 2011, os empregados com carteira de trabalho assinada obtiveram ganho real de 4,9% em relação a 2009. Os militares e estatutários e os outros empregados sem carteira de trabalho assinada também tiveram acréscimo no rendimento do trabalho principal (6,2% e 11,6%, respectivamente). Considerando os trabalhadores domésticos com carteira de trabalho assinada, o aumento no rendimento foi de 5,2%, enquanto para os sem carteira foi de 15,2%”, informou o relatório do IBGE.
Baixa renda chega a 16,6%
Apesar do aumento do emprego formal em todo o país, entre 2009 e 2011, muitas famílias brasileiras sobrevivem com rendimento per capita de até meio salário mínimo. Na Região Sudeste, Minas Gerais lidera o triste ranking. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios (Pnad), 16,6% da população vive com até R$ 311 por pessoa, o que corresponde a uma média diária de R$ 10. No estado de São Paulo e no do Rio de Janeiro, respectivamente, esses índices são de 9,2% e 12,5% famílias. O IBGE não detalhou as regiões do estado que concentram o maior número de pessoas de baixa renda.
Aos 19 anos, depois de ter trabalhado como babá, faxineira e vender pipoca em circo, Paloma Natalícia dos Reis Faria decidiu mudar-se de Perdões, no Sul de Minas, para Belo Horizonte. Ela migrou em busca de um futuro melhor para si e a família. Na terra natal, além dela, os pais sustentavam mais meia dúzia de filhos. Todos comiam com o salário “quase mínimo” que o pai suava para ganhar. Muitas vezes, recorda a jovem, o valor líquido era suficiente somente para pagar as contas de água e luz. Sobrava, acrescenta Paloma, “um trocado para a comida”.
“A gente se virava do jeito que dava”, recorda Paloma, que, hoje, consegue remeter R$ 200 para ajudar no orçamento familiar. A quantia pode parecer pouca, mas é uma boa cifra para muitos brasileiros. Dados como a renda per capita têm reflexo direto na habitação. O estudo mostra que apenas dois terços das famílias mineiras que têm renda per capita de meio salário mínimo ocupam casa própria. É o caso de Paloma, que sonha em entrar na faculdade e poder comprar a sua própria habitação.
“É um plano para o futuro”, diz ela. Enquanto isso, no caso da parcela de mineiros com rendimentos superiores a cinco salários (a faixa mais alta) 90,1% têm imóvel particular. Se comparado aos capixabas, essa diferença é significativa. No Espírito Santo, da fatia mais rica apenas dois terços já conseguiram comprar um imóvel.
Casa própria
Em 2011, o numero estimado de domicílios particulares permanentes foi de 61,3 milhões, 4,7% a mais que em 2009. Desse total, 45,8 milhões (74,8%) eram domicílios próprios. A média de moradores por domicílio caiu de 3,3 em 2009 para 3,2 em 2011. Mais brasileiros estão morando sozinhos. O número de domicílios unipessoais aumentou de 7 milhões para 7,8 milhões no período.
“O rendimento médio mensal real dos domicílios particulares permanentes com alguma renda foi estimado em R$ 2.419,00 em 2011, representando ganho real de 3,3% em relação ao de 2009 (R$ 2.341,00). Houve aumento do rendimento domiciliar em todas as grandes regiões. O Nordeste do estado registrou a menor variação (2,0%) em relação a 2009, assim como, o valor mais baixo (R$ 1.607,00) ”, destacou o IBGE. (PRF e PHL)