Uma delas, inclusive, tem ganhado destaque nos blogs especializados em passagens aéreas. No Melhores Destinos e no Aquela passagem, clientes reclamam da mudança nas regras do programa Sempre Presente, do Banco Itaú. A insatisfação é justificada pelo aumento em 100% do limite mínimo para a transferência de pontos para as companhias aéreas. Agora, os consumidores precisam ter 20 mil pontos para fazer a transferência e trocá-los por uma passagem aérea. Antes, com 10 mil pontos obtidos nos cartões de crédito Itaucard era possível realizar a troca.
Ainda de acordo com os consumidores, a decisão não foi comunicada aos participantes do programa. Para juntar 20 mil pontos pelo Itaú, os clientes que pagam uma fatura média de R$ 1 mil vão levar 40 meses – 3 anos e 4 meses. Isso porque o banco converte a fatura em dólar e remunera o cliente com um ponto por dólar, o que, nesse caso, significaria 500 pontos por fatura, considerando a cotação do dólar na casa dos R$ 2.
A decisão afeta consumidores que optam pelos programas Smiles Gol, TAM Fidelidade, Lanpass e TAP Victoria. O Itaú tem ainda convênio com a CVC, mas o vale-presente mais barato, no valor de R$ 250, custa ao cliente 39,6 mil pontos. A empresária Ana Marina Cipriano Rabelo Freitas Ferrer, que há oito anos é correntista do Itaú, revela desconhecer as alterações nas regras do programa Sempre Presente e reclama da falta de informações. Segundo ela, que usa o cartão de crédito para fazer as compras da loja, a intenção é concentrar os gastos no dinheiro de plástico para depois utilizar o benefício.
Ela conta que em cinco faturas acumulou 15 mil pontos e não sabia que agora precisará ter no mínimo 20 mil para conseguir uma passagem. A intenção da consumidora era utilizar ainda este ano os pontos adquiridos para voar até Corumbá, em Mato Grosso do Sul, onde vive a sua família. “Entendo que esse é um direito adquirido a partir do momento em que pago pelos pontos. Mas percebo que a falta de informações pelos bancos atrapalham a utilização do benefício”, diz. “Não fui informada da mudança e nunca recebi um documento com informações sobre as normas”, acrescenta.
Segundo Ana Marina, há cerca de dois meses ela vem tentando obter informações sobre o programa e a transferências dos pontos no banco. “Já procurei saber com a gerente, mas até hoje os meus pontos estão parados. Tenho medo de que a validade dos pontos expire e eu não consiga, de fato, utilizá-los na troca por passagens”, afirma.
Usuário do Programa Fidelidade, do Santander, o engenheiro mecânico Fernando Quadros precisou usar os seus pontos para fazer uma viagem, mas foi surpreendido pela demora do processo. “No atendimento da operadora do cartão fui informado que o tempo para transferência das milhas é de até oito dias úteis, ou seja, quase duas semanas, e esse prazo fez com que eu perdesse algumas promoções de trechos”, explica. O consumidor questiona os prazos do programa e diz que nem em uma transação bancária internacional os prazos são longos como o estabelecido pelo banco no resgate dos pontos. “A publicidade na TV não fala sobre isso, apenas sobre as vantagens de acumular pontos no cartão de crédito A ou B”, lembra.
Insatisfeito, Quadros reclama do atendimento recebido durante o pedido de transferência dos pontos e das oportunidades de compra perdidas com a demora. “O programa de milhagens do cartão é muito vantajoso, mas o setor de atendimento não informa o motivo dessa morosidade. Com isso, perdi oportunidades para o resgate da passagem e tive prejuízos financeiros”, reclama. “Creio que temos tecnologia disponível suficiente para uma transação bem mais rápida, porém não sinto dos bancos e companhias aéreas esse interesse”, conclui.
POLÍTICA Procurada, a Itaucard confirmou as mudanças no Sempre Presente para o resgate de pontos de companhias aéreas e justificou que a alteração ocorreu “em função de ajustes da política praticada pelas próprias companhias”. Ainda de acordo com a Itaucard, as alterações foram comunicadas no site do programa.
Por nota, o Santander informou que o prazo de oito dias úteis para o resgate está estabelecido no regulamento do Recompensa Superbônus, disponível no site do banco. Afirmou ainda que o prazo visa atender todas necessidades nos processamentos das transações entre as empresas, mas que busca solucionar as demandas de seus clientes no menor prazo possível.
Falta de informação e abuso são comuns
Segundo o advogado especialista em defesa do consumidor Luiz Fernando Valadão Nogueira, a fidelização do cliente por meio de pontuação pode ser considerada uma relação de consumo, e por isso, em casos de insatisfação cabe reclamação nos órgãos de defesa do consumidor, mas também o encaminhamento do problema à Justiça . Isso porque, segundo ele, o cliente é protegido pelo Código de Defesa do Consumidor.
Ainda de acordo com Valadão, como os bancos convencem o cliente, por meio de publicidade, a obter pontuação que será trocada por benefícios, há a obrigatoriedade de que também resguardem os direitos de seus clientes. “O Código de Defesa do Consumidor (CDC) exige que não haja publicidade enganosa e que não se coloque em vigência métodos desleais para atrair o consumidor”, diz. “Essa é uma relação bilateral. Se para atingir o benefício o consumidor cumpriu sua parte ao utilizar o cartão para alcançar a pontuação, os bancos também devem cumprir sua parte”, comenta.
Para o assessor jurídico do Procon Assembleia, Renato Dantés Macedo, o grande problema dos programas de fidelidade é a falta de informação. “Não existe um contrato apenas para o plano de fidelidade oferecido pelos bancos, a bonificação é embutida no cartão de crédito e as informações ficam dispersas”, diz. Como o consumidor deve ir atrás das informações, muitas dúvidas acabam sendo geradas no processo de obtenção, resgate e troca dos pontos. “Muitas vezes as regras e normas são alteradas em função da falta de informação e aí o direito é violado”, explica.
Para esses casos, no entanto, o assessor lembra que há a proteção pelo código. “O que não pode ocorrer é uma alteração unilateral, porque o direito do consumidor fica restringido, e, dessa forma, temos uma prática abusiva”, esclarece. Entre os abusos, o assessor jurídico destaca não só o aumento de pontos mínimos para a transferência como também os prazos estendidos para o resgate dos pontos que culminam na perda de promoções de passagens. Macedo lembra que, no caso de alterações, os atingidos devem ser apenas os novos clientes. “As mudanças devem valer apenas para os novos contratos e não para os antigos. Os correntistas que já usam o plano há muito tempo devem continuar com a política válida anteriormente”, orienta.
PREFERIDOS A TAM e Gol Linhas Aéreas estão entre as companhias mais procuradas pelos consumidores, por meio das redes Multiplus e Smiles, respectivamente. As redes transformam os pontos acumulados em passagens aéreas e outros produtos. Só na Multiplus, por exemplo, 300 mil passagens são trocadas todos os meses, o equivalente a 95% das operações de troca.
Artigos que protegem os
consumidores nesse caso
Art. 6º – São direitos
básicos do consumidor:
III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço,
bem como sobre os riscos que apresentem;
IV – a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;
V – a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;
Art. 46 – Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance.
Art. 51º – São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade.
Fonte: Código de Defesa do Consumidor (CDC)