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Estado de Minas

Decisão inédita da Justiça cerca falsos seguros automotivos em Minas

Decisão classifica modalidade como prestação de serviço, estabelece relação de consumo e abre precedente para reclamações que antes iam para varas comuns


postado em 26/10/2012 06:00 / atualizado em 26/10/2012 08:22

A proteção automotiva, uma espécie de seguro, amplamente comercializada por associações informais que nasceram em Minas mas que hoje estão espalhadas por 18 estados do país, pode ser atropelada pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC). Decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) classificou a chamada proteção veicular como uma prestação de serviço, e, com isso, estaria sujeita a aplicação de penalidades previstas pelo CDC. A decisão abre precedentes para obrigar as entidades a tratar seus associados como consumidores, garantindo-lhes os direitos previstos na lei. Até então, os associados dessas entidades só podiam recorrer à Justiça comum, não eram considerados consumidores.

O mercado informal cresceu no país, principalmente nos últimos cinco anos, impulsionado pelas associações que vendem o produto sem registro na Superintendência de Seguros Privados (Susep) e sem a fiscalização do órgão. As entidades não cumprem medidas como a reserva técnica para garantir o pagamento das indenizações e também não seguem regras como a submissão de seus diretores à aprovação do órgão regulador. Seus associados, por sua vez, ficam sem as garantias do mercado formal.

De janeiro a outubro deste ano o Procon de Belo Horizonte registrou 160 reclamações referentes à proteção veicular. No ano passado foram 94 reclamações, o que aponta um crescimento de 70% até o momento. Segundo dados da Susep, 300 entidades funcionam no país. A atividade que nasceu como ação entre caminhoneiros agora segura de veículos usados até o mercado de luxo, como os veículos importados. Em Minas são 109 entidades ativas, no Sudeste são 194. O mercado informal movimentou perto de R$ 2 bilhões em 2011, segundo dados do próprio setor, e faz crescer o alerta para a população.

Apesar de recolher dinheiro do público para promover a chamada proteção contra acidentes e roubos, o serviço até então não era considerado uma relação de consumo. Isso significa dizer que os associados devem procurar a Justiça comum para resolver qualquer problema referente a prestação de serviço ou negativa de coberturas, já que até então não contavam com a proteção do CDC.

“Mas a decisão do Tribunal de Minas abre um precedente para que o Código de Defesa do Consumidor seja observado nessa relação”, aponta Maria Laura Santos, coordenadora do Procon de Belo Horizonte. A advogada participou do seminário que tratou do tema da proteção automotiva na Associação Comercial e Empresarial de Minas (ACMinas) na última quarta-feira. Maria Laura citou parecer do desembargador Arnaldo Maciel. Em decisão que atingiu a Associação dos Escrivães da Polícia Civil do Estado de Minas Gerais (Aespol), o desembargador declarou nula a cláusula do contrato de prestação de serviço, que previa suspensão da cobertura do seguro de uma associada por atraso de pagamento das parcelas, por se tratar de cláusula abusiva prevista no CDC. “Sendo a associação pessoa jurídica de direito privado, que oferece a prestação de serviços securitários, mediante remuneração, caracteriza-se como fornecedora de serviços”, diz a decisão. Segundo o TJ, o fato de ser uma associação não impede a aplicação do CDC.

Ação conjunta

Uma força-tarefa que reúne a Susep, a Polícia Federal e Ministério Público Federal foi montada para combater a proliferação dessas associações. A Polícia Federal promoveu o fechamento de 20 entidades, e no país, cinco associações estão proibidas de comercializar seus produtos, sendo quatro delas em Minas Gerais.

Danilo Santana, presidente da Associação Brasileira de Consumidores (ABC), diz que o recurso de mascarar prestação de serviços com a roupagem de associações atinge muitos segmentos do mercado. “No fundo, o que as associações promovem é uma prestação de serviço com cobrança de valores, e cabe a aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Outra discussão que cabe é a isenção desse mercado do recolhimento de impostos.” Santana explica que uma associação de prestação de serviço é diferente, por exemplo, de um clube de recreação, onde seus sócios participam de forma coletiva do serviço, podem ser eleitos e têm direito a voto.

 

Número de processos cresce 14 vezes no ano

 

O número de processos administrativos movidos pela Superintendência de Seguros Privados (Susep) é um termômetro do aquecimento do mercado da proteção automotiva. Em 2011 foram 192 processos, expansão de quase 14 vezes em relação às 14 ações movidas em 2006. O Procon municipal orienta que antes de contratar um seguro o consumidor deve observar se a empresa tem registro na Susep e se o produto é vendido por corretores.

Pesquisa do Instituto Ibope aponta que o consumidor do mercado da proteção automotiva desconhece as regras do mercado. Entre os entrevistados, 19% disseram considerar o programa de proteção veicular igual aos seguros oferecidos pelas seguradoras convencionais. Outros 58% afirmaram conhecer o serviço do mercado informal e acreditam que a compra é feita por meio de um corretor de seguros.

Júlio Avelar, superintendente da Central de Proteção do Seguro da Confederação Nacional das Seguradoras (Cnseg), informou que o objetivo é alertar aos consumidores que a proteção não tem fiscalização do governo. “É como um remédio falso, que se precisar ser usado pode não funcionar”, compara. A estimativa é de que no país 500 mil veículos estejam ligados às associações que oferecem a proteção. Vale observar que essas instituições não abarcam mais apenas caminhões ou veículos velhos. Agora atingem também os carros novos, ou seja, partiram para a disputa direta com o setor formal. (MC)


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