A supervisora administrativa Rafaela Campos, 27 anos, está grávida de 37 semanas. Ela gostaria de poder trabalhar neste momento apenas meio período, sem prejuízo ao salário e demais direitos até o momento em que começar a sua licença-maternidade, conforme prevê projeto de lei de do deputado Antônio Roberto (PV-MG), que acrescenta esse inciso à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). “Quando se aproxima do fim da gestação, o cansaço é maior”, justifica Rafaela. Mas a empresária Christiany Cortes, 42, dona de um salão de beleza, acha desnecessária a criação desta norma. “Gravidez não é doença. Quando tive meus filhos, trabalhei até um dia antes do parto”, diz.
Esse é apenas um entre 5.255 projetos de lei que tramitam na Câmara dos Deputados com o intuito de alterar a CLT. Isso sem considerar as propostas apensadas — aquelas vinculadas a outras semelhantes. Seja para fortalecer os direitos do trabalhador, seja para flexibilizá-los, há uma unanimidade entre os parlamentares: as leis atuais devem ser atualizadas de alguma forma.
A vice-presidente da Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público da Câmara, deputada Flávia Morais (PDT-GO), acredita que o volume de projetos de lei para tentar aprimorar a CLT é resultado da abertura que a própria história do Brasil concede às questões trabalhistas. “São vários segmentos buscando melhorar as condições de trabalho. Mas considero alguns projetos exagerados, chegando a criar dificuldades para as relações entre patrões e empregados, no sentido de onerar a folha de pagamento e causar o desemprego”, observa.
É o que teme o empresário do setor têxtil Rivaldo Moura, 40, diante de um projeto de lei do deputado Marçal Filho (PMDB-MS) que propõe a unificação do período de férias aos casais que trabalham em empresas diferentes. “Não funciona porque há meses em que não podemos dar férias e, muitas vezes, o período não vai encaixar. Se isso acontecer, teremos que aumentar o quadro de funcionários”, acredita.
Demagogos?
A maioria dos projetos de lei, segundo o deputado Sílvio Costa (PTB-PE), não contribui para um avanço expressivo das relações trabalhistas. “Desses 5 mil projetos, posso afirmar com tranquilidade: 90% são de origem demagoga e paternalista”, avalia. “Mas o fato de haver essa quantidade de projetos de lei sinaliza que precisamos colocar as questões trabalhistas em debate”, pondera o deputado.
Essa discussão fará parte do seminário Novas relações de trabalho para o Brasil do século 21, que os Diários Associados realizam em 7 de novembro, em Brasília, entre as 8h30 e as 18h, no auditório do jornal Correio Braziliense, com participação de representantes sindicais, empresários, juristas e parlamentares.
Para a deputada Flávia Morais, o debate na esfera legislativa precisa ter como objetivo uma análise criteriosa dos projetos de lei. “É importante que cada um seja visto sem olhar preponderante favorecendo um ou outro. Só avançaremos se houver um equilíbrio entre o que é melhor para todas as partes”, ressalta.
A deputada Érica Kokay (PT-DF) concorda que é importante realizar atualizações à CLT, desde que não configure ônus para o trabalhador. “Alterar não pode representar retirada de direitos do trabalhador”, pontua.
No entanto, com o aumento de obrigações do empregador para com o empregado, Silvio Costa critica que a maioria dos projetos de lei que tramitam na Câmara são destinados a onerar a folha de pagamento das empresas. “Como consequência, isso estimulará a informalidade”, diz. Para Kokay, aumentar os direitos dos trabalhadores não necessariamente significa perda para o patrão: “É preciso considerar que o aumento na qualidade de vida do trabalhador eleva o nível de produtividade, que resulta em ganho para a empresa”.
O deputado Júlio Delgado (PSB-MG) entende que o caminho ideal para a modernização das relações trabalhistas não está na profusão de novas regras. “Muitos desses projetos são afins, para demonstrar que existe uma necessidade de atualização das leis trabalhistas. Precisamos compilar esses projetos e ter uma proposta mais real e viável”, sugere.
Colaborou Carlos Júnior Garcia, especial para o Correio
Discussões em andamento
Licença-maternidade
PL-4489/2012, de Antônio Roberto (PV-MG)
» Garante à empregada, durante a gravidez, a redução da jornada de trabalho pela metade, a partir da 36ª semana de gestação, sem prejuízo do salário e demais direitos.
PL-4028/2008, de Rita Camata (PMDB-ES)
» Prorroga licença-maternidade mediante concessão de incentivo fiscal, para ampliar a licença-paternidade.
Férias
PL-569/1991, de Chico Vigilante (PT-DF)
» Assegura ao empregado o direito de escolher o período de férias.
PL-4113/2012, de Antonio Bulhões (PRB-SP)
» Concede direito aos pais ao período concessivo de férias coincidentes com o das férias coletivas da creche ou pré-escola de seus filhos.
Jornada de trabalho
PL-615/1991, de Aldir Cabral (PTB-RJ)
» Fixa o limite de oito horas diárias à jornada do menor de 18 anos, e seis horas para o menor aprendiz entre 12 e 14 anos.
L-8502/1986, de Paulo Xavier (PFL-PB)
» Fixa a jornada de trabalho em oito horas nos dias úteis e quatro horas nos sábados.
Demissão
PL-5364/1990, de Walmor de Luca (PMDB-SC)
» Estabelece critérios para a demissão por justa causa por embriaguez, exigindo o empregador oferecer tratamento especial.
PL-671/2003, de Rogério Silva (PPS-MT)
» Proíbe demissão arbitrária ou sem justa causa de empregado que tenha sofrido acidente do trabalho.
Salário
PL-522/1999, de Evandro Milhomen (PSB-AP)
» Institui que o adicional de insalubridade seja calculado sobre o salário contratual.
PL-3751/1989, de Francisco Amaral (PMDB-SP)
» Proíbe o contrato de experiência.
Aviso-prévio
PL-4522/2001, de Avenzoar Arruda (PT-PB)
» Aumenta para 60 (sessenta) e 90 (noventa) dias o prazo de aviso-prévio para a parte dispensada que tiver mais de cinco e 10 anos de serviço, respectivamente.
PL-1624/1996, de Chicão Brígido (PMDB-AC)
» Obriga as empresas de serviços públicos a comunicarem aos usuários a suspensão dos serviços com antecedência mínima de 10 dias.
"Quando o juiz quer estabelecer uma pena, olha o Código Penal e aplica; mas, para o trabalho, cada cabeça é uma sentença”
Sílvio Costa (PTB-PE)
"Esse número grande de projetos de lei nessa área existe devido à abertura que o Brasil dá, historicamente, às questões trabalhistas”
Flávia Morais (PDT-GO)
"Se temos um novo Código Civil de 5 anos já com várias novas propostas de revisão, imagine a CLT, que tem mais de 50”
Júlio Delgado (PSB-MG)
"A CLT é uma conquista histórica de direitos trabalhistas que precisam ser atualizados, mas que não podem retroceder”
Érica Kokay (PT-DF)