Brasília – Os Estados Unidos e os mercados financeiros globais respiraram aliviados ontem, primeiro dia útil de 2013, graças à aprovação, na noite de terça-feira, pela Câmara dos Representantes do acordo que evitou uma catástrofe econômica batizada de abismo fiscal. Após longas e tensas negociações, os deputados confirmaram o pacote legal aprovado pelo Senado na madrugada do dia 1º, que impediu aumentos automáticos de impostos e cortes de gastos que levariam a maior economia do planeta à recessão, com impacto negativo sobre os demais países. Não à toa, a notícia sobre o consenso para driblar um buraco de US$ 600 bilhões este ano levou otimismo às bolsas de todo o mundo, com pregões em alta de até 3%.
O acordo no Congresso foi uma clara vitória do presidente democrata Barack Obama, reeleito com a promessa de resolver problemas econômicos, em parte via aumento dos impostos sobre os norte-americanos mais ricos. A oposição republicana, que domina a Câmara, foi forçada a referendar uma proposta contrária a sua ideologia. O entendimento bipartidário resolve ainda, em caráter provisório, as incertezas sobre se os EUA podem superar profundas divergências políticas para impedir uma piora da situação econômica quando a reação à crise de 2008 e 2009, a maior em 80 anos, está só começando.
Resta ainda aos poderes Executivo e Legislativo equacionar a evolução do endividamento do país, que já passa de US$ 16 trilhões, acima do Produto Interno Bruto (PIB, a soma das riquezas produzidas). Logo após o resultado da votação na Câmara, Obama disse que o acordo representa “apenas um passo” em um contexto de um esforço mais amplo de melhora da economia. Ao classificar o déficit de demasiado alto, ele disse estar aberto a um compromisso para reduzi-lo de forma equilibrada no horizonte de até 10 anos.
PERDAS E GANHOS Para especialistas, o pior já passou, graças ao acerto celebrado na última hora pelo Congresso, mas continuarão difíceis as negociações para ajustar receitas e despesas federais nos próximos anos. Ambos os lados (republicanos e democratas) cederam um pouco. “Embora não tenha conseguido tudo o que desejava, Obama garantiu relativa tranquilidade para os seis primeiros meses de seu segundo mandato”, diz Gilberto Braga, professor do Ibmec-RJ. Para ele, o tamanho dos desafios fiscais a partir do segundo semestre vai depender da evolução do PIB. “O presidente ganhou uma batalha, mas não a guerra.”
Com 275 votos a favor e 167 contra, a Câmara pôs fim a duas semanas de confrontos e negociações em Washington, mas não resolveu outros confrontos políticos sobre o orçamento. Após a resposta pragmática e racional do Congresso, o restante dos desafios ainda causa desconfiança. Os cortes obrigatórios foram suspensos por apenas dois meses, para perto de um momento em que a Casa Branca terá que encarar um aumento do teto dos seus empréstimos. Assim, uma outra onda de ansiedade é esperada a partir de fevereiro.
O pouco de sossego conseguido não elimina o fato de que a economia global segue ameaçada de retração. “As dificuldades na Europa estão se agravando, a China se esforça para manter seu crescimento e os EUA ainda buscam formas de acelerar a economia”, avalia Ricardo Rocha, professor da Fundação Vanzolini (SP). Para não viver outros dias de angústia, Obama se adiantou ontem, ao pedir aos parlamentares um pouco “menos de drama” quando Congresso e governo forem negociar as próximas questões fiscais. O pacote aprovado vai aumentar os déficits orçamentários em quase US$ 4 trilhões nos próximos 10 anos.