(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas

Moradores de dois lugarejos em Minas lutam para driblar a alta no custo de vida

Sem Peixe é a cidade mineira com mais idosos na ativa (49,8%). Queluzito é a que tem menos (1,3%)


postado em 15/01/2013 06:00 / atualizado em 15/01/2013 07:36

Ilídio Raimundo de Melo, de 72 anos, e sua esposa, Ana Maria, cuidam da lavoura em Sem Peixe, na Zona da Mata. Milho colhido na propriedade serve de ração para o gado, cujo leite engorda a renda da família(foto: FOTOS: JAIR AMARAL/EM/D.A PRESS)
Ilídio Raimundo de Melo, de 72 anos, e sua esposa, Ana Maria, cuidam da lavoura em Sem Peixe, na Zona da Mata. Milho colhido na propriedade serve de ração para o gado, cujo leite engorda a renda da família (foto: FOTOS: JAIR AMARAL/EM/D.A PRESS)
Sem Peixe e Queluzito – O dia a dia de Ilídio Raimundo de Melos, de 72 anos, e o de Francisco da Silva, de 76, tem muito em comum. Ambos acordam com o canto do galo e, embora se queixem das dores nas costas que vieram com o avanço da idade, encontram força suficiente para roçar o milharal e ordenhar as vacas. Os grãos são usados na ração para o gado. Cada litro de leite é vendido a cooperativas por R$ 0,80. As semelhanças param por aqui. Ilídio, o seu Lidinho, mora na área rural de Sem Peixe, na Zona da Mata, a 200 quilômetros de Belo Horizonte. O município ocupa o topo de um ranking curioso entre as 853 cidades mineiras: tem a maior porcentagem da população com pelo menos 70 anos de idade que ainda trabalha (49,8%). No fim da lista está Queluzito, na Região Central, a 130 quilômetros da capital, onde reside Francisco, o Chiquinho, e apenas 1,3% dos moradores acima dos 70 segue na ativa, . Em Belo Horizonte, o percentual é de 12,9%.


A tabela foi elaborada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE). A pesquisa não revelou os motivos que levam parte da população com 70 anos ou mais a continuar na ativa, mas um indicador divulgado ontem pela Fundação Getulio Vargas (FGV) sugere que, para pagar as contas, quem continua trabalhando tem vantagem. O Índice de Preços ao Consumidor da Terceira Idade (IPC-3i), apelidado de inflação da terceira idade, leva em conta a variação da cesta de itens de consumo de famílias majoritariamente compostas por idosos e encerrou 2012 com alta de 5,82% em relação a 2011. O resultado superou a média da inflação para todas as faixas etárias (5,74%), segundo o Índice de Preços ao Consumidor Brasil (IPC-BR), também medido pela FGV.

“A maioria dos idosos trabalha para complementar a renda. O peso da saúde no orçamento aumenta muito com a idade. A pessoa compra, por exemplo, mais medicamentos. Também há a questão da alimenetação, que precisa ser mais saudável”, disse o economista André Braz, da FGV. O principal vilão da inflação da terceira idade, no confronto entre o quarto e o terceiro trimestres de 2012, foi o grupo de transportes, cujo percentual passou de - 0,25% para 1,03%. Na mesma toada, também dispararam os índices dos seguintes itens: vestuário (de -0,91% para 2,47%), educação, leitura e recreação (de 1,24% para 3,39%), habitação (de 1,21% para 1,49%), saúde e cuidados pessoais (de 1,10% para 1,36%) e despesas diversas (de 0,78% para 1,66%).

Para Braz, “o jovem de hoje, que será o idoso de amanhã, sabe da necessidade de contratar uma aposentadoria privada”. Tanto Lidinho, o morador de Sem Peixe, quanto Chiquinho, o de Queluzito, não contam com essa ajuda para turbinar o benefício do INSS. A eles, resta a labuta diária como única forma de complementar a aposentadoria de um salário mínimo. “Tiro cerca de 80 litros de leite por dia e não vou parar enquanto Deus me der força”, garante Lidinho. Chiquinho tem pensamento igual. Ele próprio leva a produção diária à cooperativa de Queluzito, em leiteiras carregadas pela mula Mulatinha. E brinca que o segredo da longevidade é “não parar de trabalhar e tomar, sempre que pode, uma talagada de aguardente”.

“Quem recebe um salário mínimo de aposentadoria não tem condição de manter uma vida digna. De um lado, há o achatamento dela. Do outro, o aumento da inflação para a terceira idade”, reclamou Moacir Meirelles, vice-presidente da Confederação Brasileira de Aposentados, Pensionistas e Idosos (Cobap).

É por isso que, aos 71 anos de idade, Juvercino Salvador Jardim, dono de uma mercearia em Sem Peixe, abre seu estabelecimento todos os dias. “Recebo apenas um salário mínimo de aposentadoria. Com o comércio, consigo tirar pouco mais de um salário. Para isso, porém, abro (a loja) de segunda a segunda, seja feriado ou não.”

Ovos de ouro

Dona Terezinha dos Santos, de 70 anos, também precisa se esforçar para aumentar o rendimento mensal de um salário mínimo garantido pela aposentadoria do INSS. Também moradora de Sem Peixe, ela cria galinhas para vender os ovos. “Peço R$ 3 pela dúzia”, disse a mulher, que leva a mercadoria em capangas e caixas carregadas por um cavalo. “Meu marido comprou o animal há 12 anos, poucos meses antes de morrer. Não pôde desfrutar do trabalho do bicho por muito tempo. Na minha roça, também consigo plantar bananas para vender. A penca sai a R$ 0,80. A gente não pode ficar parada, pois apenas o dinheiro da aposentadoria não dá para nada.”

A situação fica mais grave quanto o idoso é o arrimo financeiro da família. Na Grande BH, segundo pesquisa divulgada há poucos meses pela Fundação João Pinheiro (FJP) e pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), as pessoas com mais de 60 anos respondem, em média, por 66,4% do ganho total das famílias das quais fazem parte.

Em Queluzito, Região Central, Francisco da Silva, de 76 anos, transporta o leite que produz até a cooperativa todos os dias, com a ajuda da mula Mulatinha, e acredita que o trabalho é um dos segredos da longevidade
Em Queluzito, Região Central, Francisco da Silva, de 76 anos, transporta o leite que produz até a cooperativa todos os dias, com a ajuda da mula Mulatinha, e acredita que o trabalho é um dos segredos da longevidade
Experiência cobiçada

O economista Gabriel de Andrade Ivo, da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de Minas Gerais (Fecomércio Minas), avalia que os aposentados ajudam muitos setores a reduzirem o déficit de mão de obra qualificada. “Há duas vertentes: a experiência do idoso e a dificuldade dos empresários em encontrar jovens capacitados. Por isso, há várias empresas que enxergam na terceira idade uma grande oportunidade.”

A carência de profissionais para alguns setores, porém, não é a única causa que leva algumas empresas a buscar aposentados. O fato de idosos não pagarem passagens de ônibus e não enfrentarem filas em bancos ou terem atendimento preferencial em repartições públicas é uma vantagem que os deixam em situação privilegiada na briga por alguns cargos.

Em Sem Peixe, Ricardina Schitine Gomes, que vai completar 70 anos em fevereiro, encontrou o caminho da produtividade e do sucesso na terceira idade empreendendo. Cozinheira de mão cheia, ela abriu um restaurante na cidade, onde o movimento cresceu bastante nos últimos meses, devido às obras de um mineroduto na região. “Comecei a trabalhar aos 5 anos de idade, ajudando mamãe a fazer doces, queijos e outras guloseimas. Depois, ganhei a vida como professora. Agora, divido o tempo entre o restaurante e uma pousada”, conta.


receba nossa newsletter

Comece o dia com as notícias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)