Todos os equídeos abatidos no Brasil para consumo humano são de descarte, ou seja, só vão para os matadouros no fim da vida, depois de passarem anos puxando carroças, guiando gado ou ajudando os donos em outras atividades. A lista inclui também os animais que precisam ser sacrificados por causa de patas quebradas. Ao contrário do que ocorre em outros países, como na Hungria, não há registros de pecuaristas nacionais que criam cavalos, mulas, burros, jumentos ou jegues exclusivamente para consumo humano.
A cultura brasileira de não consumir esse tipo de carne é o principal motivo de os pecuaristas não apostarem na criação de cavalos para o abate, mas também há uma forte explicação econômica: o custo da produção é considerado alto em relação a outros rebanhos com mercado lucrativo, como o de bovinos, o de suínos e o de ovinos. Bois, porcos e ovelhas crescem e engordam num período bem menor do que cavalos, mulas e jumentos. Os criadores levam em conta a chamada taxa de conversão, que significa o quanto do que o animal se alimenta é transformado em carne para consumo.
Daí a necessidade de os frigoríficos brasileiros recorrerem aos equídeos de descarte. O Frigorífico Prosperidad, quando estava de portas abertas, comprava animais em fazendas do Triângulo Mineiro e de tropeiros que percorriam a região vindos, principalmente, de Goiás e da Bahia. Em razão da ausência de criadores, os frigoríficos não têm tanta facilidades em conseguir equídeos para abate.
“O Brasil não tem o hábito de consumir carne de cavalo. Portanto, aqui, não criamos esses animais para o matadouro. O que vai para o frigorífico é o refugo do refugo”, reforça Affonso Damázio, presidente da Comissão Técnica de Pecuária de Corte da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg).
Ninharia
Damázio, que é produtor em Ponte Nova, na Zona da Mata mineira, se recorda de que há alguns anos um rapaz apareceu na região interessado em comprar cavalos para um abatedouro. “Ele ofereceu R$ 200 por cabeça velha e saiu daqui com uma boa carga.” Fazendeiros alegam que os frigoríficos pagam uma ninharia pelos animais. Uma das explicações, principalmente quando o cavalo é adquirido em propriedades distantes dos abatedouros, é o custo do frete.
A idade dos cavalos abatidos, já no fim da vida, com mais de 25 anos, não garante à carne um sabor à altura dos animais criados em outros países, segundo especialistas. “Em geral, a carne do cavalo de descarte não é de tão boa qualidade. Estive uma vez na Itália, onde se consome carne de equídeo, e o rapaz de um açougue me disse que comprava cortes da Hungria porque lá o animal abatido é mais novo que no Brasil”, recorda o professor Pedro Veiga, do Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Viçosa (UFV) e pós-doutor em ciência da carne pela universidade americana de Iowa.