De acordo com o presidente da Associação Brasileira de Telesserviços, Jarbas Nogueira, o setor – terceiro maior do mundo, que no Brasil tem 300 empresas e emprega 1,3 milhão de pessoas – vem cumprindo todas as normas do decreto, que, para ele, auxiliam no fortalecimento do serviço. Mas entre os gargalos, Nogueira destaca a retenção de pessoas. “Como a maioria dos profissionais é jovem com forte carga de treinamento, passam a surgir diversas oportunidades para eles”, diz. Ainda de acordo com o presidente da ABT, outra justificativa para o número de reclamações em elevação pode ser o crescimento do número de consumidores. “O aquecimento da economia brasileira refletiu em mais pessoas utilizando as centrais de atendimento para solicitar informações de uso ou registrar algum comentário sobre os produtos e serviços adquiridos.”
O empresário Felipe Rodrigues Bezerra sentiu os efeitos do mau atendimento via telefone em seu negócio, depois de pedir a portabilidade de linhas telefônicas e permanecer um mês sem telefone. “As minhas vendas são feitas por telefone e ficaram comprometidas. Foram quatro semanas de conversas com atendentes que não resolvem”, lembra. Outra crítica do consumidor é o despreparo desses funcionários, que além de não terem acesso aos protocolos antigos não conseguem dar prosseguimento a casos abertos anteriormente no próprio SAC. “Não existe continuidade no atendimento. É um teste de paciência ter que relatar o mesmo problema várias vezes para pessoas diferentes”, afirma.
Com a estudante Cynthia Fernanda da Silva, que tem hábito de comprar pela internet, o transtorno não foi diferente. “Sempre encontro dificuldades para receber os produtos, e depois da compra feita, conseguir contato com o call center das lojas fica ainda pior”, reclama. Segundo ela, por duas vezes foi necessário recorrer ao Procon para receber os produtos que havia adquirido. “Comprei presentes de Natal que chegaram em março e presente para o Dia dos Namorados que chegou em agosto”, lembra. Para ela, o principal problema enfrentado no atendimento telefônico é a falta de paciência e de interesse dos atendentes para passar informações. “Dependemos do humor deles. Se tiverem em um dia ruim, ou nós estivermos nervosos, podemos esquecer. O problema nunca será resolvido”, afirma.
É BOM RECLAMAR Embora as reclamações sejam recorrentes entre os consumidores, nem todas são formalizadas nos órgãos de proteção ao consumidor, segundo o coordenador do Procon Assembleia, Marcelo Barbosa. No entanto, ele garante que uma mudança de postura poderia resultar em punição para as empresas que descumprem o decreto. “Ele é feito para ser cumprido e não vem sendo. A operadora, seja ela de telefonia, aviação, luz, ou água, é responsável pela manutenção do seu call center e deve fazer com que ele funcione bem”, diz. “O canal é importante e vem para facilitar as demandas dos consumidores, esclarecer dúvidas, passar informações, fazer cancelamentos, direitos que já existem no contrato”, acrescenta.
Caso isso não aconteça, o consumidor deve anotar os protocolos, marcar o dia, hora do atendimento e todos os detalhes possíveis e encaminhar a reclamação ao Ministério Público do Estado de Minas Gerais e para o Procon. “Só assim chega às agências reguladoras e pode haver punição.” Outra dica para o consumidor, segundo Barbosa, é conhecer o decreto e o que ele determina para saber se está sendo lesado ou não.
Para Alexandre Dias, diretor-executivo da Talktelecom, empresa de soluções para call center, o crescimento das reclamações pode ser justificado pelo crescimento da demanda. Entre as lacunas a serem preenchidas, ele destaca um maior investimento em tecnologia. “Existem ferramentas que permitem que o retorno de uma ligação vá para o mesmo operador, o que garante agilidade no atendimento e gera menos irritação ao consumidor, entre outras”, exemplifica. Outro ponto a ser melhorado, segundo Dias, é o treinamento de pessoal. “O foco para a melhoria no atendimento deve incluir alternativas melhores e mais rápidas, por meio das quais os dois lados saem ganhando”, considera.
Tempo passa a ser valorizado em ações
A máxima “tempo é dinheiro” vem ganhado força nos tribunais de todo o país, que começam a conceder indenizações a consumidores que ficam à espera de prestação de serviços das empresas que não são cumpridos. Geralmente as indenizações ocorrem contra operadoras de internet, telefone e TV por assinatura, e os call centers, que demoram a responder as demandas dos consumidores, também se enquadram nisso. A indenização pela perda de tempo ainda é nova no Brasil. No ano passado, a Justiça do Rio Grande do Sul aumentou a indenização por danos morais a um consumidor por uma grande empresa de eletroeletrônicos. Em Sergipe houve uma sentença idêntica e em Minas não há relatos de decisões proferidas.
No entanto, alguns processos seguem em curso e o advogado especialista em direito do consumidor Carlos Theófilo Lamounier explica que a indenização ocorre quando o fornecedor impõe perdas e ônus ao consumidor ao fazer com que ele perca seu tempo livre, que poderia ser gasto com lazer, trabalho ou outra atividade. “O direito passou a dar valor jurídico a casos em que há desvio produtivo do consumidor. Se a demora chegar a afetar essas ações, ele poderá buscar o J udiciário para rever isso”, diz.
O advogado Frederico Damato, que também é especialista em direito do consumidor, esclarece que muitas pessoas não sabem que o descaso das operadoras gera indenização por danos morais. “Há alguns anos, a perda de tempo do consumidor era considerado um mero contratempo. Hoje ele tem todo o direito de reclamar, uma vez que a situação pode ser reconhecida como uma contrariedade que pode ser elevada ao grau de dano moral”, ressalta.