O Brasil e o bloco econômico formado ao lado de Rússia, Índia, China e África do Sul, o Brics, perderão espaço com a possível formalização de um acordo de livre-comércio entre Estados Unidos e Europa. "As exportações brasileiras seriam prejudicadas. Os Brics estão isolados nesse cenário. Será um acordo ruim para os emergentes", avaliou o cientista político Heni Ozi Cukier, fundador da Insight Geopolítico, consultoria de risco político internacional, durante evento em São Paulo realizado pela Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (Fecomercio-SP).
Estados Unidos e União Europeia estão desde o ano passado debatendo um modelo de livre-comércio que concentraria cerca de 40% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial. "É um nível planetário. Esse acordo terá um impacto sistêmico e consequências para todo o comércio mundial", afirmou o cônsul econômico da Embaixada da França no Brasil, Stéphane Mousset, presente no evento, reforçando que seu país apoia a criação do acordo.
A consulesa-geral adjunta dos Estados Unidos, Samantha Carl-Yoder, disse que o governo Barack Obama está comprometido com a criação do acordo, que é "ambicioso" e traria muitos benefícios, como a geração de 13 milhões de empregos. "O acordo de livre-comércio com a Europa é o nosso foco, mas isso não significa que estamos desviando a atenção da importância comercial do Brasil", ponderou. "Não queremos estar algemados (à Europa)."
Segundo Samantha, a expectativa é concluir as negociações até o fim de 2014. Na opinião da conselheira comercial da Embaixada da Hungria, Suzanna Lásló, no entanto, as definições do acordo de livre-comércio não serão tão fáceis. "Nós (Europa) e Estados Unidos ainda estamos em lua de mel, ninguém viu as reais dificuldades, ninguém conheceu o ego um do outro", alertou.
Para Suzanna, porém, alguma definição deve ocorrer até o fim do mandato do presidente Obama. Ela destaca que a "esperança" é que esse acordo bilateral agrade também outros países e resulte na ampliação dos parceiros da União Europeia.
O cônsul-geral do México, Jose Gerardo Traslosheros Hernández, disse esperar que um futuro acordo bilateral entre EUA e UE não acabe com as parcerias multilaterais. "Os países vão procurar novos estímulos para o crescimento. Os acordos regionais não são o fim dos multilaterais. Tomara que seja para ajudar a concluir a Rodada Doha", afirmou.
O cientista político Heni Ozi Cukier, no entanto, acredita que a aliança entre EUA e Europa é um resultado justamente do fracasso da Rodada Doha, após 12 anos de negociação. "Ninguém consegue chegar a consenso", afirmou. "Então, acredito que a saída é ir em busca dos acordos bilaterais."
Para Cukier, um acordo dessa magnitude faria com que os EUA retomassem a agenda comercial global e daria maior legitimidade à União Europeia. "Inglaterra e Holanda, que olham de forma cética para o bloco, provavelmente mudariam sua postura", diz. Ele enfatiza ainda que o acordo forçaria o Brasil a focar seus esforços "onde as coisas estão acontecendo". "O País fica priorizando comércio com vizinhos enquanto precisa pensar em seus interesses", afirmou, ressaltando que em sua opinião "o Mercosul é um barco furado".
Antônio Lanzana, coordenador do Comitê de Assuntos Econômicos da FecomercioSP, também reforçou que o Brasil não pode ficar de fora deste movimento e precisa "entrar na onda liberalizante do comércio" mundial.