Em tempos de maior comprometimento da renda familiar, o consumidor tem que estar ainda mais atento aos seus direitos, principalmente se estiver endividado. Dever não é nenhum crime, e os credores precisam respeitar as regras legais para cobrar os devedores. Se tais direitos forem desrespeitados, permitem a reivindicação de indenizações de ordem material, pelo prejuízo causado, e também de ordem moral, pelo constrangimento público que representam.
A inadimplência do consumidor fechou abril em 7,5%, segundo os últimos dados do Banco Central (BC), que deve divulgar o índice de maio na próxima semana. É uma taxa considerada alta, na avaliação do analista da Confederação Nacional do Comércio (CNC) Fábio Bentes. “O nível confortável é 7%, considerando como teto um índice de 7,3%. Qualquer coisa acima disso é preocupante”, avalia.
Diante desse quadro de alta inadimplência e comprometimento de mais de 20% da renda familiar com dívidas, o presidente do Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa das Relações de Consumo (Ibedec), José Geraldo Tardin, alerta que a maioria das pessoas desconhece os seus direitos, assim como muitas empresas desrespeitam as regras de cobrança, exageram nas multas e juros e fazem cortes no abastecimento de serviços sem cumprir prazos legais.
O corte de energia, por exemplo, precisa ser feito presencialmente por funcionário da concessionária. “Já houve caso em que a suspensão do serviço foi feita na residência de uma pessoa doente, ligada a aparelhos, que veio a falecer. Por isso a necessidade de uma visita ao local”, conta Tardin. Os consumidores inadimplentes com as empresas fornecedoras de água foram beneficiados com uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que determinou que contas antigas não são motivo suficiente para o corte, desde que as faturas posteriores estejam em dia. “Nesse caso, a concessionária tem que cobrar judicialmente o débito antigo, sem interromper o abastecimento”, explica Tardin.
Os casos mais emblemáticos de erros na condução de cobranças registrados pelo Ibedec são relativos a instituições financeiras. Mais da metade são sobre cheque especial e cartão de crédito. Principalmente, os cartões de crédito de supermercados e lojas, que não respeitam o teto de juros e acabam aplicando taxas absurdas. Algumas chegam a cobrar juros de mais de 500%”, revela Tardin. A servidora pública Regina Célia Fonteles Araújo, 45 anos, recorreu ao Ibedec quando notou que as contas do cartão passaram a vir mais caras.
“Os valores estavam aumentando de forma abusiva. Eram juros sobre juros”, diz, afirmando que a taxa chegou a ficar em 549% ao ano. Regina usou os serviços do cartão Hipercard de 2002 a 2011. No ano passado, entrou na Justiça e ganhou a causa, ao apresentar faturas do período de cinco anos. “Verificaram que as taxas estavam muito além do normal”, conta Regina Célia, que conseguiu quitar os cerca de R$ 4 mil de débito, e ainda será restituída em R$ 11 mil cobrados indevidamente.
INDEVIDA Apesar da vitória judicial, a servidora agora lida com um novo obstáculo: há seis meses ela paga por dois computadores, quando, na verdade, só comprou um. “Ficou negociado que parcelaria a compra em 10 vezes sem juros. Na fatura, aparece a aquisição de duas máquinas, uma no valor de R$ 225 e outra de R$ 248”, conta ela, que se diz revoltada com a situação. “Acabo pagando, porque se não meu nome pode ficar sujo”, reclama. A inclusão do nome dos consumidores em cadastros restritivos de crédito, como SPC, Serasa e Cadin, também tem regras, como a obrigatoriedade de notificar previamente o cliente, por escrito e com comprovação de entrega, pelo menos 10 dias antes da inserção (veja quadro).
O presidente do Instituto de Defesa do Consumidor Bancário (IBDconB), Luciano Duarte Peres, diz que o volume de clientes de bancos que reclama não chega a 1% do total. No entanto, mais de 60% dos que levam adiante uma reclamação logram êxito. “As instituições apostam nisso e continuam quebrando regras”, salienta.
No site www.bcb.gov.br existem ferramentas que permitem a comparação dos juros do mercado. “O consumidor precisa saber que dinheiro é um produto como outro qualquer que está à venda. É preciso procurar o que custa mais barato”, resume Peres.
A coordenadora institucional da associação de consumidores Proteste, Maria Inês Dolci, revela que 45% das famílias brasileiras têm, pelo menos, três dívidas ativas. “As classes C e D, que estão entrando no mercado, desconhecem os seus direitos, querem pagar o que devem, mas muitas vezes acabam pegando novos empréstimos para pagar os antigos, e isso vira uma bola de neve”, alerta. Crédito consignado e financiamentos em bancos são os principais reclamações na Proteste.
Maria Inês destaca que as instituições criam entraves e dificuldades para fazer a portabilidade da dívida, que é um direito assegurado ao inadimplente. “Ainda temos que lutar por mais transparência no setor bancário. Só o ramo de telefonia consegue ser mais questionado do que as instituições financeiras”, diz a coordenadora da Proteste.
Justamente uma operadora de telefonia prejudicou as finanças da empresa de Leonardo Lourenço, 47 anos, que hoje luta para limpar o nome. Conforme ele, após retornar de viagem para os Estados Unidos em março do ano passado, se deparou com uma conta de R$ 8 mil por serviços não utilizados devido a uma falha no sistema da empresa Claro. “Meu nome foi parar no Serasa e não pude pegar um crédito no banco para investimento nos meus negócios. Tentei pegar R$ 20 mil, mas tive o pedido reprovado”, lembra. Ele conta que, agora, espera que a justiça seja feita. “Mas fico muito indignado, porque o meu nome está em jogo”, lamenta o empresário. (SK)
A inadimplência do consumidor fechou abril em 7,5%, segundo os últimos dados do Banco Central (BC), que deve divulgar o índice de maio na próxima semana. É uma taxa considerada alta, na avaliação do analista da Confederação Nacional do Comércio (CNC) Fábio Bentes. “O nível confortável é 7%, considerando como teto um índice de 7,3%. Qualquer coisa acima disso é preocupante”, avalia.
Diante desse quadro de alta inadimplência e comprometimento de mais de 20% da renda familiar com dívidas, o presidente do Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa das Relações de Consumo (Ibedec), José Geraldo Tardin, alerta que a maioria das pessoas desconhece os seus direitos, assim como muitas empresas desrespeitam as regras de cobrança, exageram nas multas e juros e fazem cortes no abastecimento de serviços sem cumprir prazos legais.
O corte de energia, por exemplo, precisa ser feito presencialmente por funcionário da concessionária. “Já houve caso em que a suspensão do serviço foi feita na residência de uma pessoa doente, ligada a aparelhos, que veio a falecer. Por isso a necessidade de uma visita ao local”, conta Tardin. Os consumidores inadimplentes com as empresas fornecedoras de água foram beneficiados com uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que determinou que contas antigas não são motivo suficiente para o corte, desde que as faturas posteriores estejam em dia. “Nesse caso, a concessionária tem que cobrar judicialmente o débito antigo, sem interromper o abastecimento”, explica Tardin.
Os casos mais emblemáticos de erros na condução de cobranças registrados pelo Ibedec são relativos a instituições financeiras. Mais da metade são sobre cheque especial e cartão de crédito. Principalmente, os cartões de crédito de supermercados e lojas, que não respeitam o teto de juros e acabam aplicando taxas absurdas. Algumas chegam a cobrar juros de mais de 500%”, revela Tardin. A servidora pública Regina Célia Fonteles Araújo, 45 anos, recorreu ao Ibedec quando notou que as contas do cartão passaram a vir mais caras.
“Os valores estavam aumentando de forma abusiva. Eram juros sobre juros”, diz, afirmando que a taxa chegou a ficar em 549% ao ano. Regina usou os serviços do cartão Hipercard de 2002 a 2011. No ano passado, entrou na Justiça e ganhou a causa, ao apresentar faturas do período de cinco anos. “Verificaram que as taxas estavam muito além do normal”, conta Regina Célia, que conseguiu quitar os cerca de R$ 4 mil de débito, e ainda será restituída em R$ 11 mil cobrados indevidamente.
INDEVIDA Apesar da vitória judicial, a servidora agora lida com um novo obstáculo: há seis meses ela paga por dois computadores, quando, na verdade, só comprou um. “Ficou negociado que parcelaria a compra em 10 vezes sem juros. Na fatura, aparece a aquisição de duas máquinas, uma no valor de R$ 225 e outra de R$ 248”, conta ela, que se diz revoltada com a situação. “Acabo pagando, porque se não meu nome pode ficar sujo”, reclama. A inclusão do nome dos consumidores em cadastros restritivos de crédito, como SPC, Serasa e Cadin, também tem regras, como a obrigatoriedade de notificar previamente o cliente, por escrito e com comprovação de entrega, pelo menos 10 dias antes da inserção (veja quadro).
O presidente do Instituto de Defesa do Consumidor Bancário (IBDconB), Luciano Duarte Peres, diz que o volume de clientes de bancos que reclama não chega a 1% do total. No entanto, mais de 60% dos que levam adiante uma reclamação logram êxito. “As instituições apostam nisso e continuam quebrando regras”, salienta.
No site www.bcb.gov.br existem ferramentas que permitem a comparação dos juros do mercado. “O consumidor precisa saber que dinheiro é um produto como outro qualquer que está à venda. É preciso procurar o que custa mais barato”, resume Peres.
A coordenadora institucional da associação de consumidores Proteste, Maria Inês Dolci, revela que 45% das famílias brasileiras têm, pelo menos, três dívidas ativas. “As classes C e D, que estão entrando no mercado, desconhecem os seus direitos, querem pagar o que devem, mas muitas vezes acabam pegando novos empréstimos para pagar os antigos, e isso vira uma bola de neve”, alerta. Crédito consignado e financiamentos em bancos são os principais reclamações na Proteste.
Maria Inês destaca que as instituições criam entraves e dificuldades para fazer a portabilidade da dívida, que é um direito assegurado ao inadimplente. “Ainda temos que lutar por mais transparência no setor bancário. Só o ramo de telefonia consegue ser mais questionado do que as instituições financeiras”, diz a coordenadora da Proteste.
Justamente uma operadora de telefonia prejudicou as finanças da empresa de Leonardo Lourenço, 47 anos, que hoje luta para limpar o nome. Conforme ele, após retornar de viagem para os Estados Unidos em março do ano passado, se deparou com uma conta de R$ 8 mil por serviços não utilizados devido a uma falha no sistema da empresa Claro. “Meu nome foi parar no Serasa e não pude pegar um crédito no banco para investimento nos meus negócios. Tentei pegar R$ 20 mil, mas tive o pedido reprovado”, lembra. Ele conta que, agora, espera que a justiça seja feita. “Mas fico muito indignado, porque o meu nome está em jogo”, lamenta o empresário. (SK)