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Estado de Minas

Denúncia de fraude na distribuição de royalties expõe controle da ANP

Falhas apontadas por funcionário afastado podem ter favorecido estados e municípios na partilha dos royalties. TCU apura o caso


postado em 29/07/2013 06:00 / atualizado em 29/07/2013 07:29

Denise Rothenburg e Sílvio Ribas

A produção de petróleo no país é monitorada mediante relatórios fornecidos pelas próprias produtoras e os valores recolhidos delas e distribuídos à União, estados e municípios — os royalties — são calculados com base em planilhas eletrônicas sujeitas a manipulações. Desde a década passada, agentes públicos de controle e especialistas alertam a Agência Nacional de Petróleo (ANP), responsável pela apuração dos dados, acerca da fragilidade do sistema que emprega apenas tabelas Excel, mas nada mudou até agora.

Nas últimas semanas, contudo, a denúncia feita por um funcionário da própria ANP no Rio de Janeiro levantou suspeitas de que o modelo arcaico de fiscalização pode ter favorecido prefeituras no repasse dos royalties, tributos pagos mensalmente ao governo pelas empresas como compensação por danos ambientais.

O denunciante teria procurado a diretoria da ANP para apontar a desproteção das planilhas, mas acabou sendo transferido para outra função dentro do órgão, sob o argumento de "razões administrativas". Por meio de sua assessoria de imprensa, a agência reguladora garante que a punição não decorreu de perseguição ao funcionário que expôs as fragilidades e os riscos dos sistemas de controle da produção de petróleo, mas à iniciativa de ele se intrometer em um departamento alheio à responsabilidade dele.

A gravidade das denúncias levou o Tribunal de Contas da União (TCU) a dar início, no mês passado, a uma auditoria especial para apurar os desvios do cálculo e do pagamento das participações governamentais pela ANP. O ministro José Jorge, relator do processo, informou ao Estado de Minas que aguarda os primeiros resultados da investigação para fazer comentários no momento oportuno. O TCU também espera pela definição das novas regras de distribuição dos royalties do pré-sal, em tramitação no Congresso, para planejar novas fiscalizações sobre o tema. O tribunal vai analisar ainda compensações financeiras a estados e municípios apresentados nas contas de governo.

Evidências

Antes dos pareceres do TCU, o deputado federal Arnaldo Jardim (PPS-SP) promete tornar públicos os dados consolidados que confirmem os indícios de irregularidades. Ele requisitou, no começo do mês passado, informações ao Ministério de Minas e Energia (MME) sobre os procedimento da ANP para calcular a divisão dos recursos vindos do petróleo entre municípios. A pasta teria 30 dias para responder as indagações do parlamentar, a contar do recebimento. Até agora não se manifestou.

Mesmo que o governo não apresente os esclarecimentos, Jardim planeja expor, na Comissão de Minas e Energia da Câmara, da qual é membro, levantamentos feitos a partir de documentos e das revelações feitas pelo servidor que apontou brechas no programa de cálculo dos royalties, e cuja identidade está sendo preservada.

"Em agosto, logo após a retomada dos trabalhos legislativos, quero convocar audiência sobre o tema, já aprovada na comissão", diz Jardim. Até lá, ele espera concluir um levantamento "para não ficar só na contestação" do MME e da ANP. "Há fortes evidências de que as planilhas Excel são um sistema frágil e passível de manipulações, além de a configuração complexa ser uma caixa-preta", adianta.

 

Fiscalização ineficaz

O geólogo Hernani Chaves, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), não considera as ferramentas digitais usadas para obter os valores dos royalties como principal fator de risco de malfeitos. "No limite, qualquer sistema pode ser manipulado. Não importa, então, se é o programa é arcaico ou moderno, mas se a sua fórmula matemática está sendo rigorosamente aplicada e gerando os resultados esperados", explica.

Para o especialista em campos exploratórios de petróleo, a única questão a ser levada em consideração pelas auditorias deveria ser a capacidade fiscalizadora da ANP. No entender dele, o rigor é necessário tanto para garantir a aplicação das metodologias de determinação dos tributos, expressas em lei, quanto para coibir abusos das empresas. Chaves lamenta o fato de o número de fiscais da agência ser insuficiente para avaliar desde postos de gasolina a plataformas do pré-sal, a 300 quilômetros da costa. A produção de petróleo é dada por medidores que podem ser vistoriados a qualquer momento pela agência, mas essa conferência ocorre geralmente quando há variações inesperadas.

Como proposta de solução para as falhas indicadas nas denúncias, o deputado Arnaldo Jardim sugere mudanças na base informatizada do sistema de fiscalização de produção (SFP) da ANP, de modo a deixar seus relatórios mais objetivos e mais fáceis de ser compreendidos, além de abrir canais de acompanhamento on-line pelas prefeituras.

Outro lado

A assessoria da ANP informou que sua diretoria se pronuncia apenas em relação a pareceres conclusivos (acórdãos) do TCU, uma etapa posterior a seus relatórios de auditoria e à apreciação do texto do ministro relator pelo plenário. A agência ressalta que, até agora, o tribunal negou a existência de indícios de falhas na medição da produção de petróleo e de gás natural "e tampouco há referência a qualquer perda de receita". Mas reconhece que foram feitas recomendações de aperfeiçoamento das normas e dos procedimentos adotados.

Quando as primeiras acusações chegaram ao TCU, em 2009, a ANP garantiu ser impossível desviar recursos dos pagamentos dos royalties, defendendo a segurança do sistema e o controle do acesso, o que impediria adulterações e desvios. (DR e SR)

 

 


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