Pedro Rocha Franco
E a "convocação" extra-campo se justifica: somente este ano, incluindo Campeonato Brasileiro e Libertadores, os valores arrecadados já superaram R$ 30 milhões, somado o recorde da renda de R$ 14 milhões da final entre Atlético e Olimpia. A principal receita em um estádio está vinculada à venda de ingresso, mas não para por aí. Em um jogo de Mineirão lotado, como a final da Libertadores, o faturamento nos bares supera os R$ 300 mil.
Engana-se quem pensa que o esporte preferido dos brasileiros começa com o apito do juiz. O "jogo" começa com dias de antecedência. A partir da definição do adversário, clubes e organizadores se comunicam para definir quantas pessoas serão chamadas para dar suporte à partida. A convocação é feita com base na estimativa de público. No Mineirão, em dias de arquibancada lotada (62 mil pessoas), o pessoal alocado para trabalhar no estádio é significativamente maior que em dias de jogos do América no Independência, por exemplo, que recebem entre 1 mil e 3 mil pessoas.
Para isso, um batalhão é designado para preparar entre duas e três toneladas de feijão-tropeiro e 300 vagas são preenchidas para atendimento nos bares. Tradicional, o tropeiro é o preferido entre os torcedores, consumido por um em cada cinco que vão ao estádio. Tanto é que o Independência, que inicialmente não oferecia a iguaria, também se viu obrigado a incluí-lo no cardápio. O açougueiro Jonatas Dias Silva abre mão até de tomar a tradicional cerveja gelada para gastar os R$ 10 com o tropeiro. “Tenho que ficar só no tropeiro e no refrigerante”, diz o atleticano, que ganha um salário mínimo e meio e, para ver o time do coração, gasta quase 10% do rendimento mensal.
Os postos de trabalho abertos, no entanto, não se resumem aos bares. Segundo a Minas Arena, são vários tipos de profissionais atuando. A equipe de operação é formada por profissionais da área de limpeza, alimentação, hospitalidade, bilheterias e acesso. Uma equipe de cinegrafistas se dedica a produzir imagens para transmissão ao vivo; do controle de operações, técnicos de áudio e vídeo nos intervalos interagem com a torcida pelo telão; comunicadores prestam assessoria para jornalistas e interessados, produzindo reportagens e atualizando sites e redes sociais, e profissionais do setor financeiro acompanham o movimento da bilheteria para fechar o borderô.
PÚBLICOS DIFERENTES
No Independência, a empresa contratada pela BWA para operar os bares e cuidar do serviço de alimentação no interior do estádio tem dois modelos de preparação para dias de jogo. Nas partidas do Atlético, que desde a reinauguração perdeu somente uma partida na arena e, com isso, tem constantemente atraído muitos torcedores, 22 dos 32 bares ficam abertos. O formato segue o padrão Fifa, no qual é recomendadoa um ponto de alimentação para cada 1 mil torcedores. São 110 funcionários – somando os 60 ambulantes, responsáveis por vender água, salgadinhos e outros produtos industrializados arquibancada afora. Em jogos com mais de 15 mil torcedores são comercializadas, em média, 10 mil unidades de bebida, incluindo refrigerantes, água, suco e cerveja sem álcool.
Por outro lado, nas partidas do América, a meta é manter o faturamento equilibrado. Para isso, o coordenador-geral da Super Eventos, Aloísio Anunciação Júnior, explica que o número de empregados escalados é menor e até mesmo ele se desloca para o atendimento nos bares. “Em 90% dos jogos do América a gente só consegue empatar. Por isso, é preciso fazer essa rearranjo”, explica.
Tropeiro à tarde, banheiro à noite
Além do adversário, da competição e da posição do time na tabela, o horário e o dia dos jogos são fundamentais para saber a frequência nos bares, dentro e fora do estádio. Tanto no Mineirão quanto no Independência, as partidas das 18h30 ou das 19h30 disputadas durante a semana são aquelas com maior volume de vendas de tropeiro. “Parece que as pessoas vão jantar no Mineirão quando o jogo é nesse horário”, explica a Minas Arena, concessionária responsável pela operação do Gigante da Pampulha. Enquanto isso, nos jogos das 21h50 os torcedores preferem fazer o aquecimento fora do estádio. Em vez dos bares, os banheiros são os mais procurados.
A necessidade do torcedor de ir ao banheiro depois da cerveja fez o dono do Bar Tiaê (ao lado do Independência), Ronaldo Motta, inovar. Para que os clientes não precisassem parar de beber para entrar no estádio. A promoção dá direito ao torcedor de usar o banheiro na compra de três cervejas por R$ 10. “Cheguei a vender 100 caixas de cerveja nos jogos do Galo pela Libertadores.”
Prova da relevância do horário é que o faturamento da concessionária com bares foi idêntico nos jogos do Galo contra o Atlético-PR, às 19h30 (Brasileirão), e contra o Newell's Old Boys (semifinal da Libertadores), às 21h50, apesar de a segunda partida ter tido 5 mil torcedores a mais que a primeira.
O maior consumo do tropeiro nas arquibancadas, no entanto, resulta em mais sujeira, quando se compara com salgados, pipoca e sanduíches. Com isso, o efetivo necessário para limpar as arquibancadas depois do jogo é maior, assim como o tempo gasto para realizar o serviço. (PRF)