Brasília – A escalada do dólar frente ao real encontrou um novo patamar de alta ontem, após declarações do ministro da Fazenda, Guido Mantega, terem incendiado o mercado ao sugerir que o atual patamar de cotação da moeda, acima dos R$ 2,35, seria “o novo câmbio” do país. A fala do ministro teve repercussão imediata entre investidores. Momentos antes de Mantega começar a discursar, por volta do meio-dia e meia, durante um evento com empresários em São Paulo, a divisa norte-americana era cotada a R$ 2,37 para venda. Depois, chegou a romper a casa dos R$ 2,40, mas perdeu força ao longo do pregão e encerrou o dia negociada a R$ 2,392, com alta de 2,09%. Foi a maior cotação diária desde 3 de março de 2009 e a maior variação registrada desde 23 de novembro de 2011.
“Este câmbio não é definitivo. Pode subir mais um pouquinho, cair mais um pouquinho, ficar onde está, não sei dizer, mas o governo age no sentido de impedir que haja uma excessiva volatilidade”, disse o ministro. As declarações de Mantega também sepultaram as ações realizadas pelo Banco Central (BC) justamente para conter a disparada da moeda norte-americana. A instituição fez ontem pela manhã e no início da tarde dois leilões de compra de dólares no mercado futuro, uma operação que tem como objetivo trazer a cotação da divisa para baixo. Durante a primeira operação, realizada por volta das 9h30, houve relativo sucesso, e o dólar começou a ceder. Já no segundo leilão, que teve início, coincidentemente, às 12:17, apenas instantes antes do ministro começar a discursar em São Paulo, o efeito não foi o mesmo.
Para o economista-chefe da Gradual Investimentos, André Perfeito, o desencontro de equipes do governo “sinaliza a falta de coordenação entre a Fazenda e o BC”, disse. “Ao ministro admitir um novo patamar para o câmbio”, ponderou Perfeito, “a moeda disparou e jogou por terra todos os esforços do BC para conter a alta do dólar”, criticou. “Foi um gesto, no mínimo, deselegante do ministro com o Banco Central”, apontou.
Para a Fazenda, houve interpretação errada por parte do mercado, que não entendeu as declarações do ministro. Em nenhum momento, reafirmou a Pasta, Mantega apontou que o atual patamar do dólar, acima dos R$ 2,35, seria o piso para a cotação da moeda. “O câmbio é flutuante”, garantiu ao Estado de Minas um importante interlocutor do ministro. A avaliação do ministro, ele reforçou, é que a atual volatilidade da divisa se deve à sinalização de que o Federal Reserve (Fed, o BC norte-americano) poderá reduzir, já em setembro, o programa de compras de títulos públicos.
Só esse programa é responsável, hoje, por uma injeção mensal de US$ 85 bilhões na maior economia do mundo. Portanto, ele disse, a reversão desses estímulos poderia provocar uma nova onda de pessimismo mundo, o que eleva a cotação do dólar. O que o ministro quis dizer, apontou a fonte, é que o governo vai impedir qualquer excesso de volatilidade da moeda. Mas não há, dentro da equipe econômica, a avaliação de qual será o patamar em que a moeda vai se estabilizar. “Pode inclusive ser mais baixo que o atual”, disse.
Reservas A fala do ministro ocorreu durante um evento realizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), com a participação de empresários de grande e médio porte. A palestra de Mantega era justamente tranquilizar o setor privado em relação ao ritmo de retomada do crescimento econômico e sepultar a onda de desconfiança que paira sobre as ações do governo Dilma Rousseff. A agenda do ministro na capital paulista faz parte da estratégia do Palácio do Planalto de criar uma agenda positiva junto a empresários e investidores. A ideia, dizem fontes da equipe econômica, é mostrar que o governo vai fazer o que for possível para reanimar o letárgico crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), e que para isso usará todas as opções que tiver à mão.
Foi nesse sentido que Mantega citou a possibilidade de o BC utilizar as reservas cambiais, atualmente superiores a US$ 370 bilhões, caso seja necessário uma intervenção ainda mais pesada sobre a cotação do dólar. “Temos muitas armas no Brasil para enfrentar uma volatilidade cambial, e a primeira delas é que temos reservas muito elevadas e até agora não gastamos um tostão dessas reservas”, assinalou.