O governo convocou tradings, mineradoras, produtores agrícolas e bancos de investimento para conversar e tentar empolgá-los com o programa de concessão de ferrovias. A tarefa, porém, é dura.
O desafio é superar as desconfianças do setor privado em relação a dois problemas principais: um desenho financeiro ainda considerado incerto e os riscos que as empresas assumirão ao se comprometer a construir, do zero, 11 mil km de ferrovias num prazo de cinco anos. E tudo isso para ter uma rentabilidade de, no máximo, 8,5% ao ano.
“Eles pediram apoio político”, contou o senador Blairo Maggi (PR-MT). “Para a gente se entusiasmar, chamar as empresas, mostrar que a carga existe.” Ele esteve na semana passada no gabinete da ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, acompanhado de outros produtores da região. A eles, ela afirmou que o governo tem muito interesse nesse programa.
Animados pela subida do dólar e pela perspectiva de elevar suas receitas com as exportações, os produtores rurais prometeram ajudar. “Vamos dar o suporte necessário”, informou o senador. Em outras conversas, porém, a reação foi mais fria. Além de pedir apoio aos produtores, o governo quer que tradings e mineradoras invistam nas novas ferrovias. “Precisamos estudar mais”, disse um executivo que veio a Brasília ouvir uma exposição do presidente da Empresa de Planejamento e Logística (EPL), Bernardo Figueiredo. O ideal para os usuários, explicou, seria ter a ferrovia pronta e operando a preços competitivos. “Mas, se não tiver outro jeito, vamos investir nelas.”
Perda de confiança
A ministra chamou também os economistas de alguns bancos para convencê-los da solidez do programa. O governo conta com investidores estrangeiros para financiar parte do Programa de Investimento e Logística (PIL). Gleisi ouviu, ainda, que o governo perdeu a confiança do mercado devido à falta de transparência nas contas públicas. O próprio senador Maggi reconheceu que o ambiente econômico não é dos mais favoráveis à empreitada, principalmente por causa da desaceleração da atividade.
Ao mesmo tempo em que tenta atrair novos investidores para as ferrovias, o governo faz ajustes no programa para diminuir resistências. Os técnicos estão encurtando os trechos ferroviários que exigiriam investimentos muito grandes.
É o caso, por exemplo, da linha entre Mairinque (SP) e Rio Grande (RS), de 1,7 mil quilômetros, que custaria cerca de R$ 25 bilhões. Ou do trecho Uruaçu (GO) a Campos (RJ), mais 1,7 mil quilômetros a estimados R$ 28 bilhões. Ou a ligação entre Belo Horizonte e Salvador, que mobilizará investimentos de R$ 12 bilhões. “Isso é dinheiro em qualquer lugar do mundo”, comenta um construtor. Ele avalia que o fracionamento dos lotes dará mais atratividade aos empreendimentos.
Menor retorno
Paralelamente, prosseguem as conversas entre governo e setor privado para elevar a estimativa de investimentos das novas linhas, como noticiado pelo Estado no dia 4. Potenciais investidores alegam que elas estão subestimadas, o que equivale a dizer que a possibilidade de retorno é menor.
As empresas estão inseguras porque, pelo modelo proposto, ficarão encarregadas de construir e operar a linha e, uma vez concluída, venderão 100% da capacidade de carga para a estatal Valec. Ela, por sua vez, a revenderá a quem tiver carga para transportar.
Por um lado, isso afasta o risco de ociosidade das ferrovias. O concessionário receberá sempre pela utilização total. Mas a dúvida é o que acontece se a Valec ficar sem orçamento, for privatizada ou extinta. É o que o mercado chama de “risco Valec”. Para diminuir os riscos da construção, a EPL vai se encarregar de obter as licenças ambientais para o início das obras, tarefa que seria das empresas.