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Estado de Minas

Lojistas do Centro de BH que resistem às obras do BRT fazem de tudo para salvar o Natal

Comerciantes da Santos Dumont e Paraná preparam liquidações para atrair clientes


postado em 14/12/2013 06:00 / atualizado em 14/12/2013 07:33

Edmilson de Oliveira já espera menos de dezembro: o abandono das ruas incomoda(foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)
Edmilson de Oliveira já espera menos de dezembro: o abandono das ruas incomoda (foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)

Quem precisa de aviso depois de ver o vizinho do lado fechar as portas da loja que já havia atravessado tantas crises da economia brasileira? No cenário de desolação do comércio de Belo Horizonte drasticamente afetado pelas obras do BRT, o sistema de transporte rápido por ônibus, nas avenidas Santos Dumont e Paraná lojistas já sabem que este não será mais um mês fácil e se preparam para uma nova batalha atrás do consumidor desaparecido desses grandes corredores de tráfego no Hipercentro. Vale quase tudo para trazer de volta o cliente às prateleiras sobreviventes da dupla crise do setor nessas áreas comerciais tradicionais. Liquidações fora de hora, descontos de 5% a 10% sobre preços já rebaixados, panfletagem, corpo a corpo na rua e até mesmo transformar parte do espaço em estacionamento são algumas das armas testadas para salvar o Natal.

Medidas de redução de custos foram as primeiras a ser adotadas, quando os tapumes das obras do BRT começaram a comprometer o poder de persuasão das vitrines. Houve corte de empregos em lojas e de comissões pagas a vendedores. Um dos reflexos mais duros das obras, para Lindalva Oliveira Leite Reis, sócia-proprietária da relojoaria e joalheria Casa Sanni, instalada na Avenida Paraná, está no fato de o consumidor ter perdido a referência das lojas que frequentava antes da transformação das avenidas em canteiros de obras. A comerciante não se abateu e decidiu sair do balcão para buscar o consumidor nas calçadas.

Lindalva Reis lamenta a perda de referência da loja e sai até a rua para fisgar clientes(foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)
Lindalva Reis lamenta a perda de referência da loja e sai até a rua para fisgar clientes (foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)
“Vou à rua. Se o cliente para em frente à vitrine, eu vou até lá e o faço entrar. Se ele entra, não perdemos a venda. Fazemos de tudo para fechar negócio”, diz Lindalva, que contabiliza queda de 40% nas vendas. A rigor, o prejuízo é maior principalmente para as lojas distantes das esquinas mais movimentadas. Estimativas da Associação de Comerciantes do Hipercento indicam o fechamento de 11 lojas na Avenida Santos Dumont e de cinco na Paraná. Os negócios minguaram de 20% a 50%, contas que derrubam as expectativas para a melhor data de vendas do comércio, num ano marcado pelo baixo crescimento da economia brasileira.

Além das portas fechadas, boa parte dos comerciantes preferiu não apostar na recuperação de público e passou o ponto. Na Avenida Paraná, onde as obras foram concluídas, trazendo passeios novos e boa iluminação, a postura de quem sobreviveu é de segurar o caixa pelo menos até 15 de fevereiro, data prevista para o pleno funcionamento dos ônibus, diz o presidente da Associação dos Lojistas do Hipercento, Flávio Assunção. “Trabalhamos visando o ano que vem. Aqui (na Avenida Paraná) caminhamos para um Natal perdido e os comerciantes da Santos Dumont vão enfrentar o segundo Natal frustrado”, afirma.

FATIA GORDA
Os negócios motivados pela festa religiosa representam um naco entre 25% a 30% do faturamento do comércio de BH durante o ano, de acordo com levantamento feito pelo Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL-BH). A instituição prevê uma receita do setor na capital mineira de
R$ 3,130 bilhões neste mês, representando 6% de aumento na comparação com o ano passado, quando as vendas subiram 7,6% ante 2011.

Menos otimista, a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo de Minas Gerais (Fecomércio MG) optou por traçar cenário de vendas estagnadas em relação ao Natal de 2012. Segundo o economista-chefe da instituição, Gabriel de Andrade Ivo, partir para a luta na estratégia é o que resta aos comerciantes dos dois corredores afetados pelas obras do BRT, aproveitando a imagem de variedade e de preços baixos que o comércio do Centro construiu muito antes da chegada dos shopping centers. “Eles não têm muitas escolhas. Agora é trabalhar nas vitrines, investir no bom atendimento daquelas classes de consumidores que ascenderam socialmente (C e D) e trabalhar nos descontos para não perder vendas”, diz.

Para Ivo da Silva, saída foi trabalhar em todas as frentes para manter as portas abertas(foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)
Para Ivo da Silva, saída foi trabalhar em todas as frentes para manter as portas abertas (foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)
Na Avenida Santos Dumont, o rastro de perdas parece maior. Enquanto algumas linhas de ônibus voltaram a circular pela Avenida Paraná, levando movimento para a região, no corredor vizinho não há trânsito de carros e menos ainda de pedestres. Ivo Regino da Silva, gerente do Armarinho Cecília Dias, que vende brinquedos e itens de papelaria, conta que os reflexos foram sentidos na redução do quadro de pessoal, que passou de sete para três empregados, e do horário de funcionamento.

Às vésperas do Natal, a loja encerra as atividades pouco antes das 18h, duas horas mais cedo do que nos bons tempos. “Eu trabalho em todas as frentes. Vendo, gerencio, atendo o cliente para poder manter a loja aberta, mas está difícil”, lamenta Silva. A empresa, que vende por atacado, passou a atender clientes no varejo e oferece descontos sobre preços já comprimidos. O abandono da região incomoda Edmilson Gomes de Oliveira, vendedor da loja de presentes Primavera, que passou a esperar menos do Natal. “Era a melhor data, mas as obras tiraram os clientes da rua. Muitos se afastaram por medo da violência e pelo pouco policiamento que temos na avenida.”

Do quebra-quebra à recuperação
Com a experiência de ter vivido 14 meses dentro de um grande canteiro de obras de revitalização urbana, os comerciantes da Savassi ainda trabalham pela recuperação das vendas, num momento de consumo desaquecido que também exige mais dos lojistas. Entre os que venceram a crise de vendas há mais de um ano, permaneceram armas como as promoções e um estoque de mercadorias que atendem o consumidor que prefere o charme da região à padronização dos shopping centers, avalia Alexandre Runcini, dono da lojas de roupas masculinas l’Uomo e coordenador do Conselho CDL-Savassi.

Flávio Assunção afirma que a região caminha para um período perdido ou frustrado(foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)
Flávio Assunção afirma que a região caminha para um período perdido ou frustrado (foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)
“O maior problema que ainda temos, mais que a requalificação urbana, é o aumento desenfreado dos aluguéis. Houve casos em que eles dobraram”, afirma Runcini. No ano passado, 52 lojas fecharam na Savassi. A substituição dos espaços seguiu seu curso e agora a zona nobre da capital começa a ver a chegada do comércio popular. O aluguel de lojas de rua alcança R$ 6 mil, valor próximo das despesas pagas por lojistas abrigados em grandes centros de compras.

A concorrência de artigos importados de baixo custo, não só de origem chinesa mas também fabricados nos Estados Unidos e na Itália, é outro fator que aumenta o desafio dos comerciantes espremidos nos corredores mais afetados por crises de vendas. Há lojistas com o sentimento de estar acuado, e que por isso optaram por deixar de investir para atrair de volta os clientes. É o caso da Padaria Bom d’Mais, instalada na Avenida Paraná, que perdeu 50% do faturamento desde o início das obras do BRT.

O gerente Antônio dos Reis Cota diz que o fluxo de consumidores baixou de até 2,1 mil para 700 pessoas diariamente. O investimento na decoração natalina foi cortado e o mix de produtos permaneceu sem o acréscimo feito todo ano. “Só esperamos pelo fim das obras, e tão logo isso aconteça, recuperar o que foi perdido. Antes disso, só nos resta segurar os custos e os funcionários”, afirma. (MV e CM)


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