Brasília – Cada brasileiro terá pago, ao fim de 2013, uma média de R$ 8.202 em impostos — o equivalente a 12 salários mínimos —, totalizando R$ 1,62 trilhão. O país não para de bater recordes de arrecadação. Em contrapartida, amarga o pior retorno dos tributos entre as 30 nações com a maior carga tributária, segundo estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT). É essa disparidade que potencializa a indignação de quem se depara com a precariedade dos serviços. E os dramas relatados por quem depende dos serviços públicos se repetem no país inteiro.
Perto das 9h de uma terça-feira, quase três horas após sair de casa, Reinaldo Freire da Silva, de 39 anos, chegou a uma agência do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), em Brasília, se equilibrando em uma muleta. Dias antes, já havia peregrinado pelo posto de Luziânia, onde mora, e do Gama, para onde mandaram que ele fosse. Em lugar algum, o Estado soube resolver o problema: uma simples inscrição no programa de reabilitação profissional por conta da amputação de um terço da perna direita.
O drama de Reinaldo ilustra o de milhares de brasileiros quando precisam dos serviços públicos. Burocracia excessiva, conflito de informações, gestão capenga e má vontade de funcionários despreparados ajudam a compor o leque da ineficiência diária do Estado, de norte a sul do país.
Quando tinha 9 anos, Reinaldo foi atropelado por um trator, no interior do Piauí. O pai, com quem ele não tem mais contato, era quem dirigia a máquina. A mãe morreu de câncer um ano depois. De pé inchado e nunca bem tratado, o piauiense se mudou para Brasília. Tocou a vida como cobrador de ônibus, auxiliar de padeiro e como mais fosse possível. Em outubro deste ano, desempregado, se entregou à ordem médica e submeteu-se à cirurgia que o fará conviver com a muleta até a colocação de prótese.
Casado e pai de seis filhos, Reinaldo não vê a hora de voltar a trabalhar. Por enquanto, vive à espera do programa de reabilitação profissional, sem o qual pode perder o auxílio que tem garantido o sustento da casa. Na central de atendimento do INSS, o beneficiário foi orientado a ir ao posto de Luziânia, onde a funcionária o despachou para o Gama, alertando que o fizesse logo, sob o risco de parar de receber o dinheiro do Estado. “Ela botou medo em mim, fez quase uma ameaça”, lembra.
No Gama, a perita do INSS o destratou. Disse que não atenderia ninguém de Luziânia e que nada tinha a ver com a orientação recebida por ele no município do entorno goiano. Reinaldo, então, retornou ao posto inicial e de lá o enviaram para a Asa Sul, na capital federal. “A falta de informação deixa a gente zonzo. Chego humildemente e só encontro grosseria”, desabafa ele, que deveria estar de “repouso absoluto”, sobretudo após duas recentes quedas no banheiro.
Com vermelhidão no local da cirurgia, de tanto perambular sem poder, Reinaldo gastou uma manhã inteira para, no destino final, ouvir de uma funcionária que voltasse a procurar o INSS em maio de 2014 e que, até lá, ficasse despreocupado. “Não entendi nada. Mas vou confiar, né? O que mais eu posso fazer?”, pergunta ele, tentando disfarçar a angústia ao chegar em casa, duas horas depois de deixar a agência.
Resposta do caso Reinaldo
Reabilitaçãoprofissional é umserviço prestado pelo INSS a segurados, dependentes e deficientes sem vínculo como Instituto. Consiste em um programa com atividades multiprofissionais para preparar a pessoa a voltar a trabalhar. Em resposta sobre o caso de Reinaldo, o INSS informou que ele ainda precisa ser avaliado na agência da 502 Sul, em Brasília. Enquanto a avaliação não for feita, porém, sustenta a nota,o benefício do piauiense está garantido, sendo estendido após uma eventual validação do programa. O INSS esclarece, ainda, que o segurado tem direito a solicitar, na agência de Luziânia, ajuda de custo para suprir as despesas comdeslocamento até a unidade que presta o serviço almejado. Reinaldo, no entanto, nunca foi informado sobre isso.