Brasília – Os usuários de planos de saúde começarão o ano com mais direitos garantidos. A partir de 2 de janeiro, o primeiro dia útil de 2014, os conveniados terão 87 procedimentos a mais na lista de cobertura obrigatória, além de 44 ampliações em consultas e exames já existentes e 22 diretrizes de utilização para avaliações genéticas. A exceção é o exame de detecção de ácidos nucleicos para qualificação de doadores de sangue, que só deve entrar em vigor em fevereiro, segundo determinação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
O novo rol de procedimentos, aprovado em outubro pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), vale por dois anos, quando deve ser novamente modificado. A principal novidade são os 37 medicamentos de uso oral para o tratamento dos tipos de câncer mais comum: estômago, fígado, intestino, rim, testículo, mama, útero e ovário. Como muitos desses remédios já são disponibilizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS), o beneficiário tem duas opções: continua na rede pública e o plano reembolsa o governo ou muda para o atendimento particular. Foram incluídas no rol também 28 cirurgias por vídeo e sete novos exames.
Entre as consultas ampliadas, estão os atendimentos com os seguintes profissionais: fonoaudiólogo, nutricionista, psicólogo e fisioterapia, que aumentaram de seis para 12 ao ano. Em casos específicos, as consultas de fonoaudiologia podem chegar a 48 por ano. Os usuários que necessitarem de bolsas coletoras intestinais ou urinárias (chamados pacientes ostomizados) também terão esses itens fornecidos pelas operadoras, assim como os equipamentos de proteção e segurança para usá-los.
Na área de análise genética, passará a ter cobertura do plano de saúde, por exemplo, o teste para o gene BRCA 1/ BRCA 2, para detecção de câncer de mama e ovário hereditários. Esse mesmo procedimento foi feito pela atriz americana Angelina Jolie antes de ela anunciar ao mundo que havia optado pela mastectomia para reduzir o risco de desenvolver o câncer de mama. Apesar de vários desses procedimentos genéticos já serem obrigatórios, a grande novidade é que a ANS, em parceria com as operadoras e o Ministério da Saúde, especificou a forma de utilização das tecnologias disponíveis, além da inclusão dos exames mais complexos para determinadas doenças, com o objetivo de direcionar o tratamento da melhor forma.
REAJUSTES
As operadoras reclamam que a inserção de novas tecnologias foi feita sem critérios e afirmam que vão encarecer os planos. Com isso, o novo rol deve gerar custo ao consumidor. O impacto que as operadoras tiverem com as mudanças será repassado às mensalidades em 2015. Entretanto, o presidente da ANS, André Longo, estima que o aumento será pequeno ou até mesmo zero. Segundo ele, o maior reajuste em consequência da atualização da lista obrigatória de procedimentos foi de 1,1% em 2011, referente às mudanças aplicadas em 2010. Neste ano, apenas 0,77% dos 9% corrigidos das mensalidades é relativo à revisão de cobertura mínima efetuada em 2012. À época da aprovação do novo rol, Longo ponderou que os custos com as novas tecnologias substituem os gastos com vários procedimentos ultrapassados, que são retirados da lista de cobertura mínima ou acabam tendo a utilização minimizada. Um exemplo são os medicamentos orais para câncer, que reduzem os desembolsos com as internações.
Para Danilo Santana, presidente da Associação Brasileira de Consumidores (ABC), as novas coberturas dos planos de saúde, principalmente os medicamentos orais contra câncer, exames genéticos e novos procedimentos cirúrgicos, são importantes para o consumidor e não devem provocar impactos significativos nas mensalidades. “O que mais preocupa hoje no setor não é o preço do plano, mas a assistência deficitária.” Segundo ele, as associações de defesa do consumidor já iniciaram um estudo em que pretendem analisar a evolução patrimonial das operadoras e as receitas do setor. O objetivo é questionar, a partir de relatórios, as falhas no atendimento, especialmente nas cidades de menor porte, onde os consumidores, com menos oferta de atendimento, estariam mais vulneráveis.
O comerciante Antônio Agildo Cavalcante, de 52 anos, que se recupera de uma cirurgia de reconstrução no quadril com colocação de prótese, considera a ampliação do rol como uma conquista, mas faz ressalvas. Segundo ele, apesar de a lista de cobertura obrigatória aumentar, as operadoras levam cada vez mais tempo para liberar os procedimentos. “É uma demora desnecessária. Parece que eles querem achar um motivo para não aprovar. A ANS tem que agir nesse ponto”, reclama. Ele lembra o caso do irmão, que faleceu com câncer em 2007. “Não me recordo de nenhum pedido de exame ou procedimento dele que tenha sido atendido de imediato”, completa. (Colaborou Marinella Castro)
Justiça é via para remédio
Depois que seu filho recebeu em dezembro de 2010 diagnóstico positivo para o câncer, Antônio Alves, presidente da Associação de Amigos e Usuários de Medicamentos Excepcionais (Assalmex), passou a se dedicar ao trabalho de ajudar portadores da doença no acesso ao medicamento. Ele considera positiva a inclusão das drogas orais contra o câncer no rol de procedimentos da agência reguladora, mas defende que a distribuição dos remédios aos pacientes, seja da rede pública ou privada, deveria ser uma obrigação do governo. “Com a distribuição pública, mesmo aos pacientes dos planos, não haveria diferença entre os usuários dos convênios e aqueles que dependem do SUS. O governo deveria distribuir o remédio aos usuários dos convênios e depois cobrar o ressarcimento dos planos. Minha preocupação é que haja tratamento diferenciado e os usuários do sistema público fiquem prejudicados”, defende.
Hoje existe uma corrida aos tribunais e a distribuição, em muitos casos, atende não a receita do médico, mas a mandados judiciais. O filho de Antônio Alves, o empresário Anthony Christian Duarte, descobriu que tinha um tumor no cérebro aos 33 anos. Usuário de um plano de saúde, ele precisou recorrer à Justiça para obter o remédio no valor de R$ 3,9 mil cada caixa, suficiente para três dias de medicação. Anthony faleceu em maio, mas à frente da associação seu pai continua a lutar para encurtar o caminho dos portadores do câncer até o remédio.
De alto custo, o tratamento de 45 dias com drogas orais como a que trata o tumor cerebral pode chegar a custar R$ 85 mil e uma autorização judicial chega a levar três meses. “O tempo é muito longo para quem tem urgência e nos últimos seis meses a situação piorou. Os processos judiciais estão demorando cada vez mais devido aos pedidos de perícia. As famílias enfrentam dois grandes sofrimentos: o primeiro quando recebem o diagnóstico da doença e o segundo quando são informadas do preço do remédio”, diz Alves.
Atualmente a Assalmex colabora com 82 pacientes em uso de medicações para diversos tipos da doença, no qual estão incluídos usuários dos planos e do Sistema Único de Saúde (SUS). Enquanto pacientes aguardam por decisões judiciais uma rede solidária tenta conseguir por meio de doações o remédio para pacientes sem recursos. (Marinela Castro)