Quem hoje vê o vaivém acelerado de táxis em frente ao saguão do terminal de passageiros do Aeroporto Internacional Tancredo Neves, em Confins, disputado até com motoristas clandestinos, pode não lembrar (ou até mesmo desconhecer) o ritmo da demanda pelo serviço de transporte pouco mais de uma década atrás. Os taxistas mais antigos no aeroporto recordam bem que para conseguir um único passageiro era preciso dormir dois ou até três dias na fila até a corrida seguinte. O tempo passava com os jogos de baralho. E, se atualmente, por dia, eles levam a Belo Horizonte até oito clientes, por anos atingir essa quantidade demorava pelo menos um mês, o que obrigou muita gente a vender a placa e procurar outra atividade.
Ao elaborar o projeto de construção do Aeroporto Internacional Tancredo Neves, em Confins, as projeções indicavam que, em 2000, dali a quase duas décadas do início das obras, 11,5 milhões de passageiros viajariam pelo terminal. Passadas três décadas, o fluxo jamais atingiu a marca. Distante de Belo Horizonte e, por longo período, menosprezado por viajantes, companhias aéreas e outros players, o aeroporto demorou a decolar de fato, tendo esperado cinco anos desde a inauguração para alcançar meros 25% da capacidade do terminal. A baixa procura lhe renderia por longo período o apelido de “elefante branco”.
A projeção inicial era que, em 1985, 2,6 milhões de pessoas voassem no aeroporto. Em 1990, seriam 4,5 milhões, ou quase 90% do limite operacional do terminal. Mas, se sem nenhum tipo de restrição era difícil para o aeroporto conquistar seu espaço no desenvolvimento de Minas, as medidas seguintes do governo federal decretariam de vez o ostracismo de Confins.
Em agosto de 1992, portaria do Departamento de Aviação Civil (DAC) limitou as operações no aeroporto metropolitano. Pela definição do órgão, os grandes voos deveriam ser transferidos para as unidades centrais das principais metrópoles. Tinha início a priorização de Pampulha, Santos Dumont e Congonhas, em BH, Rio e São Paulo, respectivamente, em detrimento de Confins, Galeão e Guarulhos.
No mesmo ano, no aeroporto internacional o fluxo foi 31,56% menor em relação ao ano anterior, enquanto no concorrente aumentava o número de passageiros em 60,37%. Com oscilações ano a ano, os dois aeroportos encerrariam a década em patamares bem distintos: Confins com o título de elefante branco e 320 mil passageiros transportados a menos que um ano antes da fatídica portaria, bem distante da projeção de demanda da época da construção. Já o regional, saturado, teria movimentação mais de cinco vezes maior que em 1991 e os usuários seriam obrigados a conviver com os antigos problemas que levaram à construção de um segundo aeroporto na Grande BH.
Quatro anos depois, com a continuidade da migração de voos, a Pampulha ultrapassaria a movimentação de Confins. Em 1999, o aeroporto regional receberia mais que o dobro de passageiros. O ápice aconteceria em 2003, quando somente 364 mil passageiros voariam no metropolitano (7,3% da capacidade), enquanto 3 milhões passariam pelo terminal da capital. Os números reforçariam o coro de economistas e outros críticos da construção do aeroporto. Na década de 1980, se dizia que o valor gasto na nova infraestrutura poderia ter sido usado em outras obras prioritárias para o país.
Tempos difíceis
Sem passageiros, possivelmente os taxistas foram os mais prejudicados, principalmente os motoristas com placas de Lagoa Santa e Confins, que eram proibidos de buscar passageiros em outras cidades e tinham no aeroporto internacional seu principal ganha-pão, enquanto os metropolitanos (azuis) migraram para a Pampulha. “A prefeitura oferecia placas e ninguém queria. Muita gente pretendia era se livrar”, recorda Leonardo César, que, ao contar as histórias de outros tempos, surpreende os colegas próximos. O retorno financeiro era tão baixo que a maioria dos profissionais tinha dois serviços. “O dinheiro mal dava para pagar a prestação do carro, que tinha mais de 10 anos de uso”, afirma ele.
Em 1998, Antônio Mariposa começava como frentista do posto de combustível do aeroporto internacional. Ele lembra que, por dia, no máximo, 20 carros abasteciam, sendo a maioria de locadoras. Mas, por ter carteira assinada e horário fixo, o salário era melhor que dos taxistas. “Lembro bem. Os taxistas tinham que fazer desconto para conseguir passageiro. A corrida era R$ 60, eles faziam por R$ 30”, afirma ele, hoje taxista.
A única salvação eram os minguados voos internacionais, que, mesmo depois da polêmica portaria, voltaram a ter espaço no hoje Aeroporto Internacional Tancredo Neves. Em 1993, a Pluna lançou sua rota BH-Montevidéu; um ano depois foi a vez da American Airlines, operando Confins-Miami, com escala em Guarulhos, e, por fim, em 1995, o aeroporto internacional teria sua primeira ligação direta com os Estados Unidos, realizado pela United Airlines. O voo parava em Miami e seguia até Nova York. Sem sucesso, somente a AA prolongaria a permanência por mais tempo.