Três Corações, São Lourenço, Carmo de Minas e Patrocínio – Cafeicultores há 35 anos, Ricardo Iabrudi e Marjorie Furtado decidiram verticalizar a produção de grãos especiais – cerca de 30% da lavoura pode render frutos de excelente qualidade – como forma de melhorar a performance do lucro obtido com a colheita. Na prática, o casal passou a torrar, moer e embalar os cafés especiais em pacotes de um quilo. Para isso criaram marca própria, a Café Grão da Terra, e abriram uma cafeteria batizada com o mesmo nome às margens da BR-381, em Três Corações, no Sul do estado, para vender o produto diretamente ao consumidor. “Nosso movimento cresce, a cada ano, em torno de 20%”, comemora a mulher.
A abertura de cafeterias junto à lavoura funciona como uma espécie de loja-modelo, onde o fazendeiro-empresário vende sua marca com maior valor agregado (fruto torrado e moído) e, de quebra, oferece drinques à base de café e outros produtos e serviços ligados ao setor. Os espaços, por exemplo, funcionam como salas de aula para cursos de baristas, degustadores e, em alguns casos, até para a venda de roteiros turísticos às lavouras. Os mesmos lugares são oferecidos para reuniões entre executivos. “É uma tendência. O mercado de café é marcado pelo relacionamento”, avalia Marcos Antonio Teixeira, analista de Agronegócio do Sebrae Minas.
Para entender como a verticalização da cafeicultura garante um bom ganho ao produtor, é preciso destacar que uma saca de 60 quilos do in natura rende, depois de beneficiada, cerca de 40 quilos de café torrado e moído. Apesar da redução na quantidade, há aumento de receita, uma vez que a mercadoria ganha em valor agregado. A comparação é a seguinte: o mercado paga na saca do in natura especial de R$ 500 a R$ 600, portanto, o quilo custa de R$ 8,30 a R$ 10. Já o preço do café beneficiado é bem mais alto, uma vez que vai direto ao consumidor. Ricardo e Marjorie, por exemplo, vendem cada quilo do Café Grão da Terra a R$ 30.
Portanto, depois de torrar e moer uma saca que custaria de R$ 500 a R$ 600, eles embolsam R$ 1,2 mil com os 40 pacotes de um quilo negociados a R$ 30 cada um. “A venda diferenciada, com valor agregado, é uma maneira de deixar de negociar o produto como commodity, o que nos possibilita um valor melhor”, comemora Ricardo. Ele e a companheira planejaram bem a abertura da cafeteria. O primeiro passo foi garantir qualidade aos grãos. Tanto que o casal venceu, na categoria café cereja descascado, a 20ª edição do Minasul de Café.
“É o que a gente chama de verticalizar a cadeia: o produtor conquista certificações, organiza visitas à fazenda, vende o café para clientes mais exigentes. Ele passa a ser demandado pelo café torrado. Alguns fazem a própria torra, outros a terceirizam. Outros evoluem para a marca própria”, disse Marcos Antônio Teixeira, analista do Sebrae Minas, entidade que ajuda os pequenos produtores a voos maiores.
CERRADO
Em Patrocínio, no Alto Paranaíba, Thiago Veloso da Motta, dono da Fazenda Jatobá, é um dos produtores que fornecem cafés para paladares finos. Para ele, “o café especial é o vinho da vez”. “A maior parte de nossa produção (70%) é exportada, mas percebemos que o poder aquisitivo do brasileiro melhorou e que também ocorreu a ‘glamourização’ do café de boa qualidade no mercado interno”, disse o rapaz. O produto é servido em restaurantes finos de Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba.
Thiago dispensa um trato especial à lavoura: os resíduos orgânicos na produção do grão, como a palha e restos da colheita de verduras e legumes, além de bagaço da cana, são coletados e, depois da compostagem, viram adubo. De quebra, ele reduziu pela metade o custo com a compra de fertilizantes. Essa “vitamina de insumos” beneficia o meio ambiente e levou a fazenda a vencer, em 2012, o Prêmio Sebrae Minas de Sustentabilidade. A Jatobá também lucra com a venda de sementes. Uma remessa já foi encaminhada para a África. “Fomos os primeiros da região a implantar uma câmara fria para sementes.”
O bom planejamento
Nenhuma lavoura é capaz de produzir 100% de grãos especiais. Dessa forma, recomendam os especialistas, o ideal é o produtor negociar o grão tradicional para pagar o custeio da fazenda e saber planejar a venda das sacas especiais. “Quando se fala de café especial, fala-se de mercado de nicho. A venda precisa ser planejada, com o cliclo mais longo e alguns detalhes bem trabalhados. Ou seja, o produtor precisa ser um empresário rural”, acrescenta Vanusa Nogueira, diretora executiva da Brazil Specialty Coffee Association (BSCA).