Brasília – Em um esforço para recuperar a credibilidade da política fiscal e evitar o rebaixamento da nota de crédito do país pelas agências de risco, o governo federal anunciou nessa quinta-feira um corte de R$ 44 bilhões no Orçamento do ano. Prometeu, ainda, entregar um superávit primário (economia para pagar os juros da dívida) equivalente a 1,9% do Produto Interno Bruto (PIB), valor considerado mais plausível do que os 2,3% previstos na Lei Orçamentária Anual. O contingenciamento foi bem recebido nos mercados, que deram à equipe econômica um voto de confiança, mas com ressalvas: os agentes financeiros esperam resultados mensais compatíveis com os objetivos apresentados.
O governo parece empenhado, ao menos do ponto de vista da comunicação, a reconquistar a confiança perdida nos último três anos em função de um modelo chamado de “Nova Matriz Econômica” e que falhou. Hoje, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, promove uma conferência com a imprensa estrangeira para detalhar os cortes orçamentários e explicar como fará para alcançar as metas fiscais. Na segunda-feira, o ministro e parte da sua equipe viajam para São Paulo, onde se encontraram com 10 economistas renomados em uma reunião fechada. O objetivo é mostrar que acabou a contabilidade criativa e que, a partir de agora, a transparência deve prevalecer – o contingenciamento será novamente esmiuçado pelo ministro.
A Fazenda ainda apresentou projeções para o ano, perspectivas consideradas otimistas por analistas. A pasta estima que, em 2014, o país crescerá 2,5%. O mercado, por outro lado, espera um avanço menor, de 1,79%, e uma parte dos analistas começa a falar em 1,5%. Para a inflação, a perspectiva oficial é de um Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 5,3% ao fim do ano, enquanto a mediana dos economistas está em 5,93%. Mantega, no entanto, classificou essa previsão como “possível e realista”.
O mercado, a despeito de ter aceitado bem o tamanho do contingenciamento, ainda tem dúvidas. Em 2011, por exemplo, os gastos ficaram acima do previsto pelo governo e superaram o valor do contingenciamento. Em 2012 a situação foi semelhante. Na época, a previsão era desembolsar, após um corte de R$ 7,7 bilhões, R$ 308,4 bilhões com benefícios previdenciários, mas, ao fim do ano, a despesa alcançou R$ 316,6 bilhões.
O ministro ainda negou que a redução da meta de superávit primário dos governos regionais tenha relação com as eleições. A meta de estados e municípios caiu de 1% do PIB, o equivalente a R$ 51,3 bilhões, para 0,35%, uma cifra de R$ 18,2 bilhões. “O ano eleitoral não pesou. Se pesasse, nós faríamos um primário menor para poder gastar mais”, afirmou. Mantega também refutou críticas de que fez o planejamento orçamentário já contando com receitas extraordinárias no fim do ano. Ele disse que espera apenas o que já está estimado no Orçamento.
Riscos
O contigenciamento anunciado ontem foi bem recebido por duas das três principais agências de classificação de risco. Elas, no entanto, pregaram cautela quanto a implementação da política fiscal brasileira. A diretora de crédito da América Latina da agência de classificação de risco Fitch Ratings, Shelly Shetty, elogiou o anúncio do contingenciamento do governo brasileiro. “Precisamos monitorar a implementação e a performance fiscal em 2014 para julgar quão efetivo o contingenciamento será, especialmente no contexto de contínuos riscos às projeções de crescimento”, disse a analista em comunicado divulgado ontem.
A agência argumentou ainda que o contingenciamento orçamentário do Brasil é um passo na direção correta e observou que o governo tem buscando ancorar as expectativas sobre a política fiscal. A Moody's avaliou que a meta de 1,9% do Produto Interno Bruto (PIB) está de acordo com a perspectiva estável do rating do país, o selo “Baa2”. “Ainda que o anúncio ajude a diminuir as preocupações do mercado, neste momento estamos mais focados no resultado final”, afirmou por meio de nota o analista da Moody's para o Brasil, Mauro Leos.