Brasília – O governo conta com algumas cartas na manga para 2014. A maior delas é o cessar-fogo dos ataques de investidores estrangeiros a moedas de países emergentes, entre as quais o real. Em 2013 a divisa brasileira perdeu 15% do seu valor ante o dólar. A escala seguiu firme nos primeiros dias de 2014, em função da piora do pessimismo com países emergentes considerados frágeis. Nesse grupo estão Turquia, Índia e África do Sul, que, a exemplo do Brasil, elevaram suas taxas de juros internas para atrair capitais estrangeiros.
O governo brasileiro armou uma força-tarefa para combater o pessimismo com o país. Até a presidente Dilma Rousseff foi escalada para o corpo a corpo com investidores estrangeiros, ao discursar para os principais líderes econômicos em Davos, na Suíça. Não sem motivo a aparente calmaria nos mercados internacionais, que se sucedeu após o encontro, passou a ser vista como sinal de alívio pela equipe econômica. No entender de técnicos do governo, o fim das turbulências com emergentes diminui o risco de uma disparada ainda maior do dólar ante o real, o que poderia provocar em 2014 pressão adicional sobre a inflação no Brasil.
Também chamou a atenção do governo o discurso da presidente do Federal Reserve, o banco central norte-americano, Janet Yellen. Ao mesmo tempo em que provocou queixas em Brasília, para classificar o Brasil como o segundo emergente mais frágil, à frente apenas da Turquia, Yellen deixou claro: ainda que a economia dos EUA engate forte recuperação, não haverá “aumento automático” dos juros. A avaliação de uma fonte da equipe econômica é que essa afirmação de Janet é “bastante positiva”, porque afasta o risco de uma subida forte nos prêmios de juros pagos pelos governos de todo o mundo, inclusive o Tesouro Nacional. Não por acaso, o mesmo Fed já havia mencionado, em relatório, que, “em alguns emergentes vulneráveis, os (prêmios de) juros continuam apresentando aumentos exagerados – especialmente no Brasil e na Turquia”, disse.
Pesam para esses prêmios, esclarece o economista-chefe de um grande banco de investimentos, os juros altos pagos pelo governo como forma de remuneração do capital de curto prazo (taxa básica). O BC brasileiro vem aumentando a taxa Selic desde abril de 2013. Já emergentes tidos como frágeis, como Turquia, África do Sul e Índia, só começaram a fazê-lo este ano. Não por acaso, disse uma fonte governista, o Brasil está mais preparado do que esses países para esse período de aversão a emergentes. No jargão financeiro, ainda é forte o “sell-off”, ou seja, a venda de ativos em países com risco elevado para aplicar em economias maduras, como os Estados Unidos.
Risco
Ainda no front externo, o governo espera afastar de vez a ameaça de rebaixamento da nota de crédito pelas agências de classificação de risco. Até duas semanas atrás o país ainda enfrentava resistência, sobretudo em função de uma política fiscal frouxa e pouco crível. Mas, nas avaliações do Palácio do Planalto, o anúncio na semana passada de um corte de gastos de R$ 44 bilhões no Orçamento deste ano — portanto acima do consenso do mercado, que era de um contigenciamento de R$ 35 bilhões — será suficiente para aplacar os ânimos dos investidores com a política econômica.
A aceitação ao anúncio do corte de gastos tem sido medida pelo governo junto a importantes analistas de bancos e corretoras. A decisão de ouvir o mercado partiu do Palácio do Planalto, mas envolve também o Ministério da Fazenda e o BC. As duas pastas têm realizado diversas reuniões com analistas financeiros em São Paulo e Brasília. O objetivo é afinar o discurso com o setor privado e transmitir o pensamento do governo ao mercado, ainda que os técnicos escalados para essas conversas pouco expressem opiniões sobre assuntos considerados tabus, como os juros.