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Estado de Minas

Penhor avança com juro baixo

Caixa Federal firmou 1,2 milhão de contratos com clientes que empenharam joias em 2013, um aumento de 19,5%


postado em 02/03/2014 06:00 / atualizado em 02/03/2014 07:30

Guilherme Araújo

Os brasileiros que comprometeram elevada parcela de renda com o pagamento de prestações enfrentam dificuldade no acesso a novos empréstimos. Uma saída para rolar débitos ou conseguir pagar gastos imprevistos pode ser usar joias e outros bens pessoais como garantia. O penhor dispensa pesquisa cadastral e permite a liberação imediata do dinheiro.

Devido aos juros baixos cobrados nessa modalidade e à ausência da burocracia típica de outras modalidades de crédito, essa linha de financiamento não para de crescer no país. A Caixa Econômica Federal encerrou o ano passado com um total de empréstimos concedidos na forma de penhor de R$ 1,5 bilhão. A cifra é recorde desde que o sistema foi criado, em 1931, pelo presidente Getulio Vargas, com exclusividade para o banco estatal.

(foto: Alexandre / EM / DA Press)
(foto: Alexandre / EM / DA Press)
Das agências da instituição em todo o Brasil, 479 trabalham com penhor e o número de contratos firmados em 2013 foi de 1,2 milhão, 196 mil a mais que em 2012. O acréscimo foi de 19,5%. Desse total, 64 % foram assinados por mulheres. Entre elas está Aparecida da Silva, de 61 anos, que usa o sistema há duas décadas. "Eles pagam R$ 35 pelo grama do ouro. Mesmo sabendo que a avaliação está abaixo da do mercado, o juro baixo e a dispensa de avalista são atraentes", diz a pensionista do INSS.

Em novembro do ano passado ela teve de viajar urgentemente ao Rio Grande do Sul para visitar a mãe, que sofreu um acidente. Sem nenhuma poupança, o penhor foi a única saída para pagar a passagem. "Minhas férias tinham acabado dias antes do acidente e eu estava com as economias esgotadas", explica ela, que mora com duas filhas e um neto. Não foi a primeira vez que Aparecida usou essa modalidade de crédito. Quando o salário não é suficiente para pagar as contas no fim do mês ela recorre ao baú de jóias, seleciona as melhores peças e as leva para o banco.

A técnica em enfermagem Lilian Reis, de 37, é adepta do penhor há 10 anos. Quando adolescente, passou por dificuldades financeiras e resolveu seguir o conselho da tia: usar as jóias que ganhou de presente da mãe para pagar o primeiro semestre da faculdade. "Minha tia pagava a faculdade da minha prima com colares e brincos. Como eu não queria trancar minha faculdade, resolvi seguir o conselho dela", conta Lilian.

Não foi só a formação profissional que a técnica em enfermagem garantiu com o penhor. "Algumas joias de família salvaram a vida da minha filha mais velha", lembra. Aos 14 anos, a menina teve um problema no intestino. Foi necessário passar por cirurgias que custaram R$ 42 mil e não foram cobertas pelo seguro-saúde. "Fui até ao banco, mas o empréstimo foi negado", ressalta. A saída encontrada por Lilian para obter o dinheiro foi usar objetos de valor herdados da bisavó. Um ano e meio mais tarde recuperou tudo. "Só resgatei porque tinham um valor sentimental", observa a servidora pública.

Após descobrir que as joias podem ajudar em um momento de aperto, Lilian passou a optar por esse item como presente do namorado, de amigos e de familiares. É também o que compra para as filhas. "As meninas gostam muito, e sabem que poderão negociar um dia, se for necessário", completa.

Para ajudar nas despesas do começo do ano, Lilian costuma também recorrer ao penhor. Com os recursos que consegue reunir ela quita o Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU), Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), e compra o material escolar para as filhas. "É mais vantajoso do que utilizar o cheque especial, que tem juro muito mais alto", comenta.

O custo médio mensal para quem ultrapassa o limite da conta-corrente é de 10% ao mês. No penhor, a taxa cobrada pelo banco é de 1,8%. Para o superintendente regional de Brasília da Caixa, Elício Lima, esse é o grande atrativo da modalidade de financiamento. "Seu grande concorrente é o crédito consignado, com juro de 1,85% ao mês. Mas nem todo mundo é funcionário de uma empresa que permita tomar crédito dessa maneira", diz.

De olho no prazo do resgate
Quando o débito não é quitado, a joia vai a leilão. O superintendente da Caixa Elício Lima afirma que, dos lotes marcados para essa destinação, 77% são resgatados a tempo pelos clientes. "A Caixa não tem interesse em se apropriar dos bens", diz. Ele explica o que fazer para a pessoa não perder a joia, caso esteja inadimplente. "O cliente pode pagar o juro e renovar a operação por mais 180 dias ou parcelar em até 60 vezes. É possível fazer isso tanto pela internet quanto no autoatendimento. Só não se pode deixar passar o dia do leilão", afirma. Ele espera que em 2014 o banco atinja um novo recorde nessa modalidade de crédito. E acha que as mulheres vão continuar hegemônicas na clientela.

Há quem se aproveite dos leilões para adquirir peças que não foram resgatadas a um custo menor, a exemplo da técnica em enfermagem Lilian Reis. "Com R$ 600 compro joias lindas e certificadas. A mesma peça seria muito mais cara na loja", afirma. O site da Caixa Econômica tem uma vitrine on-line, na qual o consumidor pode conferir o que vai a leilão em todos os estados. Pode, ainda, saber as datas e os locais de venda — que ocorrem em geral a cada dois meses —, dar lances e saber como retirar a peça arrematada.

O professor de finanças da Fundação Getulio Vargas (FGV) Aguinaldo Pereira comenta que a pessoa recorre ao penhor quando "está numa situação crítica". Mas avisa que, se isso ocorre com muita frequência, é um mau sinal. "Não adianta tomar um empréstimo sem a vida financeira estar administrada. Antes de recorrer ao crédito, é importante fazer um levantamento para ver qual é o salário líquido, quanto e com o que se gasta o dinheiro. Só depois se toma qualquer medida para sanear o orçamento", recomenda.

Para o banco, diz Pereira, a vantagem está não só na operação em si, mas na conquista de novos clientes. "Essa linha de financiamento, com juros abaixo dos praticados pelo mercado, é um dos grandes chamarizes da instituição financeira. É marketing benfeito", observa o especialista da FGV.

O presidente da Associação Brasileira de Educadores Financeiros (Abefin), Reinaldo Domingos, observa a importância de o tomador do empréstimo alertar os parentes de que joias serão penhoradas. "É preciso comunicar a família, ainda mais quando se tratar de joias herdadas. Assim, todos estarão envolvidos na recuperação da peça, reduzindo o risco de perdê-la", afirma. Pereira, da FGV, também chama a atenção para a necessidade de não pensar apenas no dinheiro quando se recorre ao penhor. "A pessoa pode perder um bem que não tem apenas valor monetário, mas sim sentimental. E, caso isso ocorra, não o terá de volta", alerta.


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