A política do Banco Central em aumentar os juros (Selic) para frear a alta nos preços e controlar a inflação refletiu na composição da taxa média do crédito ao consumidor: o indicador fechou fevereiro passado com a nona alta mensal seguida e o maior percentual, desde agosto de 2012, tanto para a pessoa física quanto para a jurídica. c – crescimento de 3,01%. A das empresas, na mesma base de confronto, foi de 3,29% para 3,32% – aumento de 0,91%.
Os dados foram divulgados nessa terça-feira pela Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac). O coordenador do estudo e diretor-executivo de pesquisas econômicas da entidade, Miguel José Ribeiro de Oliveira, considera que o aumento nas duas linhas de crédito ocorreu em razão da última alta da Selic, em fevereiro, quando a taxa básica de juro subiu de 10,5% ao ano para 10,75%. Ele não descarta novas elevações tanto da Selic quanto do custo dos créditos.
“Considerando as elevações da Selic desde janeiro de 2013, tivemos (até fevereiro de 2014) uma alta de 3,5 pontos percentuais (elevação de 48,28%), de 7,25% ao ano, em janeiro de 2013, para 10,75% em fevereiro de 2014. Nesse período, a taxa de juros média para pessoa física aumentou 8,55 pontos percentuais (alta de 9,65%), de 88,61% ao ano, em janeiro/2013, para 97,16% ao ano no mês passado. Nas operações de crédito para pessoa jurídica houve uma elevação de 4,24 pontos percentuais (alta de 9,69%), de 43,74% ao ano, em janeiro do ano passado, para 47,98% ao ano em fevereiro”, informou a Anefac.
“A Selic é uma taxa balizadora. O sistema financeiro toma suas próprias decisões. O aumento do juro diminui o consumo, principalmente o de bens com maior valor agregado. Reduz investimento. Hoje, o único instrumento possível para controlar a inflação é o aumento do juro. É preciso reformas estruturais, como a reforma trabalhista, a tributária…”, avaliou Ana Paula Bastos, economista da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL-BH).
A taxa média da pessoa jurídica é composta por seis linhas de crédito (veja arte). Todas aumentaram de janeiro para fevereiro desse ano. Os juros do comércio, por exemplo, subiram 2,53% de janeiro para fevereiro, de 4,35% ao mês para 4,46%. O aumento parece irrisório, mas, dependendo do valor da compra, o consumidor desembolsará uma boa quantia a mais. A pedido do EM, a economista da CDL simulou compras com as duas taxas de juros.
Cálculo Na hipótese de o consumidor adquirir um bem avaliado em R$ 30 mil, pagando a metade de entrada e financiamento a outra metade em 18 parcelas iguais, ele desembolsará, no caso do juro de janeiro cobrado pelo
comércio (4,35%), prestações de R$1.218,85. O total da mercadoria seria de
R$ 32.281,63. No caso do juro de fevereiro (4,46%), cada parcela será de R$ 1.229,62, com o preço final do bem chegando a R$ 32.899,68. A diferença é de R$ 618.
O maior juro para pessoa física, porém, é o do cartão de crédito. De janeiro para fevereiro, a taxa da moeda de plástico saltou de 9,37% para 10,08% – alta de 7,58%. Dessa forma, o juro anual do cartão disparou de 192,94% para 216,59%. Em último caso, é mais vantajoso usar o cheque especial, cujos percentuais do primeiro para o segundo meses do ano foram, respectivamente, de 8,03% e 8,08%. O aumento, de 0,62%, foi bem menor do que o da moeda de plástico. A Anefac também consultou o juro de 12 lojas de crediário: todas aumentaram, mas os nomes das redes não foram divulgados na pesquisa.
Empresas Da mesma forma que as linhas de crédito para pessoas físicas, o juro de todas as três para as jurídicas também apurou aumento de janeiro para fevereiro. A taxa de capital de giro, por exemplo, cresceu 2,35%, de 1,70% para 1,74%. O juro para desconto de duplicata ficou 1,26% maior no período, de 2,38% para 2,41%. A da conta garantida subiu menos: 0,52%. Com isso, o juro para tal linha de crédito passou de 5,79% para 5,82%. No ano, ela foi de 96,49% para 97,16%.
Inflação recua
A inflação perdeu fôlego em Belo Horizonte e desacelerou na primeira semana de março. Embora o Índice de Preços ao Consumidor Semanal (IPC-S) da capital mineira tenha registrado variação positiva de 0,68%, o resultado foi 0,10 ponto percentual (p.p.) inferior ao divulgado na quarta semana de fevereiro, de 0,78%. Grupos já conhecidos pelo consumidor continuaram exercendo pressões acima da variação média e apertando o orçamento. Alimentos – com destaque para a banana-prata, que avançou 21,06%, ante 15,8% – variaram 0,8%, ante 0,73% no período anterior.
Com destaque aparecem também as contribuições dos grupos habitação e saúde e cuidados pessoais, que aceleraram 0,94% e 0,85%, respectivamente. Em sentido oposto, com registro de desaceleração em suas taxas, aparecem os grupos despesas diversas, que passou de 1,22% para 0,58%, e comunicação, que passou de 0,7% para 0,25%. Na média das sete capitais, que considera ainda Rio de Janeiro, São Paulo, Porto Alegre, Recife, Brasília e Salvador, a inflação foi de 0,71% e o índice avançou em quatro das sete cidades pesquisadas.
Cesta básica Enquanto alguns itens da alimentação abriram o mês com registro de alta nos preços, dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) apontam queda no valor da cesta básica de fevereiro. No mês passado, a cesta teria apresentado o seu segundo recuo consecutivo no ano, com queda de 1,49%. Em janeiro, a queda foi de 3,1% ante dezembro. Em relação a fevereiro do ano passado, o recuo chega a 4,93%.
Uma das causas, porém, pode ser o próprio período da coleta de dados, que ocorreu antes dos primeiros registros de altas em produtos como o tomate, que segundo informações do IPC-S (FGV), subiu 24,55% apenas na primeira semana de março. Dos 13 itens da cesta, de acordo com o técnico do Dieese MG, Lúcio Monteiro, 12 apresentaram queda em fevereiro e apenas a carne avançou 0,17%. Entre as maiores reduções apareceram, de acordo com a pesquisa, a batata (-4,20%), o feijão (-4,14%), a banana (-3,48%) e o tomate (-3,45%). Em 12 meses, as maiores elevações foram sentidas na farinha (16,57%), banana (13,99%) e no pão (10,05%).
Disposição para gastar
Apesar dos juros altos, o brasileiro não só não costuma poupar dinheiro como, quando o faz, gasta o que guardou logo em seguida. Pesquisa nacional do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) mostra que 54% das pessoas não conseguem economizar qualquer quantia de seus rendimentos, ante 42% que conseguiram juntar alguma coisa. O estudo dividiu os brasileiros entre tomadores, equilibristas, os alternados, os seguros e os investidores, de acordo com o perfil na administração das finanças.
Tomadores são aqueles que estouram os limites na hora das compras e não conseguem pagar suas contas em dia. Os equilibristas mantêm sua conta no zero a zero, sem dívidas, mas sem economias. Já os alternados prezam pouco pela segurança nos investimentos e são o segundo da lista em matéria de extrapolar nos limites de consumo. Por outro lado, os seguros são aqueles que menos estouraram as contas nos últimos três meses e que menos deixam de pagar a fatura do cartão de crédito. Já os investidores são os que mais prezam pela segurança na hora de investir, conseguem pagar as contas em dia e garantem uma sobra para gastos não previstos.
No vermelho De acordo com o levantamento, três em cada 10 entrevistados considerados tomadores bancarizados estavam com as contas no vermelho no mês anterior à pesquisa. Além disso, 45% dos equilibristas estavam com a conta empatada, ou seja, não deviam, mas também não possuíam dinheiro no banco. Enquanto isso, nada menos do que 67% dos investidores, contra a média de 47%, estavam com a conta bancária no azul, seguido dos seguros, com 59%.
Segundo Flávio Borges, gerente financeiro do SPC Brasil, a pesquisa deixa claro o fato de que a cultura do país não incentiva os brasileiros a investir. “As pessoas que têm acima de 30 anos cresceram numa economia de hiperinflação”, lembra. Além disso, mesmo sem contribuir para a Previdência, as pessoas não se preocupam em guardar dinheiro para o futuro porque contam com a Previdência”, analisa.