Brasília – A ascensão social de cerca de 40 milhões de brasileiros antes considerados pobres à classe média e ao mercado de consumo produziu inflação no país. A avaliação é do presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, que creditou à ampliação da renda familiar parcela de culpa pelo histórico problema preços altos ao consumidor. Para o comandante da autoridade monetária, a persistência da inflação em patamar elevado “é algo estrutural”. “Quarenta milhões de pessoas disputando consumo, não só de serviços, como de infraestrutura, tem impacto (nos preços)”, disse ontem, ao participar de audiência com parlamentares da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal.
Há quatro anos que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o patamar oficial do custo de vida no país, registra variação superior aos 4,5% ao ano. Isso quer dizer que a última vez que o governo entregou uma inflação perto do centro da meta foi em 2009. Ainda assim, porque, naquele ano, o país mergulhou na crise econômica mundial, e o Produto Interno Bruto (PIB) encolheu 0,3%.
Era de se esperar, portanto, que os preços mais altos, ao estimularem o consumo, tenderiam a ser acompanhados de crescimento econômico maior. Não foi o que aconteceu. Nos últimos três anos, a média de desempenho do PIB foi de apenas 2%. Enquanto isso, a inflação disparou, ano a ano, em média 6,08%, conforme cálculos do Estado de Minas. A situação deve se repetir este ano. O consenso do mercado financeiro é que o IPCA registre alta de 6,11%, até dezembro.
Visão ainda mais pessimista têm os analistas que, em geral, mais acertam previsões econômicas. Chamados de Top 5, as cincos instituições que lideram a pesquisa Focus, produzida pelo próprio BC, cravam que a inflação saltará este ano para 6,43%. Muito perto, portanto, do teto da meta perseguida pelo governo, de 6,5%.
Há analistas, no entanto, que acreditam que antes mesmo de dezembro os preços romperão esse patamar. “Já em setembro vamos ter um IPCA acima de 6,5%”, disse o economista sênior do BES Investimento, Flávio Serrano. A má notícia é que o próprio BC prevê que nem neste ano, nem em 2015 os preços voltarão para o centro da meta, de 4,5%.
Diante de um quadro tão pessimista traçado para a inflação, o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) quis saber de Alexandre Tombini se o Brasil estaria fadado a ter preços elevados durante um longo período. De pronto, o presidente do BC rebateu: “Não há nada que nos condene a uma inflação acima do centro da meta”, ele disse. “Vamos perseguir (os 4,5%). Aliás, já estamos perseguindo (esse patamar)”, justificou.
Juros Tombini lembrou que desde abril de 2013 o Comitê de Política Monetária (Copom) votou por oito reajustes consecutivos na taxa básica de juros. Com isso, a Selic saiu da mínima histórica, 7,25% ao ano, e atingiu o patamar atual de 10,75%, alcançado ao fim de fevereiro. Curiosamente, esse é o mesmo nível em que os juros estavam quando a presidente Dilma Rousseff assumiu o governo, em janeiro de 2011.
Ainda nos primeiros meses daquele ano, a comandante do Executivo promoveu verdadeira cruzada contra os juros altos. A queda da Selic, então, passou a ser uma das principais bandeiras de governo. “Deu no que deu. O BC cortou juros para garantir essa bandeira da presidente Dilma, e com isso a inflação só subiu”, disse o economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor de Assuntos Internacionais do BC.
Em agosto de 2011 o Copom decidiu pelo corte em 0,5 ponto percentual na Selic, então em 12,5% ao ano. Na ocasião, o BC, já comandado por Tombini, justificou a medida como uma forma de preparar o Brasil para uma nova onda de turbulência internacional provocada por um novo capítulo da crise econômica mundial de 2008. Naquele ano, o IPCA bateu no teto da meta perseguida pelo governo, 6,5% ao ano, e, por pouco, Tombini não teve de se explicar publicamente pelo descumprimento da meta.
Alimento sustenta apetite do dragão
Brasília – A escalada dos preços de alimentos in natura, como verduras, hortaliças e leguminosas, roubaram o lugar antes ocupado exclusivamente pelo tomate como o vilão da vez da inflação no país. Durante audiência com parlamentares da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, ontem, o presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, disse que a alta variação dos índices de preços contribui para que a inflação ainda mostre “resistência”. Também chamou a atenção para o fato de os índices estarem “ligeiramente acima do que se antecipava” e lembrou que parte dessa surpresa negativa se deve aos itens que vêm do campo. “Somem-se a isso pressões localizadas que ora se manifestam especialmente no segmento de alimentos in natura”, disse.
“A seca afetou os grãos, depois veio a chuva e afetou os hortifrutis. Esses choques, por definição, são temporários”, mencionou Tombini. A fala foi mal recebida pelo ex-diretor de Assuntos Internacionais do BC, Alexandre Schwartsman. “Jogar a culpa da inflação alta no clima é a salvação da lavoura para esse governo”, disse. “O curioso é que, ano passado, mesmo com o os preços no campo caindo, a inflação ficou distante da meta”, completou.
Em 2013, o Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA) registrou queda de 1,76%. No mesmo ano, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o parâmetro utilizado pelo governo para medir a inflação no país, acumulou variação de 5,91%, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A meta perseguida pelo BC é 4,5% ao ano, com tolerância de dois pontos para baixo ou para cima.
Temporário Parte dos analistas de mercado gostou da fala de Tombini sobre a pressão dos alimentos sobre a inflação. O ponto que mais agradou foi Tombini citar que o choque sobre os preços é, “em princípio, temporário e que tende a se reverter nos próximos meses”. Operadores de grandes bancos interpretaram a fala como um sinal de que, para a autoridade monetária, a pressão sobre os preços pode se dissipar nos próximos meses.
Esse grupo de analistas acredita, com isso, que o Comitê de Política Monetária (Copom) promoverá apenas mais uma elevação de 0,25 ponto nos juros básicos da economia, na reunião marcada para abril, e encerrará o ciclo de ajuste na Selic iniciado no mesmo mês de 2013. A avaliação é baseada também em trecho da fala de Tombini, onde ele avisa que a política monetária deve se manter “especialmente vigilante”, visando garantir que os efeitos desse choque se restrinjam ao curto prazo.
As apostas de que a taxa Selic passará dos atuais 10,75% para 11% até o fim do ano dominaram o mercado de juros futuros de ontem. A maior parte dos contratos financeiros negociados na bolsa de valores tiveram leve alta. O título com vencimento em janeiro de 2015, um dos mais negociados, fechou em 11,17%, ante 11,15% no pregão de segunda-feira. (DB)