Brasília - A eletricidade vendida aos brasileiros alcançou, desde janeiro, o custo médio mais caro da sua história, além de embutir o uso recorde de fontes campeãs em poluição atmosférica, como óleo diesel e carvão mineral. A crise estrutural do sistema elétrico, desencadeada pela escassez de chuvas nas regiões onde estão localizados reservatórios de hidrelétricas no começo do ano e pelos atrasos em investimentos de geração e de transmissão, resultará em um pesado reajuste nas contas de luz em 2015.
Mas esse quadro agravado pela perspectiva de racionamento no segundo semestre já rendeu lucros fartos aos donos de usinas termelétricas. Entre eles estão empresas indiretamente controladas por clãs políticos regionais aliados do governo federal e empresário como Eike Batista, que, mesmo após o colapso de seu grupo EBX, continua sócio da companhia de geração térmica Renova, ex-MPX.
A razão disso é que o pior regime hidrológico para os meses de janeiro e fevereiro em seis décadas, aliado ao crescimento contínuo da demanda, sobretudo a residencial, baixou os níveis das represas de usinas críticos, iguais e até piores aos de 2001, ano do racionamento. A única saída é recorrer ao parque térmico, com capacidade atual de 28,3 mil megawatts (MW). Resultado: a energia gerada pelas termelétricas já corresponde 20% do consumo elétrico nacional.
Segundo relatórios do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), enquanto a participação das hidrelétricas recuou de 91,2% para 79,2%, de 2011 a 2013, a produção das térmicas cresceu de 8,4% para 19,8% no mesmo período. "A verdade é que o Brasil está cada vez mais dependente das termelétricas, colocando em xeque o discurso ufanista do governo de maior matriz limpa do planeta", provocou o consultor Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infraestrutura (Cbie).
Em oito anos, a geração de energia no país por combustíveis fósseis, biomassa e reatores nucleares, saltou 662%, conforme dados do ONS. Nos primeiros dois meses de 2006, a geração termelétrica era de 2.575 MW médios e, mês passado, ela já tinha passado de 19.624 MW. Dos 51 mil MW de potência agregada ao sistema interligado nacional nos últimos 13 anos, 48% são provenientes de termelétricas.
Apesar desse avanço, Cláudio Sales, presidente do Instituto Acende Brasil, aponta erros do perfil de usinas empregadas no parque termelétrico nacional, inadequadas para o momento e para as projeções futuras de demanda. Considerando a tendência de crescente acionamento, ele sugere que os novos projetos de geração térmica sejam mais robustos, mas com custos finais mais baixos. "Atualmente, cerca de metade das usinas são de baixo investimento inicial, mas despesa operacional mais cara. Essa situação obriga à ligação de cada vez mais unidades", resume.
Para piorar, essa mesma eletricidade mais cara e poluente — óleo diesel à frente nos dois sentidos —é também a mais disponível para cobrir a demanda sem cobertura de contratos de longo prazo, situação que levou o preço médio no curto prazo bater no teto histórico de R$ 822,83 o MW médio. Por outro lado, o custo operacional das térmicas está estimado em R$ 1,3 mil o MW médio. Enquanto as hidrelétricas geram um MW hora a R$ 30 em média, o mesmo custo para as termelétricas é de R$ 200 e chega a bater em R$ 500. Contudo, para 42% delas, o custo médio passa de R$ 200.