Nivaldo Souza, 28 - O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) terminou nesta quarta-feira, 28, o julgamento do cartel das cimenteiras, que durante décadas controlou o preço de um dos principais insumos da construção civil no País e deu prejuízo de R$ 1 bilhão aos consumidores brasileiros. Por sugestão do último integrante a votar, Márcio de Oliveira Júnior, o tribunal da concorrência endureceu as penas ao grupo de empresas que participou do conluio.
Segundo o voto de Oliveira Júnior, as empresas Votorantim Cimentos, Holcim do Brasil, Intercement (antiga Camargo Corrêa Cimentos), Cimpor Cimentos do Brasil, Itabira Agro Industrial e Companhia de Cimento Itambé deveriam vender 20% de sua capacidade de produção instalada, se desfazer de participações minoritárias em outras companhias do setor, não poderiam contratar financiamentos de bancos públicos e seriam excluídas de programas de refinanciamento de débitos tributários, como o Refis.
"As perdas (das empresas) deveriam ser superiores ao que deveriam ganhar, mas a verdade é que o dano é muito mais alto do que as sanções aplicadas", afirmou o conselheiro. "As multas representam parcela pequena do faturamento de todo o grupo."
No início do ano, a maioria do Cade já havia concluído pela existência do cartel, uma prática ilegal de combinação de preços e limitação da concorrência. De acordo com o conselho, as empresas combinavam os preços de cimento e concreto de acordo com cada região do País e as demandas dos integrantes em cada mercado. Por isso, o relator do caso, Alessandro Octaviani, propôs uma multa de R$ 3,1 bilhões às empresas.
Entre as práticas identificadas pelo governo, constava a definição de preço do saco de 50 quilos de cimento para controlar o valor repassado ao produto a granel vendido para as concreteiras, maiores compradoras do mercado. Com o passar do tempo, as empresas do cartel também adquiriram cimenteiras, para depois revendê-las. Além disso, houve comprovação de que o grupo obteve a maioria dos votos no comitê de cimento da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), moldando as regras do setor à sua vontade.
"Ética"
Em seu voto, o conselheiro Oliveira Júnior considerou ilegal o código de ética da Associação Brasileira das Empresas de Serviços de Concretagem (Abesc), da qual as empresas do cartel participavam. A associação defende uma integração do setor para fortalecimento e alavancagem das ações das empresas integrantes da entidade.
Na avaliação do último conselheiro do Cade a votar, a Votorantim agia na liderança do cartel, organizando e fazendo cumprir os acordos firmados no âmbito do grupo, em parceria com a Holcim. "A Votorantim captava dados para monitorar a participação de mercado para analisar o cumprimento do acordo", assinalou. "A Votorantim exercia importante papel na tecnologia do cartel, monitorando a construção de preços."
O ex-executivo da Votorantim, Anor Pinto Felipe, foi apontado como responsável pela fiscalização do cartel. Ele cuidaria da padronização das ações e deveria se "certificar que outros membros do cartel não deserdariam", segundo Oliveira Júnior. "O senhor Karl Bühler (da Holcim) participou ativamente de diversas medidas contra a ordem econômica e estava diretamente envolvido na formação do cartel."
Punições
Ao justificar as punições mais duras propostas para o cartel das cimenteiras, o conselheiro do Cade afirmou que as empresas "viveram um longo período de abusos", que moldou o mercado brasileiro de cimento. Por isso, seria importante o "reforço estrutural" representado pela venda de ativos.
O cartel funcionava com base em manuais de conduta para controlar preço, barrar a entrada de novos agentes no mercado e controlar o mercado de concreto. "O presente caso traz diversas provas que comprovam a formação de cartel", disse o conselheiro. "Um cartel clássico como o de cimento não podia deixar de ter regras sobre a fixação de preço."