O Ministério Público Federal (MPF) moveu uma ação civil pública contra a mineradora canadense Kinross Brasil, que atua em Paracatu, na região Noroeste de Minas, por danos causados ao patrimônio público e ao meio ambiente na extração ilegal de prata. Segundo o MPF, entre 1998 e 2010, a empresa extraiu e comercializou, sem a autorização do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), 42 toneladas do minério no local, com um prejuízo total de R$ 57,2 milhões para a União. Além disso, nesse período, e mesmo depois de obter a licença para a exploração, em 2010, a empresa trabalhou sem licença ambiental, sustenta o procurador da República, José Ricardo Teixeira Alves. O MPF também vai pedir à Justiça a suspensão das atividades da Kinross até a apresentação do licenciamento ambiental para a extração da prata.
Segundo Alves, a Kinross responde por todo o prejuízo gerado pela exploração clandestina, inclusive o relativo às atividades de sua antecessora, a Rio Paracatu Mineração. “Na sucessão empresarial, houve apenas alteração na denominação da companhia, mas a empresa permaneceu a mesma, inclusive com o mesmo CNPJ”, justifica o MPF. Na ação, o órgão relata que a Rio Paracatu conseguiu autorização para extração do minério de ouro em 1985, segundo a Portaria de Lavra nº 1.186, do Ministério das Minas e Energia (MME). Naquele mesmo ano, protocolou pedido de extensão dessa portaria para a exploração do minério de prata. “Mas o ministério nem chegou a analisar o requerimento”, afirma o MPF.
Mesmo sem a autorização, a empresa iniciou a extração de prata, comercializando o minério clandestinamente, diz o Ministério Público. Só em 2010, mais de duas décadas depois, o pedido para a extração e aproveitamento da prata foi concedido pelo DNPM. A ação defende que a Kinross “gerou dano ao patrimônio público, já que extraiu recurso mineral e explorou matéria-prima pertencente à União sem autorização, causando desequilíbrio ambiental e danos ao patrimônio natural no local da lavra”.
Para José Ricardo Alves, a companhia cometeu dois tipos de delito: crime patrimonial e contra o meio ambiente. “Para explorar a prata, a empresa deveria ter pedido o licenciamento aos órgãos ambientais. Até agora, a licença que possui vale só para o minério ouro”, observa. O procurador explica que a licença da empresa canadense só vai até a fase de produção do bullion, uma massa de minério que traz em seu bojo ouro, prata, cobre e chumbo. “Esse bullion pode conter de 65% a 75% de ouro e entre 15% e 25% de prata. É um volume muito grande que precisa ser licenciado”, justifica.
A ação também pede que a Kinross seja condenada por dano moral coletivo. O MPF requisitou, ainda, a instauração de inquérito policial para apurar quais foram os diretores da Kinross responsáveis pelas condutas criminosas e se eles agiram de forma dolosa. A conduta do DNPM também será investigada.
Em nota, a Kinross Brasil informou que a presença de prata como subproduto da produção de ouro foi relatada nos relatórios anuais de lavra e nos Planos de Aproveitamento Econômico desde o início de suas atividades. Diz ainda que possui “licença ambiental para realizar lavra a céu aberto com tratamento a úmido - minerais metálicos, exceto minério de ferro, que inclui a produção do ouro e de seu subproduto prata”.
Complexo questionado
Primeira iniciativa de desenvolvimento da mineração no Norte de Minas Gerais, região considerada a nova fronteira de extração de minério de ferro no estado, o projeto Vale do Rio Pardo, conduzido pela Sul Americana de Metais (SAM) é questionado na Justiça Federal. O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) pediu liminar suspensiva do licenciamento ambiental do empreendimento, que contempla mina e mineroduto ligando o município mineiro de Grão Mogol a Ilhéus, na Bahia. A empresa firmou em julho de 2012 com o governo mineiro protocolo de intenções de investimentos de US$ 3 bilhões.
Autor da ação civil pública apresentada ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Belo Horizonte, o promotor Carlos Eduardo Ferreira Pinto, coordenador geral das promotorias de Justiça por Bacias Hidrográficas do MPMG, avaliou que o projeto foi modificado, passando a abranger área diferente daquela descrita na proposta original sem contemplar as novas dimensões no Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (Eia/Rima). Ele considerou, ainda, que houve fracionamento premeditado do licenciamento, em prejuízo do controle dos impactos ambientais do complexo minerário.
O juiz federal Itelmar Raydan Evangelista, titular da 20ª Vara Federal, determinou que a SAM e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) sejam ouvidos para depois avaliar o pedido de liminar. A mineradora confirmou ontem ter sido notificada pela Justiça e que seu departamento jurídico prepara a defesa a ser apresentada. Em nota, a empresa informou, ainda, “que está seguindo rigorosamente todos os procedimentos ambientais legais no licenciamento que está sendo analisado pelo órgão ambiental”. Cabe ao Ibama parte da autorização tendo em vista a construção do mineroduto cortando dois estados.
Segundo o promotor Carlos Eduardo Ferreira, o projeto Vale do Rio Pardo tende a se tornar uma referência importante para a atividade de mineração no Norte de Minas, onde há ocorrência de jazidas de ferro inseridas na Bacia do Alto Jequitinhonha, abrangendo as cidades de Grão Mogol, Riacho dos Machados, Serranópolis de Minas, Fruta de Leite, Padre Carvalho, Novorizonte, Taiobeiras e Rio Pardo de Minas. Ele afirma que a expectativa otimista da região com o desenvolvimento da atividade mineral pode gerar uma degradação ambiental com consequências negativas e irreversíveis para importantes ativos ambientais.
“Ademais, o atual contexto favorece a correta gestão ambiental, preventiva e planejada, uma vez que ainda não foi implantado o empreendimento minerário da SAM, bem como os outros vários, de responsabilidade de outras mineradoras na mesma região, os quais encontram-se, em sua maioria, em fase de pesquisa mineral”, diz o promotor do Ministério Público de Minas. A SAM sustenta que o projeto “em síntese permanece o mesmo”. Mudou a perspectiva de vida útil da exploração para 29 anos em lugar dos 25 anos anteriores.