Desde que Pedro Álvares Cabral desembarcou no Brasil e se impressionou com a costa do Atlântico, o escambo é praticado em solo nacional. Sem qualquer referência de moedas da sociedade europeia, os índios eram bons nesse negócio, praticando a troca em larga escala. Mais de 500 anos depois, empresas de grande porte, com complexa declaração fiscal de movimentação financeira, até pequenos prestadores de serviços se rendem a atividade ancestral, mas não é só por aqui que as permutas estão movimentando milhões. Segundo dados da organização americana Internactional Reciprocal Trade Association (IRTA), no mundo, mais de 400 mil empresas estão ligadas a esse modelo comercial e giram valores que superam a marca dos US$ 12 bilhões.
No Brasil, a troca, muito utilizada por pequenos produtores e prestadores de serviços, também ganhou adesão de grandes redes. Fundado há dois anos em Belo Horizonte, o Clube de Permuta, que associa várias empresas em um grupo fechado para fazer trocas entre si, foi criado pelos empresários Leonardo Bortoletto e Paulo César Alckmin. Com recursos próprios, eles investiram R$ 600 mil no desenvolvimento do sistema alimentado pela moeda Permutz. Conseguiram reaver o investimento em oito meses. O atrativo do negócio é que todas as transações comerciais são realizadas on-line e não precisam ocorrer entre apenas dois sócios. Ou seja João S/A pode trocar com Maria Ltda; que pode trocar com Pedro Associados. “Essa triangulação é possível no clube. A troca não precisa ser apenas bilateral”, explica Bortoletto.
Em dois anos o Clube de Permuta reúne 95 empresas de médio e grande porte. De escritório de advocacia, agências de publicidade a joalherias, são muitos os segmentos que aderiram à prática de trocar produtos e serviços sem haver repasses em dinheiro. A expectativa, neste ano, é de que sejam movimentados R$ 20 milhões em permutas, representando crescimento de 17% frente a 2013.
A permuta, como explica Flávio Costa, consultor tributário da Baker Tilly Brasil em Minas Gerais, é uma operação mercantil tradicional, reconhecida pela Receita Federal. “Na permuta existem valores. Só não há transferência de moeda”, explica o consultor. Segundo ele, um dos benefícios dessa prática comercial é que produtos e serviços podem ser adquiridos sem que a empresa precise movimentar seu fluxo de caixa.
O especialista alerta para o fato de que, como em toda operação comercial, é preciso haver o lançamento de notas e declaração fiscal das transações. “Caso isso não ocorra, a empresa pode ser autuada pela Receita Federal.” De acordo com o especialista, a troca não tem limites de tamanho e pode ser praticada entre microempreendedores e até pelas empresas de grande porte. “Um professor pode trocar serviços com um médico ou dentista, por exemplo. Essa operação, se dedutível, deve ser lançada normalmente no Imposto de Renda.”
Microempreendedor individual no setor de reformas, Edvaldo Alves não gira grandes valores, mas também não perde oportunidades. “A permuta ajuda a facilitar as negociações. Às vezes o cliente acha caro o serviço, mas tem alguma coisa que pode trocar e baratear o custo”, afirma. Edvaldo conta que não faz restrições. Trabalha em toda a cidade recebendo pelo serviço em dinheiro ou em produtos que ele mesmo anuncia e vende. Pintor experiente e com agenda cheia, ele usa o sistema há muito tempo para não perder o cliente. Ele troca seus serviços por móveis, eletrodomésticos ou por outros serviços.
Limite de crédito Em Belo Horizonte, para fazer parte do Clube de Permuta a empresa tem que ser aprovada em uma análise que avalia sua demanda anual por trocas e também a demanda do grupo participante pelos produtos e serviços que a candidata oferece. No grupo, há também um limite de crédito que pode ser negociado por ano. Para ingressar, a empresa deve disponibilizar valor mínimo equivalente a R$ 100 mil . “Já tivemos crédito que atingiu R$ 4 milhões”, conta Leonardo Bortoletto. A moeda real aparece somente no momento de remuneração ao clube, equivalente a 10% do valor das transações. “Também utilizamos o internet banking, que assegura o limite de crédito para as transações”, afirma.
Flávio Costa destaca um atrativo do clube, tendo em vista que quanto menor o custo de produção maior tende a ser o lucro obtido com as trocas, sem a necessidade de investimento financeiro. “Se uma empresa produz por R$ 10 e vende por R$ 30, na permuta, ela consegue auferir o valor de mercado, movimenta o estoque e não tem fluxo de caixa”, observa.