Brasília – O Banco Central (BC) traçou um cenário preocupante para a economia. No último ano do governo Dilma Rousseff, o país continuará a registrar fraco desempenho do Produto Interno Bruto (PIB), que seguirá em marcha lenta. Enquanto isso, a escalada da inflação, que há quatro anos não dá sossego às famílias, continuará em ritmo acelerado. Não por acaso, a autoridade monetária revisou ontem as projeções para ambos os indicadores.
Agora, em vez de 2%, a expansão da economia é estimada em só 1,6%. O custo de vida, anteriormente projetado em 6,1%, subiu, por sua vez, para 6,4% em dezembro. Pior do que isso. Até o terceiro trimestre, às vésperas das eleições presidenciais, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) deverá romper o teto da meta, de 6,5% ao ano, chegando a 6,6%, conforme projeções do próprio BC. Mesmo após o resultado das urnas, a carestia continuará pesada.
A autoridade monetária reconheceu que cresceram os riscos de a inflação romper o teto da meta em dezembro, o que não ocorre desde 2003. Neste caso, o presidente do BC, Alexandre Tombini, teria de escrever uma carta ao ministro da Fazenda, Guido Mantega, explicando os motivos pelos quais não conseguiu cumprir nem sequer a margem de tolerância, de dois pontos acima do centro da meta, de 4,5%. Em março, a probabilidade de estouro da meta era de 38%. Agora, subiu para 46%, conforme projeções do mais recente relatório trimestral de inflação, divulgado ontem.
O documento antecipa um quadro de inflação resistente para os próximos trimestres, mas avalia que, mantidas as condições atuais da economia, com sinais claros de estagnação, os preços de mercadorias e serviços tendem a caminhar para o centro da meta em até dois anos. Para isso, o BC avalia que a elevação da taxa básica de juros (Selic), que durante um ano saltou de 7,25% para 11% ao ano, tende a produzir impactos defasados sobre a inflação nos próximos meses.
“Gostaria de lembrar que a Selic subiu 3,75 pontos percentuais (até maio). Isto é, sem dúvida, um ajuste monetário importante”, disse ontem o diretor de Política Econômica do BC, Carlos Hamilton Araújo. Para ele, a taxa “primeiro alcança a produção e depois a inflação”. Assim, o baixo crescimento do PIB, que tanto tem desanimado empresários e famílias, é apontado como arma para combater a inflação elevada. “As evidências apontam que o hiato do produto (da economia) está se deslocando nessa direção desinflacionária”, emendou Araújo. Traduzindo: quanto menos pessoas consumirem, mais os preços tendem a cair, para se ajustar à demanda mais fraca.
Reação do mercado Essa avaliação foi entendida pelo mercado financeiro como sinalização de que o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC deixará os juros inalterados por um bom tempo, entendendo que o atual patamar da Selic é suficiente para puxar os preços para baixo. “Na visão do Copom, a inflação converge em direção à meta”, escreveram os economistas Ilan Goldfajn e Luka Barbosa, do Itaú Unibanco, em relatório a clientes.
A grande questão, aponta o diretor do Grupo de Pesquisas Econômicas para a América Latina do banco norte-americano Goldman Sachs, Alberto Ramos, é se a autoridade monetária será ou não bem-sucedida nessa aposta. “O BC está esperançoso ao acreditar que os efeitos defasados dos recentes aumentos da Selic, além da desaceleração econômica, serão suficientes para levar a inflação ao centro da meta”, disse. “Ao nosso ver, esse otimismo parece não encontrar respaldo nas projeções mais elevadas para a inflação, que permanecem enraizadas acima do centro da meta e por lá deverão ficar pelo menos os próximos dois anos”, completou.
Aposta ousada Uma prova de que o BC pode ter colocado todas as fichas numa aposta de alto risco é que, mesmo nos cenários de referência em que se ampara, o centro da meta de inflação nem sequer é alcançado. Levando em consideração a manutenção do quadro atual da economia, com juros e dólar inalterados, os cálculos do BC apontam para uma elevação do IPCA de 5,1% ao ano em junho de 2016. Ou seja, nem no melhor cenário traçado o BC diz acreditar que a inflação cairá para o centro da meta de 4,5%. (Com Rosana Hessel)
Greve afeta desemprego
Brasília – Apesar de o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) tentar botar panos quentes nos efeitos gerados pela paralisação de seus servidores, a greve mostrou força ontem durante a divulgação da Pesquisa Mensal de Emprego (PME). O indicador, que analisa mensalmente a taxa de desocupação de seis regiões metropolitanas, só publicou o resultado de quatro delas. Os números de Salvador estão sendo apurados e em Porto Alegre os dados nem sequer terminaram de ser coletados. A paralisação dos servidores deve atingir também a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua).
“A Pnad Contínua está com problemas em alguns estados. Na Paraíba e no Amapá, por exemplo, a coleta está muito prejudicada. Então, pode ser que tenhamos atraso, dependendo da data de divulgação”, afirmou o coordenador de trabalho e rendimento do IBGE, Cimar Azeredo. A assessoria de imprensa do instituto afirmou que não há informação sobre nenhum outro indicador afetado pela paralisação e garante que a divulgação do Índice de Preços ao Produtor (IPP), hoje, e da Pesquisa Industrial Mensal/ Produção Física, na próxima semana, estão mantidas.
E o imbróglio não tem data para acabar. Segundo o IBGE, houve uma reunião entre o sindicato e a direção do instituto no último dia 10 de junho e não há nenhum outro encontro previsto. Segundo a assessoria de imprensa da Associação dos Servidores do IBGE (AssIBGE), houve uma mesa de negociação com o Ministério do Planejamento em Brasília, mas não há avanços. Apesar disso, o secretário de Relações do Trabalho, Sérgio Mendonça, teria se comprometido a levar as reivindicações à ministra da pasta, já que o instituto está vinculado ao Ministério do Planejamento.
Índices A taxa de desemprego em São Paulo, região metropolitana com maior peso na pesquisa, ficou em 5,1% em maio, ante 5,2% em abril. No Rio de Janeiro, a taxa foi de 3,4% em maio, ante 3,5% em abril. Em Belo Horizonte, a taxa de desocupação passou de 3,6% em abril para 3,8% em maio. No Recife, a taxa saiu de 6,3% em abril para 7,2% em maio. Em relação ao mesmo mês de 2013, o índice declinou 1,8 ponto percentual no Rio de Janeiro e 1,2 p.p em São Paulo. Em Recife e Belo Horizonte o indicador se manteve estável.