Itamarandiba – Seguindo cursos de rios em embarcações de madeira e abrindo picadas com facões, a tropa de Fernão Dias chegou a um vale, hoje batizado de Jequitinhonha, onde encontrou uma lagoa com águas esverdeadas. A cor era causada por pedras, que pareciam brotar no espelho d’água. A euforia daqueles homens foi grande: a coluna, sete anos depois de sair da Vila de Piratininga, atual São Paulo, havia encontrado a Vupabuçu! O explorador encheu a bolsa de couro com as pepitas e começou a retornar ao Sumidouro, hoje Pedro Leopoldo, na Grande BH.
Fernão Dias, porém, morreu antes de chegar à choupana. O local de sua morte é um mistério. Há quem diga que foi no encontro do Rio São Francisco com o das Velhas, onde há uma igreja de pedra inacabada. O lugar hoje é Barra do Guaicuí, distrito de Várzea da Palma, no Norte de Minas. O bandeirante perdeu a vida sem saber que as pedras verdes, na verdade, eram turmalinas, gemas com valor inferior ao das esmeraldas. Mas sua jornada no Jequitinhonha não foi em vão. O caçador de esmeraldas fundou povoados na região, ajudando a colonizar uma das áreas mais carentes do país, porém, rica em cultura.
Um dos povoados levantados pela bandeira recebeu o nome de São João Batista. Agora é Itamarandiba, com cerca de 35 mil moradores. Lá é conhecido como a capital brasileira do eucalipto. Também é o maior produtor de mel do estado, voltado para a exportação. Já outra cidade que surgiu em razão da coluna tem apenas 5 mil habitantes. Trata-se de Itacambira, onde 80% da população mora na área rural. A contribuição da coluna para o povoamento no Vale do Jequitinhonha é o tema da última reportagem da série A origem das Minas Gerais, que o EM começou a publicar na segunda-feira em razão dos 340 anos da bandeira do caçador de esmeraldas.
A Associação Comercial, Industrial e Agropecuária de Itamarandiba (Aciai) estima que o plantio de eucaliptos ocupe em torno de 80 mil hectares – o correspondente a 30% da área total do município. A entidade destaca que o setor responde por mais de 60% dos empregos gerados na cidade. A monocultura começou a se expandir na região na década de 1970, com os plantios da Acesita Energética (atual Aperam Bioenergia), que detém cerca de 30 mil hectares dos reflorestamentos em Itamarandiba.
O gerente da Aciai, Márcio Nunes, lembra que os plantios de eucaliptos eram feitos por grandes empresas com o objetivo de produzir carvão para a fabricação de ferro-gusa pelas siderúrgicas. Com o passar do tempo, houve incremento do uso da madeira, aproveitada cada vez mais em cercas, currais, telhados e em outras obras de construção civil, além da fabricação de móveis, substituindo as espécies de florestas nativas, que hoje corresponde a 40% com tendência de aumento.
Outro aspecto ressaltado por ele é que a silvicultura se expandiu tanto que muitas áreas antes ocupadas pelo café foram invadidas pelos eucaliptos. “A questão é que houve uma grande melhoria na qualidade das mudas, possibilitando a cultura voltada somente para a produção de madeira. Aconteceu uma melhoria na condução das florestas e o lucro dos produtores aumentou”, observa Márcio. Na cidade, há cerca de 20 empresas que comercializam madeira e três usinas de tratamento de eucalipto. Outras três estão sendo instaladas.
Caveira
Os tempos das bandeiras são lembrados em Itacambira pela existência de crânios mantidos no porão da matriz de Santo Antônio. Fernão Dias denomina a única escola estadual da cidade, que conta com 600 alunos do fundamental e médio. “Itacambira ficou parada no tempo por causa da sua localização, numa região de difícil acesso. O lugar ficou fora da rota da Estrada Real”, lamenta o historiador e escritor Dario Teixeira Cotrim, do Instituto Histórico de Montes Claros.
Ele conta que Fernão Dias enfrentou um motim e enforcou um rebelde. O bandeirante, segundo o historiador, ameaçou mais mortes caso ocorresse outro levante. A tropa, contudo, lhe jurou fidelidade. Daí nasceu o nome Juramento, cidade fundada na região e que hoje tem 3,2 mil habitantes. Dono de um açougue em Itacambira, José Pacheco, de 95, lembra que não faz muito tempo, a cidade era apenas um conjunto de casas ao redor da matriz. “Tinha a igreja, mas praticamente não tinha comércio”, afirma, lembrando da época que o pessoal da roça viajava até o arraial para vender cargas de rapadura, feijão, farinha e milho, transportadas em cavalos, burros e mulas.