Brasília – A indústria brasileira parece afundar cada vez mais no atoleiro. Já são quatro meses consecutivos em que a produção nas fábricas só encolhe, refletindo a escassez de pedidos dos lojistas e o colapso de confiança que abarca tanto empresários quanto consumidores. O baque maior foi sentido em junho, quando a produção retraiu-se 1,4%, o pior resultado desde dezembro passado. Na comparação com o mesmo mês de 2013, o tombo foi ainda maior: 6,9%, o mais baixo desempenho desde setembro de 2009, ano em que o país ainda tentava vencer a primeira fase da crise econômica mundial.
Ao olhar atentamente os números da indústria, o ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central Alexandre Schwartsman chegou a uma conclusão estarrecedora: mesmo com toda a ajuda dada pelo governo ao setor nos últimos anos, ao desonerar a folha de pagamento dos trabalhadores e cortar tributos como o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para a compra de carros, geladeiras e móveis, a indústria só afundou desde então. Nos últimos 12 meses até maio, o nível de produção nas fábricas ficou 1% abaixo do patamar registrado em 2010, o último ano do governo Lula.
Schwartsman lembra que, no mesmo período, a produção industrial global cresceu 10%. Não por outro motivo, decreta: “A história que o governo está tentando vender é que o mau momento da indústria é culpa do baixo crescimento global. Não é verdade”. O economista Rogério César de Souza, do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), disse que se os resultados do setor continuarem piorando, 2014 só será melhor para a indústria do que um único ano: 2009.
Naquele ano, sem a ajuda dos motores das fábricas e o consumo das famílias em marcha lenta, o Produto Interno Bruto (PIB) encolheu 0,3%. Em bom português, significa dizer que o país mergulhou numa recessão, com reflexos sobre o emprego e a renda dos trabalhadores. Este ano, meia década depois da crise, a palavra recessão ainda volta a atormentar empresários e, principalmente, o governo. “Nada indica que a indústria consiga no segundo semestre reverter o resultado negativo do primeiro semestre. Isso não vai acontecer. Ou seja, a indústria vai fechar com queda”, disse Souza.
O receio do Palácio do Planalto é que o colapso que se instalou no setor industrial avance também para o varejo e a agricultura, sepultando, de vez, o desempenho do PIB no último ano do governo Dilma Rousseff. Não por acaso, o governo tem tentado convencer empresários e investidores de que, se o primeiro semestre foi ruim, os últimos seis meses do ano serão melhores.
Mais chances O discurso oficial é que o restante do ano terá mais dias úteis que o primeiro semestre, e que, portanto, haverá mais chance de a produção voltar para o campo positivo. Trata-se de uma meia verdade. Serão apenas 10 dias a mais: 130 contra 120 dias. Na verdade, no que depender do efeito calendário, 2014 não será tão diferente de 2013. Mesmo o primeiro semestre teve apenas dois dias úteis a menos do que o mesmo período do ano passado.
Não por outro motivo, até mesmo dentro do governo, há quem duvide que o maior número de dias úteis possa ser determinante para reverter uma tendência de queda da indústria ao longo do ano. “Isso por si só não garante o aumento da produção”, disse André Macedo, gerente da pesquisa industrial do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). “A questão dos dias úteis entra num contexto para justificar a maior intensidade do crescimento ou maior intensidade da queda. Exatamente como ocorreu em junho”, emendou o técnico.
A afirmação desmonta o discurso dado pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, que, em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo, atribuiu os maus resultados da economia ao menor número de dias úteis. A justificativa dada pelo ministro, e que tem sido reforçada por seus assessores, é que os feriados decretados nas cidades que receberam jogos do torneio e os dias de expediente reduzido por causa dos confrontos da Seleção Brasileira foram determinantes para jogar por terra a produção no mês.
Não é o que pensa André Macedo, do IBGE. “Não é a Copa que dá o viés negativo. Esse movimento de queda já acontece há quatro meses na indústria. O que ocorreu em junho foi uma maior magnitude das perdas, o que pode, aí sim, ter sido afetado pela Copa”, observou. Os dados dão razão ao especialista. Em junho, 18 dos 24 ramos pesquisados registraram queda na produção.
Mesmo se for considerada a média móvel trimestral, indicador que suaviza os resultados de apenas um mês e que serve para observar a tendência de resultados de um setor, há forte desaceleração da indústria desde o fim do ano passado. Entre novembro de 2013 e fevereiro, a média móvel trimestral ficou em campo negativo. Apenas em março ela entrou no azul, com alta de 0,6%. De lá para cá, foram três quedas, todas em intensidade sempre maior que a do mês anterior: 0,4%, em abril; 0,7%, em maio e 0,9% em junho.