É cada vez maior a preocupação da sociedade contemporânea quanto ao bem-estar animal e vegetal nas propriedades rurais. Além de melhor qualidade na produção, as muitas estratégias que visam, por exemplo, diminuir o estresse suíno, começam a fazer parte do dia a dia dos agricultores e pecuaristas. A intenção é proporcionar na agropecuária uma vida digna, que respeite as necessidades comportamentais, fisiológicas, bioquímicas e mentais dos animais e também das plantas. Como resultado, segundo avaliam produtores e especialistas da área, há a viabilidade do crescimento sustentável e agregação de valor econômico, além, é claro, de um produto melhor para o consumidor.
Em 2008, com o objetivo de promover uma maior consciência do assunto entre os produtores e profissionais do manejo e trato na agropecuária, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) criou a Comissão Técnica Permanente de Bem-Estar Animal (CTBEA), que teve suas atribuições atualizadas em 2011. Segundo a pasta, o fomento ao bem-estar animal é essencialmente trabalhar com capacitação e educação, “pois sabe-se que o manejo racional minimiza prejuízos econômicos e melhora a imagem dos produtos obtidos”.
No viés científico, muitos foram os avanços nas áreas da neurociência e etologia, que provam que os animais possuem sensibilidade e sentimentos, o que torna o manejo racional mais importante em termos éticos. Um exemplo disso, segundo a professora de Agronomia da Universidade Unifenas Valéria Vânia Rodrigues, está na suinocultura. Ela conta que, tanto pequenos quanto grandes produtores têm optado por colocar nas maternidades suínas brinquedos e até música para os leitões. “A intenção é manter o ambiente o menos estressante possível. Há objetos como correntes, brinquedos e até saco de ração para que os filhotes possam brincar. A ideia é também estimular a inteligência do animal”, comenta, dizendo que, menos estressado, o filhote cresce com melhor desempenho e, quando é transferido de baia, não deixa de se alimentar.
Geralmente, segundo ela, esse tipo de filhote, ao sair da maternidade, muitas vezes, perde o apetite e come menos, reduzindo, assim, o peso. “Além disso, o estresse leva a patogenias. Pode até parecer bobagem, mas com essas estratégias, eles ficam mais calmos e a carne passa a ter maior qualidade”, destaca Valéria Rodrigues.
Esse olhar cuidadoso está crescendo no setor, conforme observa o diretor de meio ambiente da Associação dos Suinocultores do Estado de Minas Gerais, Manoel Teixeira Lopes. Dono da Fazenda Penalva, em Juiz de Fora, na Zona da Mata, Manoel diz que uma das estratégias para proporcionar bem-estar ao animal está na climatização dos galpões. “Nesses ambientes, não há frio nem calor demais para os leitões, que ficam em quarto com aquecimento que varia de 29 graus a 31 graus. A maternidade fica a 15 graus”, revela, contando que, na sua fazenda, por exemplo, há água e ração de melhor qualidade. Outra estratégia, segundo ele, é a renovação do ar. “Nas últimas décadas, a mão de obra do ramo está mais eficiente. Na hora do transporte para abate, os porcos recebem também uma preparação. Eles saem da baia onde foram criados e vão para uma sala de espera. Ali, só recebem água, pois, se se alimentarem, têm mais propensão a sofrer colapsos”, diz.
Todo o respeito e dignidade aos animais tem trazido resultados para a suinocultura. Segundo Manoel, nos últimos 15 a 20 anos, a média de porcos nascidos por partos era de 10 leitões. “Hoje, já são 14. Não é só a alimentação e a climatização dos ambientes que melhoraram, mas os galpões são, atualmente, maiores, com pé direito mais alto. O investimento acaba valendo a pena, já que o produtor tem maior produtividade e qualidade na carne. Ou seja, quanto maior for o conforto, maior é a produção”, conclui.
INTERFERÊNCIA Mas nem sempre essa teoria vale para todos. É o que alerta o árbitro e gerente do Departamento do Esporte da Associação Brasileira dos Criadores do Cavalo Mangalarga Marchador, Roberto Naves. Segundo ele, a égua costuma parir à noite e debaixo de chuva, inclusive quando há tempestades. “Há pessoas que, pensando no conforto do animal, querem levá-lo para um lugar fechado, como as baias. Essa prática vai contra a natureza do bicho e pode causar uma interferência negativa na hora do parto”, diz.
Roberto dá como outro exemplo, o uso de açúcar na água do cavalo. “São seres com hábitos selvagens e, por isso, digo que colocar música para os animais, por exemplo, pode ser benéfico como pode não ser. Nem todo ser humano gosta de música clássica e o mesmo pode ocorrer com os animais. Nesses casos, sempre é bom pesquisar e ter cautela”, recomenda. No entanto, são visíveis os cuidados com os animais que participam de exposições, que recebem desde tratos especiais para a crina e o pelo até uma dieta totalmente balanceada. A doma racional também é pregada entre os criadores de equinos de elite.
Palavra de especialista
Sandra Gesteira Coelho, professora da disciplina bovino de leite, da Escola de Veterinária da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
Dieta controlada
“A primeira estratégia visando o conforto e o bem-estar dos animais é sempre a alimentação. Com um desequilíbrio nutricional, o bicho fica mais suscetível às doenças. Já aquela dieta balanceada pode aumentar, inclusive, a sua produtividade. A climatização dos ambientes é outro fator importante, uma vez que os efeitos do estresse térmico podem dobrar as exigências nutricionais do animal e, ao trazê-lo para zona de conforto, ele gasta menos energia. O que ‘sobra’ pode ser usado para aumentar a produção de leite, no caso do gado.”