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Estado de Minas

Registros de exploração financeira de idosos quadruplicam entre 2011 e 2013

Com dívidas maiores, taxa de inadimplência dos que têm mais de 85 cresceu 12,12% em agosto


postado em 16/09/2014 06:00 / atualizado em 16/09/2014 07:25

"Muitas vezes, a violência financeira é praticada por quem está próximo, parentes, vizinhos. Além disso, o valor das aposentadorias foi reduzido e a oferta de crédito aumentou, o que fez crescer o endividamento" Robson Bittencourt presidente da Federação de Aposentados e Pensionistas de Minas Gerais (FAP-MG) (foto: Maria Tereza Correia/Estado de Minas - 05/03/2008 )
O endividamento dos maiores de 60 anos não é reflexo apenas do crescimento da oferta do crédito, ou do descontrole com as despesas do mês. Também está maior o peso da exploração financeira dos aposentados. Dados da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH) mostram que em Minas Gerais, em apenas dois anos, a violência financeira contra idosos foi multiplicada por quatro, saltando de 318 denúncias em 2011 para 1.328 registros no ano passado. No primeiro semestre, já são 417 notificações desse tipo de abuso contra o idoso. Minas Gerais é o terceiro estado com maior número de denúncias. No ano passado, a violência financeira representou 43% de todas as queixas envolvendo maiores de 60 anos captadas pelo Disque Direitos Humanos (Disque 100), atrás apenas da violência psicológica e da negligência.

A violência financeira vai desde a utilização indevida da renda do idoso até formas de pressão psicológica para conseguir que ele assuma, por exemplo, empréstimos para terceiros ou para familiares. Mas também envolve fraudes. “Já chegou ao nosso conhecimento caso até mesmo de pessoas que usam o cartão de passagem do idoso em benefício próprio ou que utilizam o cartão de crédito do pai ou do avô de forma errada”, alerta Iuri Moreira, presidente do Conselho Municipal do Idoso, em Belo Horizonte. Ele diz que a vulnerabilidade dos maiores de 60 anos preocupa e se tornou tema de discussão na comissão contra a violência.

As denúncias anônimas captadas pelo Disque 100 em todo o país apontam para um crescimento da pressão sobre a renda do idoso, que muitas vezes é levado a contrair dívidas comprometendo a aposentadoria, o que leva ao endividamento. Segundo dados do Banco Central (BC), em julho, o empréstimo consignado para aposentados e pensionistas do regime geral da Previdência Social somaram R$ 4,1 bilhões, crescimento de 15,5% em 12 meses e de 10% no acumulado do ano. Enquanto isso, o indicador da inadimplência divulgado pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC), referente a agosto, mostra que o termômetro esquentou acima da média do país (5,09%) nas faixas etárias mais avançadas.

Enquanto o calote caiu 5,94% em agosto entre os mais jovens (18 a 24 anos), cresceu 8,31% entre os maiores de 65 anos e foi recorde, 12,12% entre os maiores de 85. “Esse crescimento da inadimplência acima da média entre os maiores de 60 anos é uma tendência observada desde o início da série histórica, em 2010”, diz Marcela Kawauti, economista-chefe do Serviço de Proteção ao Crédito. Segundo ela, o endividamento entre os mais velhos preocupa porque vem mostrando forte crescimento. “Muitos idosos não estão sabendo usar o crédito, emprestam o cartão para o filho, para o neto, comprometendo a aposentadoria, que não é elástica.”

Pela paz


Especialistas apontam que é comum o idoso trocar o financiamento da família pelo sossego em casa. “Às vezes os próprios parentes recebem a aposentadoria, mas não dão a assistência que deveriam ao idoso. Em outros casos é uma opção do próprio aposentado se responsabilizar pelas despesas e ter um bom ambiente familiar”, pondera Iuri Moreira.

Na promotoria de Defesa da Pessoa Idosa e do Deficiente, a promotora Laís Maria Silveira diz que é natural que as denúncias cresçam por meio do Disque 100, já que a demanda reprimida no país era grande. “Esperamos que com o mecanismo a violência comece a cair.” Segundo Laís, a maior parte das denúncias é feita por vizinhos, parentes ou pessoas que presenciam os abusos contra idosos. A promotora esclarece que o Ministério Público tem mecanismos para mover ações civis e criminais, quando o problema não é resolvido com o diálogo.

Quando as denúncias envolvem agentes financeiros, o caminho costuma ser judicial. Já quando envolve familiares ou responsáveis, os acusados são chamados pelo MP e o resultado da investigação, em casos extremos, pode ser até mesmo a transferência do idoso para uma instituição especializada. “Mesmo que um familiar não admita ou enxergue que está praticando uma violência financeira contra um idoso, quando é investigado pelo MP ele consegue perceber que existe alguém de olho no que ele está fazendo. Percebe que está sendo vigiado ou fiscalizado e isso leva a uma retração na conduta.”

Aposentado há um ano, I.F, de 70 anos, conta que continua trabalhando para fazer aumentar a renda da aposentadoria. Em sua casa são sete moradores e ele é o arrimo da família. I.F já recorreu ao empréstimo consignado e está sempre pagando juros do cartão de crédito. Mesmo com filhos adultos, ele diz que seu rendimento é essencial para a família. “Os juros são altos, mas não tem jeito de pagar todas as despesas em dia. A gente sempre atrasa um pouquinho, quem não atrasa?” Ele considera que a sua contribuição é essencial para manter o padrão de vida da família, principalmente na alimentação. “Não sou de comprar coisas para mim não. Gasto mesmo é com as despesas da casa.”

Para quitar as faturas

O pagamento do 13º salário para aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) acaba de injetar R$ 13,9 bilhões na economia do país e R$ 1,5 bilhão em Minas, mas o varejo não espera efeito no consumo. Isso porque a grande maioria vai usar o recurso para saldar dívidas. “O aposentado tem a renda pequena, corroída pela inflação. Essa primeira parte do 13ª ele vai usar para quitar suas dívidas, não para consumir”, prevê Ana Paula Bastos, economista da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL/BH).

Robson Bittencourt presidente da Federação de Aposentados e Pensionistas de Minas Gerais (FAP-MG) observa que a violência financeira, que também pode ser observada no uso da parcela do 13º que eles recebem antecipadamente, é uma bola de neve para o endividamento dos aposentados. “Muitas vezes essa violência é praticada por quem está próximo: filhos, vizinhos.” Ele diz que o endividamento é motivado pela política de reajustes das aposentadorias para aqueles que recebem acima do mínimo. “Não existe recomposição das perdas e o aposentado está empobrecendo. As aposentadorias não tiveram reajuste, mas o crédito aumentou. Muitos são responsáveis ou participam do sustento da casa e por isso recorreram a empréstimos e estão endividados.” (MC)

Sustento


Pesquisa realizada pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) sobre os aposentados e o mercado de consumo revela, entre outros dados, que 50% dos entrevistados gostariam de trabalhar mais, 14% fazem algum bico ou free lance. Para 54% deles, a aposentadoria é o único sustento. Outros 40% disseram que gastam o dinheiro consumindo produtos para terceiros. Os idosos também gostariam de encontrar no mercado produtos mais adequados ao seu perfil, como celulares com teclados e letras grandes.


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