Brasília – Adiar pela segunda vez a divulgação do balanço financeiro do terceiro trimestre custou caro à Petrobras, sobretudo num momento de desvalorização do petróleo e de alta do dólar. As ações da estatal chegaram a despencar ontem 10%, obrigando a Bolsa de Valores de São Paulo (BM&FBovespa) a interromper, temporariamente, os negócios com papéis da companhia. Ao fim do pregão, os papéis ordinários (ON) da petroleira caíram 9,94%, cotados a R$ 8,52, e os preferenciais (PN), 9,2%, a R$ 9,18. Os recibos negociados na Bolsa de Nova York, chamados de ADRs, afundaram 11,25%, cotados a US$ 6,31, e tiveram seu preço-alvo cortado pelo Credit Suisse, de US$ 14 para US$ 7,30.
Tudo conspirou contra a maior empresa brasileira. Além do suspense em torno dos efeitos da corrupção nas demonstrações contábeis, suas ações foram abatidas por mais uma queda no preço do barril de petróleo, cotado a US$ 56, e pela disparada do dólar, que passou de R$ 2,68. O derretimento do valor de mercado da Petrobras puxou a bolsa paulista para baixo. Depois de começar o dia no terreno positivo, fechou com desvalorização de 2,05%, a 47.018 pontos. Foi o quinto tombo em seis pregões, também graças à retração dos preços internacionais de commodities.
A BM&FBovespa explicou que a suspensão nas negociações das ações da Petrobras, com a realização de leilões, é um expediente comum usado quando a queda ou a alta são muito bruscas. Pelo manual de procedimento da bolsa brasileira, cada vez que um ativo sofre oscilação entre 3% e 8,99%, para cima ou para baixo, é realizado um leilão de cinco minutos, prorrogáveis por mais cinco. Se a oscilação passa de 9%, o pregão é de 15 minutos. Foi o que ocorreu ontem, tanto com os papéis preferenciais, quanto com os ordinários da Petrobras. Em 14 de novembro, os ativos da petroleira também ficaram mais de uma hora suspensos, mas o motivo não foi a derrubada nos preços, e sim a divulgação de um fato relevante.
Na avaliação da analista da Concórdia Corretora, Karina Freitas, a nova postergação do balanço, ainda que sem auditoria externa, não dá tranquilidade ao mercado, assim como os números “condensados” que a empresa apresentou na semana passada, quando havia prometido divulgar os dados operacionais e financeiros. A Petrobras também informou que não vai captar recursos no ano que vem e que pretende reduzir o ritmo dos investimentos. “A leitura é dúbia em relação a este afastamento da necessidade de captações em 2015. Pode significar que o balanço auditado vai demorar mais do que se espera”, afirmou Karina.
Quadro ruim
Para o economista-chefe da INVX Global Partners, Eduardo Velho, o recado do mercado, que se desfez em massa das ações da empresa ontem, é muito claro: o efeito líquido da corrupção é negativo e não é pequeno. “A companhia está respondendo a processos judiciais. A queda no barril de petróleo, que é positiva para as importações da empresa, é uma vantagem muito pequena diante da redução na taxa de retorno dos investimentos do pré-sal”, assinalou. Velho lembrou, ainda, que 80% do endividamento da Petrobras é em dólar, e a moeda norte-americana está forçando a barreira dos R$ 2,70. “A empresa perdeu completamente a atratividade num momento em que há expectativa de os Estados Unidos subirem os juros. O investidor está correndo para ativos mais seguros, como os títulos da dívida norte-americana”, resumiu.
As promessas da Petrobras de obter fluxo de caixa positivo em 2015, eliminando a necessidade de captações no próximo ano, também encontram resistência no mercado, em um cenário em que a empresa está ameaçada de ter dívidas cobradas antecipadamente por conta dos adiamentos nas divulgações do balanço. “Isso leva a outro problema. O risco de a dívida da empresa ser bancada pelo Tesouro Nacional, comprometendo ainda mais as contas públicas do país”, observou Silvio Campos Neto, analista da Tendências Consultoria.
Na opinião do diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Adriano Pires, a Petrobras sofre com a maldição do petróleo. “Antes de descobrir o pré-sal, a companhia valia mais do que agora. Toda vez que um país descobre grandes reservas de petróleo e as entrega para uma empresa estatal explorar sofre com a maldição: a invasão dos políticos”, afirmou.
O imobilismo do governo com relação à substituição da diretoria também ajuda na derrocada do valor de mercado da maior empresa brasileira. “Acionistas e investidores esperam por alguma reação. Se nada for feito, a Petrobras, que é uma empresa com reservas provadas e prováveis de mais de US$ 400 bilhões, vai continuar derretendo. Não adianta acender a vela para o doente, tem que levá-lo para o hospital. Mas o governo não está fazendo nada!”, lamentou Pires.
Cenário mina investimento
Brasília – As fortes quedas nos preços internacionais do petróleo acompanhadas da disparada do dólar tornam ainda mais difícil para a Petrobras encontrar saídas para levar adiante o seu arrojado plano de investimentos e superar a sua atual crise financeira. As ações da companhia derretem no ritmo das denúncias de corrupção nos seus negócios e também graças à pressão negativa das baixas cotações do barril de óleo cru. Foi por essa razão que ontem foi um dia particularmente ruim para a estatal, muito endividada em moeda estrangeira, com o dólar batendo em R$ 2,68 e o petróleo negociado em Nova York afundando para US$ 55,91.
Para piorar, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), comandada pela Arábia Saudita, avisou que a produção do cartel não será reduzida mesmo que os preços do barril caiam para até US$ 40. Ficou resolvido também que serão aguardados pelo menos três meses antes de avaliar a chance de um encontro de emergência dos sócios, para decidir sobre um corte nos volumes, o que vem sendo defendido abertamente pela Venezuela. Outro país em dificuldades graças à cotação abaixo de US$ 100 é a Rússia, cuja situação se agravou devido às sanções comerciais impostas pelo Ocidente.
Risco
É nesse contexto adverso que despencam as ações da Petrobras negociadas nas bolsas de São Paulo (BM&FBovespa) e de Nova York e o valor do real. As variações fazem parte de um movimento mundial de venda de ativos de risco, em meio à degradação nas expectativas para o crescimento global e à expectativa de elevação mais cedo dos juros norte-americanos, em 2015. Esse cenário também reforça a tendência de recuo de preços de commodities, sobretudo petróleo, que está no menor piso em cinco anos. No Brasil, pesa ainda negativamente as incertezas sobre a política econômica.
Para o consultor Fernando Henrique Cunha, sócio da FHCunha Soluções Estratégicas, o cenário conspira contra uma longa cadeia industrial voltada para os projetos da Petrobras, particularmente para exploração do pré-sal, da qual é a única operadora. “O navio está sem capitão e o Brasil não pode demorar a explorar o potencial das reservas”, alertou ele, considerando a expectativa de queda do preço do barril no longo prazo e os desdobramentos das investigações da Operação Lava-jato. O petróleo mais barato favorece a Petrobras, à medida que zera a defasagem com a importação de combustíveis. No mercado interno, ela já vende gasolina e diesel com preço acima do mercado externo.