Depois de um ano marcado pela escalada dos juros e pela disparada da inflação, nem mesmo a segunda parcela do 13º salário, que precisa ser paga pelo empregador até o dia 20, deve salvar o Natal do varejo brasileiro em 2014. É o que sugere uma pesquisa divulgada ontem pela Confederação Nacional de Comércio, Bens e Serviços (CNC): o índice de Intenção de Consumo das Famílias (ICF) atingiu em dezembro 119,5 pontos, o menor resultado da série histórica, iniciada em 2010. No confronto com o mesmo período do ano passado, houve recuo de 7,7%. Em relação a novembro, a retração foi de 0,9%.
Em Belo Horizonte, a situação também incomoda bastante os empresários do setor. O Índice de Confiança do Consumidor (ICC), elaborado pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, Administrativas e Contábeis (Ipead-UFMG) e semelhante ao ICF, só será divulgado nas próximas semanas,
“Há forte possibilidade de o ICC de dezembro ser o pior resultado (para o mês nos últimos 10 anos). Para chegar ao resultado de 2013, que foi 46,22 pontos (o então pior número para dezembro desde 2005), o ICC teria de subir 1,8%. Mas o indicador não está falando muito que isso irá ocorrer. Caso suba, não será nada significativo”, lamentou Eduardo Antunes, coordenador de pesquisa da Fundação Ipead.
Os lojistas acompanham o indicador da Fundação Ipead e o da CNC de perto, pois, ao sinalizarem a intenção de compras, ambos orientam a categoria sobre os investimentos em estoque, linhas de crédito, contratação de mão de obra etc. “O tíquete médio do Natal deste ano é de R$ 90. O de 2013 foi de R$ 88. É um valor maior, mas não leva em conta a inflação (no período). O consumidor está presenteando menos. No ano passado, de quatro a sete presentes. Neste, de um a três”, disse Ana Paula Bastos, economista da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL-BH).
Ela, porém, acredita na possibilidade de a segunda parcela do 13º salário impulsionar as vendas para o Natal. Se depender de Jonathan de Souza, de 27 anos, o Natal será de lembrancinhas. Motorista de uma empresa de confecção, com salário em torno de R$ 1,5 mil mensais, ele usou a primeira parcela do 13º, paga em novembro, para saldar dívida. A maior parte da segunda parcela terá o mesmo destino.
“Os gastos com o Natal em 2014 serão menores que os de 2013 lá em casa, estou usando o 13º para quitar dívidas e contas. Neste ano, gastarei menos com presentes para meus dois filhos, pois tudo encareceu e as contas pesaram”, disse, lamentando a disparada dos preços. Em BH, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que mede a inflação oficial, subiu 6,21% entre janeiro e novembro. No Brasil, 6,56%. Os dois resultados estão bem acima do centro da meta estipulado pelo governo federal no início do ano: 4,5%. “É verdade que a economia brasileira melhorou em relação a alguns anos atrás, mas os preços estão nas alturas. Isso é fato. Sobretudo os alimentos”, reclamou o vigilante Antônio Simões, de 33.
Juros
A inflação em alta provoca o aumento no juro, prejudicando o volume de compras parceladas. No início de dezembro, o Banco Central elevou a Selic, a taxa que dita o ritmo do juro no país, para 11,75% ao ano. Em junho de 2013, por exemplo, a Selic estava em 8% ao ano.
O avanço do juro e o da inflação ajudaram a comprometer o orçamento das famílias em todo o país, obrigando muita gente a resgatar dinheiro na caderneta de poupança para pagar contas. De janeiro a novembro, por exemplo, a captação líquida da poupança somou R$ 18,6 bilhões, cifra 70% inferior à comparada ao mesmo período do exercício anterior. Isso ocorreu em razão de as retiradas terem aumentado num ritmo superior ao dos depósitos. Na prática, significa dizer que o brasileiro usou o que poupou no passado para financiar gastos atuais.