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Estado de Minas CIRANDA FINANCEIRA EM NOVO DESENHO?

Operações compromissadas do BC passam de 20% para 29%

Cenário relembra época do overnight, quando a inflação era sem controle


postado em 12/01/2015 06:00 / atualizado em 12/01/2015 07:16

Brasília – A economia brasileira tem ficado cada vez mais parecida com a do passado, e não é só pela crescente carestia que se evidencia nos caixas de supermercado. Operações entre o Banco Central (BC) e instituições financeiras trazem muitas lembranças dos tempos de inflação alta, quando era corriqueiro, para qualquer correntista, falar em overnight, as aplicações em que o dinheiro rendia enquanto todos dormiam.


Num sinal da volta da famosa ciranda financeira, as chamadas operações compromissadas do BC cresceram de 20% do total dos títulos públicos federais no fim de 2013 para 29% em novembro do ano passado, o dado mais recente disponível. Nessas transações, a autoridade monetária vende títulos aos bancos mediante compromisso de recompra em determinado prazo, que pode variar de alguns dias a meses. Quando se observa um período mais longo, o aumento é ainda mais impressionante (veja quadro). Passavam pelo balcão do BC somente 2,3% dos títulos públicos federais no fim de 2005. O aumento de lá para cá, portanto, foi de 1.160%.

Embora essas transações nunca tenham deixado de existir, o problema é a proporção que tomaram. Dos ativos de R$ 2,1 trilhões do BC que constam em seu balancete patrimonial de 30 de novembro passado, R$ 1,03 trilhão é composto de títulos públicos federais, ou 49% do total, uma aberração para padrões internacionais. No Banco Central Europeu, por exemplo, a proporção é de apenas 0,1%. No caso do Federal Reserve, o Fed, autoridade monetária dos Estados Unidos, ela é mais alta, chegando a 3,7%. No Japão, em patamar bem superior, são 10,3%, ainda assim, muito menor do que se vê no Brasil.

O BC explica que atua apenas como agente passivo nas operações. A autoridade monetária precisa evitar que os bancos fiquem com sobra de dinheiro e decidam emprestar com juros baixos, o que derrubaria a Selic para um patamar muito abaixo da meta estabelecida pelo Comitê de Política Monetária (Copom), atualmente em 11,75% anuais. Para evitar que isso aconteça, o BC oferece títulos de sua carteira aos bancos, com compromisso de recompra, garantindo a eles uma remuneração maior do que conseguiriam emprestando dinheiro aos clientes. Nos momentos em que falta liquidez no mercado, o que já não ocorre há muito tempo, o BC faz o contrário: oferece dinheiro mais barato, evitando que as instituições financeiras recorram ao mercado e que a Selic fique acima da meta.

Mas a que se deve o excesso de dinheiro na praça? Para o BC, quem tem de responder a essa pergunta é o Tesouro Nacional, que foi procurado, mas não se pronunciou. Há explicações conjunturais, como as elevadas reservas internacionais, de US$ 374 bilhões — ao vender dólares, os bancos ficam com reais, que precisam ser enxugados. Mas essas razões são insuficientes para justificar o tamanho do problema, sobretudo a evolução recente.

INCERTEZA O fato é que o mercado não tem se sentido atraído pelos títulos do Tesouro. “Há incerteza quanto ao patamar que os juros poderão atingir, pois se espera que continuem subindo”, diz o economista Ricardo Nogueira, superintendente de operações da corretora Souza Barros. Quando se observa a quantidade de títulos atrelados a índices de preços em poder do mercado, essa tendência é clara. De 28,9% do total em dezembro de 2013, eles passaram a 26,4% em novembro de 2014, um movimento de queda com sinal inverso, portanto, ao do que aconteceu com as compromissadas. Para Nogueira, a aposta dos investidores nos juros pós-fixados deverá durar pelo menos até o meio do ano, quando se terá uma ideia mais clara do rumo que a Selic vai tomar: se continuará subindo, se vai se estabilizar ou se, finalmente, haverá sinais de que ela poderá cair.

O economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Carlos Thadeu de Freitas, explica que, além da política monetária, outros fatores tornaram os investidores mais resistentes à compra de títulos de longo prazo. “Houve encurtamento dos prazos em 2014 devido às incertezas criadas pelas eleições”, explica Thadeu de Freitas, que foi diretor da Dívida Pública do BC no governo Sarney.

De modo reservado, a atual diretoria do Banco Central afirma que o Tesouro poderia se esforçar mais para não deixar ao BC o fardo de enxugar a liquidez por meio das operações compromissadas. Há até mesmo certa irritação na autoridade monetária com o que está ocorrendo. Seria possível oferecer títulos com prazos mais curtos, de alguns meses apenas, atendendo a atual demanda do mercado diante das incertezas.

MAQUIAGEM O economista Alexandre Schwartsman, que foi diretor de Assuntos Internacionais do BC por três anos no governo de Luiz Inácio Lula da Silva, sugere a hipótese de que o Tesouro tenha evitado nos últimos meses vender títulos com vencimentos mais próximos da data de emissão para não encurtar o prazo médio dos papéis, não permitindo, assim, deteriorar a aparência da situação da dívida. “Se for isso, é uma bobagem, porque resulta exatamente no aumento das operações compromissadas do BC”, argumenta. Acaba-se trocando, portanto, algo ruim por outra coisa igualmente negativa, em uma atitude semelhante às maquiagens do déficit fiscal que vêm sendo realizadas pelo Tesouro nos últimos anos e têm sido criticadas de modo contundente.

Com a ressalva de que não tem informações precisas sobre a decisão do Tesouro, Schwartsman destaca que a elevação de reservas internacionais não pode servir de desculpa para o aumento das compromissadas nos últimos 12 meses, pois o colchão do BC tem se mantido praticamente inalterado: eram US$ 375,8 bilhões em dezembro de 2013 e passaram para US$ 375,7 bilhões em novembro de 2014. Enquanto isso, as compromissadas passaram do volume financeiro de R$ 507 bilhões (20% dos títulos em poder do mercado) para R$ 857 bilhões (29%).


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