Em um ano de aumento de gastos do governo e de manobras contábeis, o setor público brasileiro, incluindo o governo central, Estados e municípios, registrou inédito rombo de R$ 32 6 bilhões. Trata-se do primeiro resultado negativo nas contas públicas desde o início da série histórica, em 2001.
O déficit foi o equivalente a 0,63% do Produto Interno Bruto (PIB), o pior já registrado. Em 2013, o setor público registrou superávit primário de R$ 91,3 bilhões, ou 1,88% do PIB.
Com o déficit de 2014, a dívida pública vai crescer. Mesmo se o governo economizar 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2015 como prometido, ainda será insuficiente para estancar a alta do endividamento.
A expectativa apresentada ontem pelo Banco Central é de aumento da dívida líquida para 38,2% em 2015 e, da dívida bruta, para 65 2% - nos dois casos em relação ao PIB.
O chefe adjunto do Departamento Econômico do BC, Fernando Rocha, afirmou que o objetivo do governo é estancar a alta da dívida bruta, para, só então, reduzi-la. Essa dívida subiu de 56,7% para 63,4% do PIB no ano passado, atingindo o maior nível da série histórica, iniciada em dezembro de 2001.
A elevação dessa taxa em 2014 foi maior do que a da dívida líquida (que passou de 33,6% para 36,7%) em razão do aumento do déficit nominal.
Juros. O déficit nominal, que vinha rodando na casa de 2% a 3% do PIB nos últimos anos, disparou para 6,7% do PIB em 2014. O BC prevê que, com um aperto fiscal mais forte, haverá redução para 4,5% neste ano.
O déficit nominal embute os gastos com os juros, que somaram R$ 311 bilhões no ano passado - o maior volume desde que o BC começou a compilar os dados. Em relação ao PIB, a taxa de 6,07% é a maior dos últimos sete anos.
"O Brasil tem pago mais juros do que Grécia e Itália, que são países extremamente endividados e têm dívida muito superior ao PIB do que a nossa", analisou o economista da RC Consultores, Thiago Biscuola.
O economista-chefe do Banco Safra e ex-secretário do Tesouro Nacional, Carlos Kawall, afirmou que o aumento das despesas com juros é preocupante e deve servir de alerta vermelho para que o governo faça um ajuste fiscal eficiente.
Kawall disse que era aguardado um resultado ruim nas contas do setor público consolidado, mas veio pior que o esperado pelo resultado inédito dos regionais. "O déficit elevadíssimo do setor público regional (Estados e municípios) foi inédito e merece uma maior investigação."
O governo havia prometido no início do ano passado um superávit primário de R$ 99 bilhões em 2014. Essa meta foi revisada para R$ 10,1 bilhões no apagar das luzes, quando o governo decidiu pedir autorização ao Congresso para mudar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e descontar da meta todos os investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e as desonerações tributárias.
Na prática, o governo recebeu carta-branca para obter qualquer resultado sem descumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal. Dessa forma, as contas do setor público fecharam com um resultado quase R$ 132 bilhões menor do que o prometido no início de 2014.
Assim como a União, os dados divulgados ontem pelo BC mostram que os Estados também tiveram dificuldade para fechar as contas, piorando o resultado global das contas públicas. Eles apresentaram déficit de R$ 13,25 bilhões em 2014, o maior da série histórica iniciada em 2001.
Dessa forma, a contribuição dos chamados entes regionais, que também inclui os municípios, foi negativa em R$ 7,79 bilhões, também o pior desempenho da história. As prefeituras conseguiram fazer um superávit de R$ 5,45 bilhões.
A dificuldade dos Estados, que também enfrentam queda de arrecadação, aumenta o desafio do Tesouro em 2015 de conseguir entregar a economia de 1,2% do PIB para todo o setor público. Isso porque a União assumiu o compromisso de cobrir o eventual descumprimento da meta de Estados e municípios.